Lei n.º 39/20 de 11 de novembro
- Diploma: Lei n.º 39/20 de 11 de novembro
- Entidade Legisladora: Assembleia Nacional
- Publicação: Diário da República Iª Série n.º 179 de 11 de Novembro de 2020 (Pág. 5444)
Assunto
Aprova o Código do Processo Penal Angolano. - Revoga o Código do Processo Penal de 1929, os diplomas que substituíram qualquer dos seus preceitos e todas as disposições legais que prevejam factos regulados pelo presente Código do Processo Penal e toda a legislação que contrarie o presente Diploma, nomeadamente o Decreto-Lei n.º 26.643, de 28 de Maio de 1939, o Decreto n.º 34.553, de 30 de Abril de 1945, o Decreto 35.007, de 13 de Outubro de 1945, o Decreto-Lei n.º 39.672, de 20 de Maio de 1954, o Decreto-Lei n.º 21/71, de 29 de Janeiro, o Decreto-Lei n.º 292/74, de 28 de Junho, o Decreto-Lei n.º 185/72, de 31 de Maio, a Lei n.º 11/75, de 15 de Dezembro, o Decreto n.º 3/76, de 3 de Fevereiro, a Lei n.º 11/77, de 9 de Abril, a Lei n.º 11/82, de 7 de Outubro, o Decreto n.º 231/79, de 26 de Julho, a Lei n.º 20/88, de 31 de Dezembro, a Lei n.º 23/12, de 14 de Agosto, a Lei n.º 2/14, de 10 de Fevereiro, e a Lei n.º 25/15, de 18 de Setembro.
Conteúdo do Diploma
Considerando os valores e os princípios consagrados na Constituição da República de Angola, bem como os progressos da ciência do direito penal e as grandes linhas orientadoras da política criminal moderna: Tendo em vista a realização de uma justiça penal célere e eficaz, alinhada com a necessidade de assegurar o exercício dos direitos, liberdades e garantias fundamentais:
- Impondo-se a introdução na Ordem Jurídica Angolana de um Código do Processo Penal que proporcione harmonização com o novo Código Penal Angolano e concilie, igualmente, as necessidades da prática judiciária com as exigências de fundamentação sólida do Direito: A Assembleia Nacional aprova, por mandato do povo, nos termos da alínea e) do artigo 164.º da Constituição da República, a seguinte:
LEI QUE APROVA O CÓDIGO DO PROCESSO PENAL ANGOLANO
Artigo 1.º (Aprovação)
É aprovado o Código do Processo Penal Angolano, anexo à presente Lei que dela é parte integrante.
Artigo 2.º (Revogação)
- É revogado o Código do Processo Penal de 1929, os diplomas que substituíram qualquer dos seus preceitos e todas as disposições legais que prevejam factos regulados pelo presente Código do Processo Penal.
- É revogada toda a legislação que contrarie o presente Diploma, nomeadamente:
- a)- Decreto-Lei n.º 26.643, de 28 de Maio de 1939 - Da Reforma Prisional;
- b)- Decreto n.º 34.553, de 30 de Abril de 1945 - Regula a Organização dos Tribunais de Execução das Penas;
- c)- Decreto-Lei n.º 35.007, de 13 de Outubro de 1945 - Aplicável a Angola, com emendas, pela Portaria n.º 17.076, de 20 de Março de 1959;
- d)- Decreto-Lei n.º 39.672, de 20 de Maio de 1954 - Regula Aspectos Específicos dos Autos de Notícia, da Prisão Preventiva e do Exercício da Acção Cível em Conjunto com a Acção Penal;
- e)- Decreto-Lei n.º 21/71, de 29 de Janeiro - Disciplina o Depósito das Quantias em Dinheiro Apreendidas e dos Objectos e Quantias não Reclamados, Apreendidos em Sede do Processo Penal;
- f)- Decreto-Lei n.º 292/74, de 28 de Junho - Impõe ao Ministério Público a Obrigação de Executar as Indemnizações Arbitradas Oficiosamente aos Ofendidos, Sempre que estes não Constituírem Advogado no Processo;
- g)- Decreto-Lei n.º 185/72, de 31 de Maio - Altera os Preceitos do Código do Processo Penal Respeitantes à Prisão Preventiva, Liberdade Provisória e Execução das Penas;
- h)- Lei n.º 11/75, de 15 de Dezembro - Da Disciplina do Processo Produtivo;
- i)- Decreto n.º 3/76, de 3 de Fevereiro - Regulamento da Lei n.º 11/75, de 15 de Dezembro - Da Disciplina do Processo Produtivo;
- j)- Lei n.º 11/77, de 11 de Maio - Institui a Intervenção dos Assessores Populares nos Tribunais;
- k)- Lei n.º 11/82, de 7 de Outubro - Institui a Participação Popular na Administração da Justiça;
- l)- Decreto n.º 231/79, de 26 de Julho - Disciplina o Trânsito Automóvel;
- m)- Lei n.º 20/88, de 31 de Dezembro - Do Ajustamento das Leis Processuais Civil e Penal ao Sistema Unificado de Justiça;
- n)- Lei n.º 23/12, de 14 de Agosto - Altera o artigo 56.º do Código do Processo Penal;
- o)- Lei n.º 2/14, de 10 de Fevereiro - Lei Reguladora das Revistas, Buscas e Apreensões;
- p)- Lei n.º 25/15, de 18 de Setembro - Lei das Medidas Cautelares em Processo Penal.
Artigo 3.º (Remissões)
As remissões constantes de outras leis processuais penais para preceitos do Código do Processo Penal ora revogado, consideram-se feitas para as disposições correspondentes do Código do Processo Penal aprovado pela presente Lei.
Artigo 4.º (Transição)
- O Ministério Público cessa o exercício das competências atribuídas aos juízes de garantia pelo Código aprovado pela presente Lei, logo que estes entrem em funções.
- Cabe ao Conselho Superior da Magistratura Judicial, criar condições para a entrada em funções dos juízes de garantia, no âmbito das suas competências.
- A Unidade de Referência Processual equivale à Unidade de Correcção Fiscal.
Artigo 5.º (Dúvidas e Omissões)
As dúvidas e as omissões resultantes da interpretação e da aplicação da presente Lei são resolvidas pela Assembleia Nacional.
Artigo 6.º (Entrada em Vigor)
A presente Lei entra em vigor 90 dias após a data da sua publicação. Vista e aprovada pela Assembleia Nacional, em Luanda, aos 22 de Julho de 2020. O Presidente da Assembleia Nacional, Fernando da Piedade Dias dos Santos. Promulgada aos 6 de Novembro de 2020.
- Publique-se. O Presidente da República, JOÃO MANUEL GONÇALVES LOURENÇO.
CÓDIGO DO PROCESSO PENAL ANGOLANO
PARTE I Disposições Gerais
TÍTULO I DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Artigo 1.º (Necessidade do Processo Penal e Juiz Legal)
Só podem ser aplicadas penas e medidas de segurança no âmbito de um processo penal e por um Tribunal competente, nos termos de lei anterior à verificação dos respectivos pressupostos.
