Lei n.º 21/19 de 20 de setembro
- Diploma: Lei n.º 21/19 de 20 de setembro
- Entidade Legisladora: Assembleia Nacional
- Publicação: Diário da República Iª Série n.º 122 de 20 de Setembro de 2019 (Pág. 6118)
Assunto
Lei da Tutela Administrativa sobre as Autarquias Locais.
Conteúdo do Diploma
Considerando que as disposições combinadas dos artigos 8.º, 213.º e seguintes da Constituição da República de Angola dispõem que Angola é um Estado unitário que, no quadro da organização administrativa, reconhece a autonomia local, tendo as autarquias locais como a sua principal forma de manifestação; Considerando que as autarquias locais, enquanto entes da Administração Local Autónoma, estão sujeitas à Tutela Administrativa do Executivo, nos termos da alínea d) do artigo 120.º, do artigo 221.º e do n.º 2 do artigo 242.º, todos da Constituição da República de Angola; Havendo necessidade de se definir o quadro normativo da Tutela Administrativa do Executivo sobre as autarquias locais; Tendo em conta que o convívio entre os princípios da unidade do Estado e do poder local exige a criação de instrumentos jurídicos que confiram, ao Executivo, poderes de controlo sobre os entes autárquicos, no sentido de se garantir o respeito pela Constituição e as leis; A Assembleia Nacional aprova, por mandato do povo, nos termos do n.º 2 dos artigos 165.º e 166.º, alínea d), todos da Constituição da República, a seguinte:
LEI DA TUTELA ADMINISTRATIVA
SOBRE AS AUTARQUIAS LOCAIS
CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES GERAIS
Artigo 1.º (Objecto)
A presente Lei estabelece o regime jurídico da Tutela Administrativa a que estão sujeitas as autarquias locais.
Artigo 2.º (Âmbito)
A presente Lei aplica-se a todas as autarquias locais e aos seus órgãos independentemente da categoria de que elas se revistam.
Artigo 3.º (Respeito Pela Autonomia Local)
O exercício da Tutela Administrativa não deve prejudicar a prossecução, pelas autarquias locais, das suas atribuições e o exercício das suas competências de modo autónomo, nos termos da Constituição e da lei.
Artigo 4.º (Fins e Limites da Tutela Administrativa)
- A Tutela Administrativa do Executivo visa assegurar a realização das tarefas fundamentais do Estado previstas na Constituição e na lei, no estrito respeito pelos princípios da democracia participativa da descentralização administrativa e da autonomia local.
- A Tutela Administrativa do Executivo sobre as autarquias locais só pode ser exercida nas formas e nas condições previstas na Constituição e na lei.
CAPÍTULO II TUTELA ADMINISTRATIVA
Artigo 5.º (Tutela Administrativa)
- A Tutela Administrativa consiste na verificação do cumprimento da lei, dos regulamentos e dos demais actos normativos por parte dos órgãos, dos titulares de órgãos e dos serviços das autarquias locais.
- A verificação de violação grave das leis e regulamentos implica a responsabilidade administrativa, disciplinar, civil, financeira e criminal dos órgãos, dos titulares dos órgãos, dos funcionários e dos agentes dos serviços das autarquias locais e entidades equiparadas, conforme aplicável, sem prejuízo da responsabilidade civil das autarquias locais, nos termos gerais do direito.
- Para além do disposto nos números anteriores, a Tutela Administrativa incide ainda sobre:
- a)- Actos susceptíveis de lesar direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos;
- b)- Orçamento das autarquias locais;
- c)- Instrumentos de ordenamento do território das autarquias locais;
- d)- Actos estranhos às atribuições das autarquias locais;
- e)- Autorização de despesas sem visto prévio do Tribunal de Contas, quando legalmente exigido;
- f)- Os actos que exijam em matéria de licenciamento, pagamento de taxas, contrapartidas, compensações ou outras prestações não previstas na lei;
- g)- Situações de improbidade pública e outras definidas por lei.
Artigo 6.º (Modalidades de Fiscalização)
- A Tutela Administrativa exerce-se através da realização de inspecções, inquéritos e sindicâncias aos actos dos órgãos das autarquias locais, os quais podem ser regulares ou ocasionais.
- A inspecção consiste na verificação da conformidade com a lei dos actos praticados, dos regulamentos aprovados e dos contratos celebrados pelos órgãos das autarquias locais.
- O inquérito consiste na averiguação da legalidade dos actos praticados, dos regulamentos aprovados e dos contratos celebrados pelos órgãos das autarquias locais, resultante de fundada denúncia apresentada por quaisquer pessoas singulares ou colectivas ou de recomendações de inspecção anterior.
- A sindicância consiste numa indagação geral e pormenorizada aos serviços das autarquias locais, quando existam sérios indícios de ilegalidades de actos, regulamentos e contratos de órgãos das autarquias locais que, pelo seu volume ou gravidade, não devam ser averiguados no âmbito de inquérito.