Artigo 2.º (Legalidade e Aplicação Subsidiária)
- O processo é regulado pelas disposições do presente Código, sem prejuízo de processos da mesma natureza serem regidos por lei especial.
- As disposições do Código do Processo Penal são, subsidiariamente, aplicáveis aos processos a que se refere a última parte do número anterior.
Artigo 3.º (Interpretação e Integração das Lacunas)
- É permitida a interpretação extensiva das disposições do Código do Processo Penal e a sua aplicação por analogia.
- Na falta de norma de direito processual penal reguladora de caso análogo ou não sendo possível a analogia, pode recorrer-se às normas de direito processual civil que se harmonizem com o processo penal e, não as havendo, aos princípios gerais de processo penal.
- Na falta de princípios gerais do processo penal, o caso omisso é regulado nos termos da Lei Geral, na medida em que a aplicação de regras e princípios gerais de direito não implique o enfraquecimento da posição do arguido no processo ou a diminuição dos seus direitos processuais.
Artigo 4.º (Aplicação da Lei Processual Penal no Tempo)
- A Lei Processual Penal é de aplicação imediata, mantendo os actos praticados no domínio da lei anterior à sua inteira validade.
- A Lei Processual Penal não se aplica aos processos que tiveram início na vigência da lei anterior, se a sua aplicação imediata determinar:
- a)- O agravamento da situação processual do arguido, em particular, a diminuição dos seus direitos de defesa;
- b)- A contradição ou quebra de harmonia e de unidade entre os actos do processo regulados pela lei anterior e os regulados pela lei vigente.
Artigo 5.º (Aplicação da Lei Processual Penal no Espaço)
- A Lei Processual Penal é aplicável em todo o território nacional.
- Fora do território nacional, a Lei Processual Penal só é aplicável nos limites definidos pelo direito internacional e pelos acordos, tratados e convenções internacionais de que Angola é Parte.
Artigo 6.º (Independência da Acção Penal e Suficiência do Processo Penal)
- A acção penal é independente de qualquer outra e, no respectivo processo, pode ser resolvida qualquer questão não penal que interesse à decisão da causa penal.
- A jurisdição penal que conheça de questão não penal, nos termos da última parte do número anterior, aplica o direito substantivo regulador da relação jurídica controvertida que dessa questão seja objecto.
Artigo 7.º (Questões Prejudiciais)
- Quando, para se conhecer da existência de um crime, seja necessário julgar uma questão que não tenha natureza penal e não possa ser convenientemente decidida pela jurisdição penal, pode o juiz ordenar a suspensão do processo para se intentar a acção correspondente no Tribunal materialmente competente para a julgar.
- Presume-se que a questão prejudicial a que se refere o número anterior não pode ser convenientemente decidida no Processo Penal, quando:
- a)- Incida sobre o estado civil das pessoas;
- b)- Seja de difícil solução e não recaia sobre factos cuja prova a Lei Civil limite.
- A suspensão é requerida pelo Ministério Público, pelo assistente ou pelo arguido, depois da acusação ou do requerimento para abertura de instrução contraditória ou ordenada oficiosamente pelo juiz.
- A suspensão não prejudica a realização das diligências de produção de prova em curso ou que se revestirem de carácter urgente.
- O prazo de suspensão é marcado pelo juiz, que pode prorrogá-lo por períodos sucessivos até ao máximo de 2 anos, sempre que fundadamente entender que a demora na decisão da questão prejudicial não é imputável ao arguido ou ao assistente.
- Ao ordenar a suspensão do processo, deve o juiz proceder ao reexame das medidas de coacção a que o arguido está sujeito, podendo, sem prejuízo das disposições legais em vigor e dos princípios aplicáveis, substituí-las por outra ou outras medidas menos gravosas.
- Compete ao Ministério Público junto do Tribunal onde correr a questão prejudicial promover o andamento, o mais célere possível, do processo e manter o juiz penal informado sobre a respectiva tramitação.
Artigo 8.º (Cessação da Suspensão do Processo Penal)
A suspensão do processo principal cessa, retomando o juiz penal a competência para decidir a questão prejudicial, quando:
- a)- A acção correspondente à questão prejudicial não for intentada no Tribunal competente, no prazo de 45 dias;
- b)- O prazo de suspensão não for prorrogado;
- c)- O prazo máximo de suspensão a que se refere o n.º 5 do artigo anterior, se esgotar sem a questão ter sido decidida.
TÍTULO II SUJEITOS PROCESSUAIS
CAPÍTULO I O JUIZ E OS TRIBUNAIS
SECÇÃO I JURISDIÇÃO
Artigo 9.º (Jurisdição Penal)
- Só os Tribunais Judiciais Criminais e respectivos juízes podem, sem prejuízo da jurisdição criminal especial concedida aos Tribunais Militares, conhecer de causas penais e aplicar penas e medidas de segurança.
- Na Administração da Justiça Penal, os Tribunais e os juízes obedecem exclusivamente à Constituição, à Lei e aos princípios do Processo Penal.
Artigo 10.º (Dever de Colaboração)
- As autoridades e os funcionários públicos estão sujeitos ao dever de prestar aos tribunais e às autoridades judiciárias, em geral, a devida colaboração por eles solicitada no exercício das funções de administração da Justiça Penal.
- A colaboração a que se refere o número anterior tem prioridade relativamente a qualquer outro serviço.
SECÇÃO II COMPETÊNCIA
SUBSECÇÃO I COMPETÊNCIA MATERIAL E FUNCIONAL
Artigo 11.º (Determinação da Competência)
A competência material e funcional dos Tribunais e dos juízes é regulada pelas leis de organização judiciária e pelos preceitos do presente Código.
Artigo 12.º (Competência dos Juízes)
Compete ao juiz:
- a)- Exercer, na fase de instrução preparatória, todas as funções que lhe são atribuídas pelas disposições do presente Código;
- b)- Proceder à instrução contraditória com os mesmos poderes de direcção, de organização dos trabalhos e disciplinares conferidos ao juiz na fase de julgamento;
- c)- Proferir despacho de pronúncia ou de não pronúncia do arguido ou despachos equivalentes.
- d)- Dirigir a fase de julgamento e proferir a sentença;
- e)- Apreciar e decidir sobre o pedido de «habeas corpus»;
- f)- Praticar quaisquer outros actos permitidos ou impostos por lei.
Artigo 13.º (Determinação da Pena Aplicável)
Sempre que, para se estabelecer a competência do Tribunal, tenha de se considerar a pena aplicável ao agente do crime, deve ter-se em conta todos os factores, causas ou circunstâncias susceptíveis de elevar o respectivo limite máximo.
SUBSECÇÃO II COMPETÊNCIA TERRITORIAL
Artigo 14.º (Regras Gerais)
- Sem prejuízo do disposto no número seguinte, é competente para conhecer de um crime material, o Tribunal em cuja área se produziu o resultado típico.
- Em caso de crime em que a morte de pessoa seja elemento constitutivo, é competente o Tribunal em cuja área o agente actuou ou, em caso de omissão, devia ter actuado.
- Nos crimes formais, de mera actividade ou de pura omissão, é competente o Tribunal em cuja área tiver ocorrido a acção ou omissão típicas.
- Para conhecer dos crimes que se consumam por actos sucessivos ou reiterados ou por actos susceptíveis de se prolongar no tempo, é competente o Tribunal em cuja área se praticou o último acto de execução ou em que cessou a consumação.
- Se o crime não chegou a consumar-se ou em caso de acto preparatório punível, é competente o Tribunal em cuja área se tiver praticado o último acto de execução ou de preparação, respectivamente.
Artigo 15.º (Crimes Cometidos a Bordo de Navio ou de Aeronave)
- É competente para conhecer dos crimes cometidos a bordo de navio angolano o Tribunal da área do porto ou do território angolano para onde o agente se dirigir ou onde desembarcar.
- Se o agente não se dirigir para território angolano ou nele não desembarcar ou se fizer parte da tripulação do navio, é competente o Tribunal da área de matrícula do navio.
- O disposto nos números anteriores é aplicável, com as necessárias adaptações, aos crimes cometidos a bordo de aeronave angolana.
- Se, no caso dos n.os 2 e 3, o navio ou a aeronave não estiverem matriculados em Angola, é competente o Tribunal da área que, em primeiro lugar, tomar conhecimento do crime.
- O disposto no número anterior aplica-se a qualquer outro caso não previsto no presente artigo.
Artigo 16.º (Dúvidas sobre o Lugar e Desconhecimento do Lugar do Crime)
- Se o crime tiver sido cometido nos limites de mais do que uma área judicial e houver dúvida acerca do lugar em que o agente o cometeu, é competente para dele conhecer o Tribunal de qualquer das áreas.
- No caso do número anterior, prefere o Tribunal da área em que primeiro tenha havido conhecimento da prática do crime.
- Desconhecendo-se o lugar do cometimento do crime, é competente o Tribunal da área em que, de tal crime, primeiro se tiver tomado conhecimento.
Artigo 17.º (Crime Cometido no Estrangeiro)
- Para conhecer dos crimes cometidos no estrangeiro que devam ser julgados pelos Tribunais Angolanos, é competente o Tribunal da área onde o agente for encontrado ou o Tribunal do seu domicílio.
- Se, até à instauração do processo, o arguido não for encontrado e não for conhecido o seu domicílio, a competência é atribuída ao Tribunal da área onde primeiro se tiver conhecimento da prática do crime.
- Se o crime só em parte tiver sido cometido no estrangeiro, é competente o Tribunal da área do território nacional onde foi praticado o último acto relevante para os termos dos artigos 14.º e 16.º.
SUBSECÇÃO III COMPETÊNCIA POR CONEXÃO
Artigo 18.º (Pluralidade e Unidade de Processo)
- Por cada crime cometido é, sem prejuízo do disposto no número seguinte, instaurado um processo criminal.
- Os agentes de um ou vários crimes são julgados num mesmo processo nos casos de conexão regulados nos artigos seguintes ou sempre que tenham sido cometidos vários crimes da competência do mesmo Tribunal.
Artigo 19.º (Casos de Conexão de Crimes)
Há conexão, quando o mesmo agente:
- a)- Pratica vários crimes através da mesma acção ou omissão;
- b)- Pratica vários crimes na condição de uns serem causa ou efeito de outros ou de uns se destinarem a continuar ou a ocultar os outros;
- c)- Comete vários crimes fora do condicionalismo estabelecido no número anterior e o juiz decidir nos termos do disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 22.º.
Artigo 20.º (Outros Casos de Conexão)
Há, do mesmo modo, conexão, quando vários agentes:
- a)- Cometerem o mesmo crime em comparticipação;
- b)- Cometerem crimes reciprocamente, no mesmo lugar ou ocasião;
- c)- Cometerem vários crimes em comparticipação, desde que o sejam no mesmo lugar ou ocasião ou uns sejam causa ou efeito dos outros ou uns se destinem a continuar ou a ocultar os outros;
- d)- Cometerem vários crimes em comparticipação fora do condicionalismo estabelecido na alínea anterior e o juiz decidir nos termos do disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 22.º.
Artigo 21.º (Competência em Razão da Conexão)
- Nos casos da conexão de processos, é competente para conhecer de todos:
- a)- O Tribunal competente para o crime punível com pena mais grave;
- b)- Se os crimes forem puníveis com penas de igual gravidade, o Tribunal a cuja ordem o arguido estiver preso ou, havendo vários arguidos presos, aquele à ordem de quem estiver o maior número de arguidos;
- c)- Se não houver arguidos presos ou o seu número for igual, o Tribunal da área onde primeiro tiver havido conhecimento de qualquer dos crimes.
- Quando nos casos do número anterior, os Tribunais forem de diferente hierarquia, é competente para conhecer de todos os processos, o Tribunal de hierarquia superior competente para qualquer deles.
Artigo 22.º (Formação de um Único Processo)
- Para os crimes conexos, é organizado um único processo.
- Se já tiverem sido instaurados vários processos, procede-se à apensação dos restantes àquele que disser respeito ao crime que determinou a competência do Tribunal, nos termos dos artigos anteriores.
- Nos casos estabelecidos na alínea c) do artigo 19.º e na alínea d) do artigo 20.º, a conexão só é relevante quando, em relação a todos ou a alguns crimes cometidos, o juiz decidir, em despacho fundamentado, que são úteis e vantajosos à instrução dos crimes no mesmo processo e o julgamento do agente ou agentes pelo mesmo Tribunal.
- O despacho a que se refere o n.º 3 é, na fase judicial, proferido oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, do assistente ou do arguido, pelo juiz do Tribunal competente para conhecer do crime que determinou a conexão, nos termos do artigo 21.º, ou pelo magistrado judicial competente nas fases anteriores.
Artigo 23.º (Processos Excluídos das Regras da Conexão)
Não haverá conexão entre os processos crimes regulados neste Código e os processos que sejam da competência de:
- a)- Tribunais Militares;
- b)- Sala da Família, Menores e Sucessões, em matéria de protecção de menores e de prevenção criminal.
Artigo 24.º (Separação de Processos)
O juiz pode, por despacho fundamentado, ordenar oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, do arguido ou do lesado o julgamento em separado de um ou mais dos processos conexos, quando a separação:
- a)- For necessária para não prolongar a prisão preventiva de qualquer dos arguidos ou para realizar outros interesses atendíveis do Estado, de qualquer dos arguidos ou dos ofendidos;
- b)- Puder evitar o retardamento excessivo do julgamento de qualquer dos arguidos.
Artigo 25.º (Manutenção da Competência)
A competência por conexão mantém-se:
- a)- Mesmo quando o arguido ou arguidos sejam absolvidos pelo crime ou crimes que a determinaram ou a respectiva responsabilidade criminal se tenha extinguido antes do julgamento;
- b)- Relativamente aos processos separados, nos termos do artigo anterior.