- Para efeitos do disposto no n.º 3 do presente artigo, há fundada denúncia quando a participação esteja devidamente identificada quanto ao seu autor, com factos articulados com suficiente precisão e, quando aplicável, com demonstração indiciária da verificação dos factos relatados.
- As acções de Tutela Administrativa estão limitadas às previstas por lei e do seu início é dado conhecimento prévio aos interessados, excepto quando tal notificação possa perigar o efeito útil da acção ou ponha em causa outro interesse relevante.
- Para além das modalidades referidas no n.º 1 do presente artigo, a entidade tutelar pode solicitar informações e esclarecimentos sobre decisões dos órgãos e serviços das autarquias locais.
Artigo 7.º (Titularidade dos Poderes de Tutela)
- O exercício do poder de Tutela Administrativa compete ao Presidente da República, enquanto Titular do Poder Executivo.
- A competência referida no número anterior pode ser delegada.
Artigo 8.º (Exercício de Acções de Fiscalização)
- As inspecções são realizadas de acordo com a periodicidade definida pelo órgão tutelar, através dos serviços competentes, devendo ser aprovado um plano anual de inspecções.
- Havendo fortes indícios de que o adiamento possa prejudicar o seu efeito útil, as acções inspectivas podem ser realizadas imediatamente após verificação dos factos justificativos, ainda que fora do calendário previamente aprovado.
- Os inquéritos e as sindicâncias são determinados sempre que haja fundada denúncia da prática de determinado acto ilegal por parte das autarquias locais e entidades equiparadas.
- Os relatórios das acções de fiscalização são apresentados para despacho da entidade tutelar que, havendo indícios de crime, deve remeter para o representante de Ministério Público competente, para os devidos efeitos legais.
- Estando em causa situações susceptíveis de fundamentar a destituição do Presidente da Câmara ou a dissolução da Assembleia Municipal e, por conseguinte, a perda de mandato dos seus titulares, a entidade competente deve determinar, previamente, a notificação dos visados para, no prazo de 30 dias apresentarem, por escrito, resposta em sua defesa.
- Decorrido o prazo previsto no número anterior, o processo é remetido ao Tribunal Constitucional para se pronunciar sobre a existência ou não de fundamento para abertura de processo de destituição ou dissolução.
CAPÍTULO III DEVERES DE COOPERAÇÃO E DE INFORMAÇÃO
Artigo 9.º (Deveres de Cooperação)
- Os órgãos, titulares de órgãos, agentes e serviços, enquanto objecto de acções de Tutela Administrativa, encontram-se vinculados aos deveres de cooperação com as entidades que as realizem, designadamente através da prestação de informações, entrega de documentação e acesso a ficheiros e processos administrativos.
- A recusa de cooperação faz incorrer os titulares dos serviços e agentes em responsabilidades disciplinar, civil e criminal.
- No exercício das acções de Tutela Administrativa, os responsáveis que as levem a cabo devem estar identificados e, sempre que requerido pelos visados ou terceiros a quem requeiram cooperação, nos termos da presente Lei, identificar-se e fundamentar a necessidade de cooperação.
- Quando considerem necessário, os responsáveis que levem a cabo as acções de Tutela Administrativa podem requerer a cooperação de quaisquer terceiros, sem prejuízo para as circunstâncias em que, nos termos da lei, sejam necessárias autorizações administrativas ou judiciais para a recolha de prova.
- A recusa de cooperação de terceiros, quando ilícita, faz os mesmos incorrer em responsabilidade civil e criminal.
Artigo 10.º (Dever de Informar)
As autarquias locais têm o dever legal de informar a entidade tutelar, através da remessa periódica de cópias certificadas dos seguintes documentos:
- a)- Actas das reuniões da Câmara e da Assembleia das Autarquias;
- b)- Orçamento da autarquia local;
- c)- Plano anual de actividades;
- d)- Relatório e contas;
- e)- Acordos de geminação ou de cooperação descentralizada.
Artigo 11.º (Actas das Reuniões da Câmara e da Assembleia)
O Presidente da Câmara e o Presidente da Assembleia da Autarquia Local devem remeter ao órgão tutelar cópia das actas síntese das reuniões da Câmara e da Assembleia, até 10 dias após a respectiva aprovação.
Artigo 12.º (Orçamento da Autarquia Local e Plano Anual de Actividades)
- O Presidente da Assembleia da Autarquia Local deve enviar ao órgão tutelar cópia do orçamento e do plano anual de actividades da autarquia local, até 10 dias após a sua aprovação.
- Os prazos para a aprovação do orçamento da autarquia local, bem como as consequências da sua não aprovação tempestiva são definidos por lei específica.
Artigo 13.º (Relatório e Contas)
- O Presidente da Câmara deve remeter, trimestralmente, ao órgão tutelar cópia dos relatórios e contas.
- Os documentos referidos no número anterior são remetidos até ao trigésimo dia posterior ao fim de cada trimestre.
- Anualmente, deve ser remetido o relatório anual de actividades, o qual deve detalhar o estado geral da autarquia local, incluindo a situação económica e social.
- O relatório referido no número anterior deve ser enviado até ao dia 31 de Janeiro do ano seguinte àquele a que respeita.