SUBSECÇÃO IV DESLOCAÇÃO DE COMPETÊNCIA
Artigo 26.º (Atribuição Extraordinária de Competência)
- A competência pode, depois de designado dia para julgamento, ser retirada do Tribunal competente e atribuída a outro Tribunal quando ocorrências locais gravemente perturbadoras do normal andamento do processo e da realização da justiça:
- a)- Impedirem ou dificultarem de forma séria o exercício da justiça pelo Tribunal competente;
- b)- Comprometerem gravemente a liberdade de determinação dos sujeitos e participantes processuais;
- c)- Determinarem receio justificado de perigo relevante para segurança e a ordem públicas.
- A competência deve ser atribuída a um Tribunal da mesma espécie e hierarquia do Tribunal afectado pelas ocorrências referidas no número anterior, o mais próximo possível deste e onde se preveja que incidentes de semelhante natureza não ocorram.
- O pedido de desaforamento é dirigido pelo juiz do Tribunal afectado pelas ocorrências perturbadoras, pelo Ministério Público, pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis à Câmara ou Secção Criminal competente do Tribunal imediatamente superior e deve ser acompanhado dos elementos de prova necessários para a decisão.
- O pedido, autuado por apenso, só tem efeito suspensivo se a Câmara competente lho atribuir, podendo, em tal caso, o Tribunal afectado pelas ocorrências praticar actos processuais urgentes.
- Se o pedido for deferido, o Tribunal a quem a competência for atribuída decide em que medida os actos processuais praticados mantêm os seus efeitos ou devem ser repetidos.
- São aplicáveis com as necessárias adaptações as disposições do artigo 34.º.
SUBSECÇÃO V DECLARAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA
Artigo 27.º (Arguição de Incompetência e Decisão)
- A incompetência do Tribunal pode ser deduzida pelo Ministério Público, pelo arguido, pelo assistente ou pela parte civil e declarada em qualquer altura do processo até transitar em julgado a decisão final nela proferida.
- O Tribunal pode, sem prejuízo do disposto no número seguinte, reconhecê-la e declará-la oficiosamente.
- A incompetência territorial só pode ser deduzida, reconhecida e declarada até ao início da audiência para debate contraditório, em caso de abertura de instrução contraditória ou, não tendo ela lugar, da audiência de julgamento.
- O processo é arquivado se se entender que os Tribunais Angolanos não são competentes.
Artigo 28.º (Efeito da Declaração de Incompetência)
- Declarada a incompetência, o processo é remetido ao Tribunal competente, sem prejuízo de o Tribunal declarado incompetente ordenar a prática de actos processuais considerados urgentes.
- O Tribunal declarado competente pode, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte, anular os actos que não teriam sido praticados se, perante ele, tivesse de início corrido o processo e mandar repetir os que achar necessário.
Artigo 29.º (Não Aceitação da Competência)
- Se o Tribunal declarado competente n ão aceitar a competência, deve proceder de harmonia com o disposto no artigo 33.º.
- Se, por despacho fundamentado do respectivo juiz, se entender que nem o Tribunal declarado competente nem o Tribunal que se declarou incompetente podem julgar a causa e que é outro o Tribunal competente, para ele deve o processo ser remetido, nos termos do artigo anterior.
SUBSECÇÃO VI CONFLITOS DE COMPETÊNCIA
Artigo 30.º (Espécies de Conflitos)
- Há conflito positivo de competências quando, em qualquer fase do processo, dois ou mais Tribunais se considerarem competentes para conhecer do mesmo crime e julgar o respectivo agente.
- Há conflito negativo quando, nas mesmas circunstâncias, dois ou mais Tribunais se considerarem incompetentes.
Artigo 31.º (Cessação do Conflito)
- O conflito positivo cessa quando só um dos Tribunais em conflito continuar a declarar-se competente.
- O conflito negativo cessa logo que um dos Tribunais se declarar competente.
Artigo 32.º (Tribunal Competente para Resolver o Conflito)
O conflito é resolvido por decisão do Tribunal de menor hierarquia com jurisdição sobre todos os Tribunais em conflito.
Artigo 33.º (Procedimento de Resolução do Conflito. Iniciativa)
- O juiz do Tribunal deve, logo que se aperceba da existência do conflito, dá-lo a conhecer ao Tribunal competente, nos termos do artigo 32.º, remetendo-lhe cópia dos elementos necessários à sua resolução, nomeadamente, das decisões e posições conflituantes, com indicação precisa sobre o Ministério Público, o assistente e o arguido e respectivos advogados dos dois últimos.
- A resolução do conflito pode também ser requerida ao Tribunal competente, nos termos do artigo 32.º, pelo arguido, juntando ao requerimento a cópia e as indicações que se refere o n.º 1.
- Suscitada a resolução do conflito de incompetência e até este ser resolvido apenas é permitida a realização de actos processuais urgentes.
Artigo 34.º (Procedimento de Resolução de Conflitos. Termos Ulteriores)
- Recebidos os elementos a que se referem os n.os 1 e 2 do artigo anterior, o Tribunal competente para resolver o conflito manda notificar os sujeitos que sobre ele ainda não se tiverem pronunciado para o fazerem, no prazo de 8 dias, juntando os elementos de prova que possuírem.
- Proferida a decisão sobre o conflito, que não é passível de recurso, é ela notificada aos Tribunais em conflito, ao Ministério Público junto deles, ao advogado do assistente e ao arguido e seu advogado.
SECÇÃO III IMPEDIMENTOS E SUSPEIÇÃO DO JUIZ
SUBSECÇÃO I IMPEDIMENTOS
Artigo 35.º (Impedimentos Derivados das Relações do Juiz com os Outros Sujeitos Processuais)
Nenhum juiz pode ser titular de um Processo Penal, quando:
- a)- For ou tiver sido ofendido com a faculdade de se constituir assistente ou parte civil;
- b)- For ou tiver sido cônjuge ou representante legal do arguido ou de pessoa que possa constituir-se assistente ou parte civil ou com alguma dessas pessoas viver ou tiver vivido em situação análoga à dos cônjuges;
- c)- For ele ou o seu cônjuge ou pessoa que com ele viver em situação análoga à dos cônjuges, ascendente, descendente, parente até ao 3.º grau, tutor ou curador, adoptante ou adoptado do arguido, do ofendido ou de pessoa que puder constituir-se assistente ou parte civil ou for afim deles até ao referido grau;
- d)- Exercer ou ter exercido no mesmo processo a função de juiz, o cônjuge ou pessoa com quem viva em situação análoga à dos cônjuges ou parente ou afim até ao 3.º Grau.
Artigo 36.º (Impedimento Derivado de Participação no Processo)
Nenhum juiz pode intervir em julgamento, recurso ou revisão num processo em que tiver:
- a)- Intervindo como representante do Ministério Público, membro de órgão de polícia criminal, perito, testemunha, defensor ou advogado do assistente ou da parte civil;
- b)- Procedido a interrogatório do arguido;
- c)- Presidido à instrução contraditória;
- d)- Proferido despacho de pronúncia ou de não pronúncia ou despacho a rejeitar a acusação ou a ordenar que os autos sejam conclusos ao juiz da causa para ser designado dia para julgamento;
- e)- Participado em julgamento, decisão de recurso ou revisão anteriores;
- f)- Intervindo nas funções de fiscalização judicial de garantias em instrução preparatória.
Artigo 37.º (Oferecimento do Juiz como Testemunha)
- Se o juiz for indicado no processo como testemunha e declarar, por despacho e sob compromisso de honra, que tem conhecimento de factos que podem influir na decisão da causa, considera-se impedido.
- Caso contrário, não é inquirido como testemunha, mantendo-se intacta a sua capacidade para intervir no processo.
Artigo 38.º (Declaração de Impedimento)
- O juiz que se dê conta de estar impedido nos termos dos artigos anteriores deve declará-lo sem demora, por despacho, no processo.
- A declaração de impedimento pode ser requerida pelo Ministério Público, pelo arguido, pelo assistente ou pela parte civil, logo que sejam admitidos a intervir no processo.
- O requerimento é acompanhado dos elementos de prova de que o requerente dispuser.
- O juiz a quem for oposto o impedimento deve proferir despacho no prazo de 5 dias e nele dizer se o reconhece ou não.
- A falta de resposta no prazo indicado no número anterior equivale ao reconhecimento de impedimento.
Artigo 39.º (Efeitos do Impedimento)
- Os actos praticados por um juiz declarado ou reconhecido como impedido são nulos, salvo o disposto no número seguinte.
- Mantêm-se válidos os actos praticados por um juiz impedido, sempre que desses actos não resultar prejuízo para a justa decisão da causa, quando não puderem ser repetidos ou quando a repetição for processualmente irrelevante.
Artigo 40.º (Recurso)
- O despacho em que o juiz reconhece o impedimento é irrecorrível.
- Do despacho do juiz que não reconhecer o impedimento pode recorrer para o Tribunal imediatamente superior o Ministério Público, o arguido, o assistente e a parte civil.
- Se o recurso for oposto a juiz do Tribunal Supremo, é julgado pela Câmara competente do mesmo Tribunal, sem a presença do juiz contra quem o impedimento foi deduzido.
- O recurso tem efeito suspensivo, mas o juiz contra quem foi deduzido o impedimento pode praticar os actos processuais urgentes.
Artigo 41.º (Termos Posteriores)
Declarado ou reconhecido o impedimento, o juiz impedido remete imediatamente o processo ao juiz que, nos termos da lei em vigor, o substituir.
Artigo 42.º (Extensão do Regime de Impedimentos)
- As disposições da presente secção são aplicáveis, com as necessárias adaptações, aos peritos, intérpretes e funcionários de justiça.
- A declaração de impedimento ou o requerimento para que seja declarado são dirigidos ao magistrado judicial competente perante quem corre o processo em que o incidente for levantado e são por eles apreciados e imediatamente decididos, sem submissão a formalismo especial.
- Se não houver quem legalmente possa substituir o impedido, o substituto é designado pelo juiz presidente do respectivo Tribunal.
SUBSECÇÃO II SUSPEIÇÃO E RECUSA
Artigo 43.º (Fundamentos de Suspeição)
Constitui fundamento de suspeição de um juiz a existência de motivo sério e grave susceptível de pôr em causa a sua imparcialidade, nomeadamente, a intervenção em outros processos ou em fases ou actos do mesmo processo, fora dos casos abrangidos pelo artigo 35.º.
Artigo 44.º (Legitimidade para Deduzir a Suspeição)
- Têm legitimidade para suspeitar do juiz e para o recusar o Ministério Público, o arguido, o assistente ou a parte civil.
- O juiz não pode, sem prejuízo do disposto no artigo 46.º, declarar-se voluntária e oficiosamente suspeito.
- A suspeição é deduzida por requerimento, acompanhado da prova de que o requerente dispuser.
Artigo 45.º (Processamento)
- O requerimento a opor a suspeição só é admissível até ao início do debate contraditório realizado na fase da instrução contraditória, até ao início da audiência de julgamento em primeira instância ou até ao início da conferência, em fase de recurso.
- Se for oposta em momento posterior, a suspeição só é, sem prejuízo do disposto no número seguinte, admissível quando os factos alegados que a fundamentam tiverem sido praticados ou conhecidos do requerente depois do início do debate contraditório ou da audiência de julgamento.
- Depois de proferido o despacho de pronúncia ou de não pronúncia ou despachos equivalentes, ou de proferida a sentença, a oposição de suspeição ao juiz, não é permitida.
- O juiz a quem for oposta a suspeição deve proferir despacho, no prazo de 8 dias, e nele declarar se a reconhece ou não.
- O despacho do juiz a reconhecer a suspeição que lhe foi oposta não é passível de recurso.
- Aplica-se ao recurso do despacho do juiz que não reconhecer a suspeição que lhe foi oposta o disposto nos n.os 2, 3 e 4 do artigo 40.º com as necessárias adaptações.
Artigo 46.º (Fundamentos Objectivos de Suspeição)
- Se um juiz entender que se verificam factos que possam constituir fundamento de recusa, nos termos do artigo 43.º e gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade pode, por despacho, declará-los e dá-los a conhecer, mandando notificar o Ministério Público, o arguido, o assistente e a parte civil para, no prazo de 8 dias deduzirem, querendo, contra si, a correspondente suspeição.
- Se a suspeição for deduzida e oposta ao juiz com fundamento nos factos descritos no despacho a que se refere o número anterior, considera-se a suspeição reconhecida e declarada.
- Se a suspeição não for oposta no prazo estabelecido, nenhum incidente pode ser deduzido com fundamento nos mesmos factos pelos sujeitos processuais notificados para os efeitos deste artigo.
Artigo 47.º (Disposições Aplicáveis)
- Aplica-se às suspeições, com as necessárias adaptações o disposto para os impedimentos nos artigos 41.º e 42.º.
CAPÍTULO II O MINISTÉRIO PÚBLICO, OS ÓRGÃOS DE POLÍCIA CRIMINAL E O ASSISTENTE
SECÇÃO I O MINISTÉRIO PÚBLICO
Artigo 48.º (Atribuições do Ministério Público)
- Compete ao Ministério Público, enquanto autoridade judiciária, participar na descoberta da verdade e na realização da justiça penal, determinando-se na sua actuação por critérios de estrita objectividade e legalidade.
- Compete em especial ao Ministério Público:
- a)- Promover o Processo Penal, recebendo denúncias e ordenando a abertura da correspondente instrução, se for caso disso, bem como fiscalizar a legalidade de todos os actos processuais;
- b)- Dirigir e realizar a instrução preparatória;
- c)- Exercer, nos termos das disposições do presente Código, a acção penal, deduzindo a acusação contra o arguido e defendendo-a na instrução contraditória e no julgamento, ou abster-se de acusar, ordenando o arquivamento do processo;
- d)- Interpor recursos em defesa da legalidade, ainda que no interesse do arguido;
- e)- Promover a execução das penas e das medidas de segurança velando para que os respectivos prazos não sejam excedidos;
- f)- Exercer outras atribuições que lhe sejam conferidas por lei.
Artigo 49.º (Promoção do Processo Penal. Legitimidade do Ministério Público)
Sem prejuízo das limitações estabelecidas nos artigos 50.º e 51.º, o Ministério Público adquire legitimidade para promover o Processo Penal logo que tiver notícia do crime, por conhecimento oficioso, por denúncia ou através de auto de notícia levantado por entidade competente.
Artigo 50.º (Legitimidade nos Crimes Semi-Públicos)
- Quando o procedimento criminal depender de queixa, o Ministério Público só o pode promover depois de aquela ser efectuada pela pessoa com legitimidade para se queixar.
- Considera-se feita ao Ministério Público a queixa encaminhada a uma entidade que esteja obrigada a transmitir-lhe.
- A queixa pode ser feita pelo respectivo titular, por mandatário judicial ou por mandatário não judicial com poderes especiais.
- O disposto nos números anteriores é também aplicável quando o procedimento criminal depender da participação de certas autoridades.
Artigo 51.º (Legitimidade nos Crimes Particulares)
- Quando o procedimento criminal depender de acusação do ofendido ou de outra pessoa, é necessário que o ofendido ou essa pessoa se queixe, se constitua assistente e deduza acusação particular.
- A queixa não tem seguimento, se a pessoa que a fez não declarar que se quer constituir assistente, não sendo o processo instruído enquanto não requerer a respectiva constituição e como tal não for constituída.
- O Ministério Público procede às diligências necessárias à descoberta da verdade e à instrução do processo, podendo deduzir acusação, participar nas fases seguintes, em todos os actos processuais em que intervier o assistente e recorrer das decisões judiciais.
- É aplicável à queixa a que se refere este artigo o preceituado n.º 3 do artigo anterior.
Artigo 52.º (Legitimidade no Concurso de Infracções Penais)
- Havendo concurso de infracções, o Ministério Público promove o processo por aquelas infracções para que tiver legitimidade, caso o procedimento criminal pela infracção mais grave não dependa de queixa ou de acusação particular, procedendo, de igual modo, se as infracções forem de igual gravidade.
- Se a infracção pela qual o Ministério Público tiver legitimidade for de menor gravidade, os titulares do direito de queixa ou de acusação particular são notificados para declararem, no prazo de 5 dias, se querem ou não usar de tal direito.
- Se os titulares do direito de queixa ou de acusação particular nada declararem ou declararem que não desejam apresentar queixa, o Ministério Público promove o processo pelas infracções para cujo procedimento criminal tiver legitimidade.
- Se os titulares do direito de queixa declararem que pretendem apresentá-la, considera-se esta apresentada, devendo o Ministério Público proceder de acordo com o disposto no número anterior.
- O Ministério Público procede do mesmo modo quando, sendo o crime particular, o titular da acusação não declarar na queixa que se quer constituir assistente e não requerer a respectiva constituição, no prazo de 5 dias.
- O presente artigo é aplicável aos casos em que o procedimento criminal depender da participação de certas autoridades.
Artigo 53.º (Desistência da Queixa ou da Acusação Particular)
- Nos processos em que a legitimidade do Ministério Público depender de queixa ou de acusação particular do ofendido ou de outra pessoa, nos termos dos artigos 50.º e 51.º, a intervenção do Ministério Público termina com a homologação da desistência da queixa ou da acusação particular.
- A homologação da desistência compete à autoridade judiciária que dirigir a fase do processo em que ela ocorrer.
- Antes de a homologar, deve a autoridade judiciária competente a que se refere o número anterior notificar o arguido para, no prazo de 5 dias, declarar se a ela se opõe, entendendo-se como não oposição a falta de declaração.
- Se o arguido não for pessoalmente notificado por ser desconhecido o seu paradeiro, é notificado por editais.
Artigo 54.º (Impedimentos e Suspeição)
- Aplicam-se ao Ministério Público, com as necessárias adaptações, as disposições estabelecidas para os juízes nos artigos 35.º a 47.º, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.
- A declaração oficiosa de impedimento ou o requerimento para que o magistrado do Ministério Público seja declarado impedido, tal como o requerimento a recusá-lo, são dirigidos ao respectivo superior hierárquico, que decide a título definitivo e sem obediência a formalismo especial.
- Quando o magistrado do Ministério Público for o Procurador Geral da República, compete à Câmara competente do Tribunal Supremo apreciar a declaração ou os requerimentos.
- A entidade competente para decidir, nos termos dos números anteriores, designa o substituto do magistrado impedido.
SECÇÃO II OS ÓRGÃOS DE POLÍCIA CRIMINAL
Artigo 55.º (Órgãos de Polícia Criminal)
- Compete aos Órgãos de Polícia Criminal assistir e coadjuvar o Ministério Público no exercício das funções que desempenham na realização dos fins do processo e na Administração da Justiça Penal, procedendo, nomeadamente, à investigação das infracções penais e à instrução dos processos.
- Compete, em especial, aos Órgãos de Polícia Criminal:
- a)- Proceder aos interrogatórios do arguido em liberdade e aos interrogatórios subsequentes do arguido preso, nos termos do presente Código;
- b)- Ordenar revistas e buscas, nos termos do presente Código;
- c)- Acompanhar as buscas autorizadas pela autoridade judiciária competente;
- d)- Ordenar a apreensão de objectos relacionados com a infracção penal cometida, nos termos do presente Código;
- e)- Ordenar a detenção fora do flagrante delito, nos termos do n.º 3 do artigo 254.º.
- Os actos a que se referem as alíneas b), d) e e) do número anterior devem ser comunicados ao Ministério Público, no prazo máximo de 24 horas.
- Os Órgãos de Polícia Criminal actuam no processo sob direcção do Ministério Público, sem prejuízo da sua autonomia técnica e operacional.
Artigo 56.º (Órgãos de Polícia Criminal de Competência Genérica e Específica)
- São Órgãos de Polícia Criminal de competência genérica os serviços competentes de investigação criminal e a Polícia Nacional.
- São Órgãos de Polícia Criminal de competência específica, aqueles a quem a lei tenha conferido ou venha a conferir tal estatuto.
Artigo 57.º (Medidas Especiais de Polícia Criminal)
- Os Órgãos de Polícia Criminal utilizam as medidas de polícia para cumprimento das tarefas a si acometidas por lei e definidas pela autoridade judiciária, podendo impor restrições ou recorrer a meios coercivos quando tal se mostre adequado e necessário, dentro dos limites legais.
- Sem prejuízo do disposto no número anterior, podem os Órgãos de Polícia Criminal proceder à vigilância de pessoas, edifícios e estabelecimentos, destinada a prevenir ou combater a prática de crimes.
SECÇÃO III ASSISTENTES
Artigo 58.º (Noção de Assistente)
- Os assistentes são, no Processo Penal, auxiliares do Ministério Público.
- Os assistentes subordinam, sem prejuízo das excepções estabelecidas por lei, a sua actuação no processo à actividade do Ministério Público.
Artigo 59.º (Quem Pode Constituir-se Assistente no Processo)
- Podem constituir-se assistentes no processo:
- a)- Os ofendidos, considerados como tais os titulares dos interesses especialmente protegidos pela norma incriminadora;
- b)- As pessoas de cuja queixa ou acusação particular depender o procedimento criminal;
- c)- O cônjuge sobrevivo do ofendido falecido sem ter renunciado ao direito de queixa ou a pessoa que com ele vivia em situação análoga a dos cônjuges, assim como os seus descendentes e adoptados, ascendentes ou adoptantes e os irmãos e seus descendentes, se não tiverem comparticipado no crime;
- d)- O representante legal de ofendido menor de 16 anos e, na sua falta, as pessoas enumeradas na alínea anterior, segundo a ordem nela estabelecida e com as necessárias adaptações, que não tenham participado no crime;
- e)- Qualquer pessoa nos crimes contra a paz e a humanidade, nos crimes ambientais e contra o património público;
- f)- As pessoas a quem outra lei atribuir esse direito.
- Se mais de uma das pessoas, de entre as mencionadas nas alíneas c) e d) do número anterior, requerer a constituição de assistente, a prioridade deve ser concedida àquela que primeiramente a tiver requerido.
Artigo 60.º (Constituição de Assistente. Procedimento)
- A constituição de assistente pode ser requerida ao magistrado do Ministério Público, na fase de instrução preparatória, ou ao juiz, nas restantes fases do processo, até 5 dias antes da audiência do julgamento.
- Junto o duplicado da guia de depósito da taxa de justiça devida, o juiz decide, definitivamente, por despacho, admitindo ou não o requerente como assistente, mandando logo notificar da decisão o Ministério Público e o arguido.
- Na fase de instrução preparatória, a constituição de assistente e os incidentes a que der lugar podem correr em procedimento separado, com junção dos elementos necessários à decisão.
- Só depois de o requerente ser admitido como assistente, e junto o duplicado da guia de depósito da taxa de justiça devida, pode em tal qualidade intervir no processo, que tem de aceitar no estado em que o encontrar.
Artigo 61.º (Representação Judiciária do Assistente)
- Os assistentes são obrigatoriamente representados no processo por advogado, podendo fazer-se acompanhar por ele nas diligências em que tenham de intervir.
- No caso de haver vários assistentes, todos são representados pelo mesmo advogado e, não havendo acordo quanto à escolha, decide o magistrado competente, nos termos do artigo 60.º, n.º 1.
- O disposto no número anterior não se aplica no caso de haver incompatibilidade de interesses.
- Não se aplica, do mesmo modo, quando ao arguido forem imputados vários crimes, caso em que a pessoa, ou grupo de pessoas, a quem a lei permitir a constituição de assistente por cada um dos crimes cometidos pode constituir advogado.
- Nenhum assistente pode ser representado por mais de um advogado.
Artigo 62.º (Atribuições do Assistente)
Além de colaborar em geral com o Ministério Público e o auxiliar na sua actuação processual, compete em especial ao assistente:
- a)- Intervir na instrução preparatória, oferecendo provas e requerendo as diligências que entender necessárias;
- b)- Deduzir acusação independente da acusação do Ministério Público;
- c)- Requerer a abertura de instrução contraditória e intervir nas respectivas diligências;
- d)- Participar na fase do julgamento e interpor recursos das decisões do juiz com as quais não se conformar, mesmo desacompanhado do Ministério Público.
CAPÍTULO III ARGUIDO E DEFENSOR
SECÇÃO I ARGUIDO
Artigo 63.º (Aquisição da Qualidade Processual de Arguido)
- Assume a qualidade de arguido num Processo Penal todo aquele sobre quem recai forte suspeita de que tenha praticado um crime suficientemente comprovado.
- Assume imediata e automaticamente a posição processual de arguido a pessoa contra quem foi deduzida acusação ou requerida instrução contraditória.
- Assume igualmente a posição de arguido quem, como tal, for constituído nos termos dos artigos 64.º e 65.º.
- A qualidade de arguido mantém-se durante todo o decurso do processo.
- É correspondentemente aplicável o disposto no n.º 4 do artigo seguinte, com as devidas adaptações.
Artigo 64.º (Constituição de Arguido)
- É obrigatória a constituição de arguido:
- a)- Logo que, em instrução preparatória, aberta contra pessoa determinada, esta prestar declarações perante o magistrado do Ministério Público ou Órgão de Polícia Criminal;
- b)- Quando tenha de ser aplicada a alguém uma medida de coacção ou de garantia patrimonial;
- c)- Em caso de detenção de qualquer pessoa, nos termos dos artigos 250.º e seguintes;
- d)- Sempre que, sendo levantado auto de notícia em que se considere como agente de um crime determinada pessoa, o auto lhe tiver sido comunicado e a notícia não for manifestamente infundada.
- A constituição de arguido, nos termos do presente artigo, só se considera realizada com:
- a)- A comunicação, oral ou escrita, feita pelo magistrado do Ministério Público ou Órgão de Polícia Criminal, conforme o caso, à pessoa visada em qualquer uma das situações previstas no número anterior, de que, a partir daquele momento, passa a ter no processo a posição de arguido: e, b)- A indicação dos direitos e deveres que competem a essa pessoa, nos termos dos artigos 67.º e 68.º.
- A entidade que proceder à comunicação e indicação a que se referem o número anterior deve entregar ao arguido nota escrita em que se procede à identificação do processo e do defensor que lhe tenha sido nomeado e em que se refiram os factos ou o crime que lhe são imputados.
- As declarações prestadas no processo por qualquer pessoa, antes de ter sido constituída como arguido, não podem ser utilizadas como meio de prova contra ela.
Artigo 65.º (Constituição de Arguido Oficiosamente e a Requerimento de Suspeito)
- Se, em qualquer acto de inquirição ou de declarações de pessoa que não é arguido, surgir fundada suspeita de que ela cometeu um crime, a entidade que preside ao acto deve suspendê-lo de imediato e proceder à comunicação e à indicação a que se referem as alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo anterior.
- A pessoa que se der conta de que é objecto de suspeita de ter cometido um crime e de que estão a ser efectuadas diligências destinadas a imputar-lho tem o direito de requerer e exigir a sua constituição como arguido e de, nessa posição processual, passar a ser ouvida.
- No caso referido no número anterior, o requerente considera-se constituído arguido desde a data do despacho a deferir o requerimento ou daquela em que for ouvido como arguido.
- É correspondentemente aplicável o disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 64.º.
Artigo 66.º (Direitos e Deveres Processuais do Arguido)
Ao arguido é, em geral, garantido, desde que adquire tal posição, o exercício, nos termos da lei, dos direitos atribuídos e dos deveres impostos pela Lei Reguladora do Processo Penal.
Artigo 67.º (Direitos do Arguido em Especial)
- São, entre outros, direitos processuais do arguido:
- a)- Estar presente nos actos processuais que directamente lhe disserem respeito;
- b)- Ser ouvido pelo magistrado competente quando este tenha de tomar decisões que pessoalmente o possam afectar;
- c)- Ser informado, pelas autoridades judiciárias ou pelo Órgão de Polícia Criminal perante quem seja obrigado a comparecer, dos direitos que a lei lhe concede;
- d)- Não responder às perguntas que lhe forem feitas quer sobre os factos que lhe forem imputados quer sobre o conteúdo das declarações que acerca deles prestar;
- e)- Escolher defensor ou pedir ao magistrado competente que lho nomeie;
- f)- Ser assistido pelo seu defensor em todos os actos processuais em que participar e, se estiver detido, o de comunicar-se em privado com ele;
- g)- Intervir nas fases de instrução preparatória e contraditória, oferecendo provas e requerendo as diligências que reputar necessárias;
- h)- Impugnar, mediante reclamação ou recurso, nos termos da lei, as decisões que lhe forem desfavoráveis.
- A comunicação do arguido, em privado, com o seu defensor, a que se refere a alínea f) do número anterior, pode fazer-se, quando razões de segurança o determinarem, à vista de um encarregado de vigilância, mas de tal forma que este não possa ouvi-los.
Artigo 68.º (Deveres Processuais do Arguido em Especial)
São, entre outros, deveres processuais do arguido:
- a)- Comparecer perante o juiz, o Ministério Público ou os Órgãos de Polícia Criminal quando, para tanto, tiver sido convocado, nos termos legais;
- b)- Responder com verdade às perguntas sobre a sua identidade e sobre os seus antecedentes criminais;
- c)- Submeter-se às diligências de prova e às medidas de coacção e garantia patrimonial ordenadas pela entidade competente, nos termos da lei;
- d)- Não perturbar a instrução e o normal desenvolvimento do processo.
SECÇÃO II DEFENSOR
Artigo 69.º (Defensor Constituído ou Nomeado)
- O arguido pode constituir advogado em qualquer altura do processo.
- Se o arguido constituir mais de um advogado para o defender, as notificações são feitas àquele que, em primeiro lugar, tiver sido indicado no acto de constituição.
- Quando, nos casos em que a lei determinar que a assistência do arguido por advogado é obrigatória, ele não tiver advogado constituído e, no acto, não o constituir ou ainda se, tendo advogado constituído, este não puder ser convocado ou se, devidamente convocado, não comparecer, o juiz ou o magistrado do Ministério Público ou o Órgão de Polícia Criminal que a ele presidir, nomeia-lhe um defensor.
- A nomeação a que se refere o número anterior deve recair em defensor público ou, não sendo possível, em advogado, advogado estagiário, licenciado em direito ou estudante de direito ou, na sua falta, em pessoa idónea.
- Na fase de instrução preparatória não pode nunca ser nomeado defensor do arguido agente ou funcionário do organismo onde corre o processo e se realiza o acto.
Artigo 70.º (Regime Aplicável ao Defensor Nomeado)
- A nomeação de defensor é notificada ao arguido e ao defensor, sempre que não estiverem presentes no acto em que a nomeação é feita.
- O defensor nomeado pode ser dispensado do patrocínio, se alegar causa justa e a entidade que o nomeou a reconhecer, ou ser substituído por outro, com o mesmo fundamento, a requerimento do arguido.
- O defensor nomeado para um acto processual mantém-se para os actos subsequentes do processo, enquanto não for substituído por outro ou por defensor constituído pelo arguido.
- O exercício de funções do defensor nomeado é remunerado nos termos da lei.
Artigo 71.º (Assistência Obrigatória do Defensor)
- É obrigatória a assistência do defensor:
- a)- Em todos os interrogatórios de arguido detido ou preso;
- b)- No debate instrutório e na audiência de julgamento, em 1.ª instância ou em recurso;
- c)- Em todo e qualquer acto processual em que intervier arguido surdo, mudo, surdo-mudo ou cego, menor de 18 anos ou sempre que, em relação ao arguido, se colocar a questão de saber se é inimputável ou tem a imputabilidade diminuída;
- d)- Nos demais casos determinados por lei.
- Deduzida a acusação sem o arguido tenha advogado constituído ou defensor nomeado, o Ministério Público promove e o juiz procede à respectiva nomeação, logo que o processo lhe seja concluso.
- O juiz deve igualmente, no despacho que admitir o recurso, nomear defensor ao arguido que não tiver advogado constituído ou defensor, público ou nomeado.
- Fora dos casos previstos no número anterior, deve o Tribunal, oficiosamente ou a requerimento do arguido, nomear defensor, sempre que as circunstâncias do caso concreto revelarem a necessidade de o arguido ser assistido.
Artigo 72.º (Assistência a mais de Um Arguido)
- O defensor pode, no mesmo processo, prestar assistência jurídica a mais do que um arguido, sempre que a defesa de um n ão for incompatível com a defesa do outro ou outros.
- Quando um ou mais arguidos tiverem constituído advogado e os outros não, o juiz pode nomear, de entre os advogados constituídos, um ou mais para prestarem assistência àqueles que a não tiverem, salvo se as respectivas defesas forem incompatíveis.
Artigo 73.º (Direitos do Defensor)
- O defensor exerce no processo, além dos direitos próprios que lhe são atribuídos no presente Código, todos os que são, por lei, atribuídos ao arguido, à excepção dos que este tiver de exercer pessoalmente.
- Os actos praticados pelo defensor não produzem efeitos, sempre que, antes da decisão que sobre tais actos recair, o arguido declarar que se opõe a eles e não lhes reconhece valor.
Artigo 74.º (Substituição de Defensor)
- Se o defensor, relativamente a acto em que a assistência ao arguido é obrigatória, não comparecer, se ausentar antes de o acto terminar ou recusar ou abandonar a defesa, é imediatamente substituído por outro defensor.
- Se, no caso do número anterior, a nomeação imediata não for possível ou se se revelar inconveniente, pode a realização do acto ser interrompida ou, se isso for absolutamente necessário, adiado o acto ou a audiência, por um período não superior a oito dias.
- Quando o defensor for substituído durante o debate instrutório ou durante a audiência, pode o juiz autorizar que os actos sejam interrompidos para que o novo defensor examine o processo e conferencie com o arguido.
CAPÍTULO IV RESPONSABILIDADE CIVIL
Artigo 75.º (Princípio da Adesão)
O pedido de indemnização por danos resultantes da prática de um crime é deduzido no Processo Penal correspondente, só o podendo ser em acção civil intentada no Tribunal Cível competente nos casos declarados na lei.
Artigo 76.º (Princípio da Opção ou da Alternatividade)
- O pedido de indemnização por danos resultantes da prática de um crime pode ser formulado em acção intentada no Tribunal Cível competente, quando:
- a)- A acusação não for deduzida no prazo de um ano a contar da notícia do crime ou o Processo Penal instaurado estiver sem andamento durante o mesmo período de tempo;
- b)- O processo tiver sido arquivado, suspenso provisoriamente ou declarado extinto, nos termos do presente Código, antes do trânsito em julgado da sentença nela proferida;
- c)- O procedimento depender de queixa ou de acusação particular;
- d)- O pedido for formulado contra o arguido e, simultaneamente, contra outras pessoas com responsabilidade meramente civil, nos termos do artigo 78.º, n.º 2;
- e)- O pedido for formulado contra pessoas com responsabilidade meramente civil e estas chamarem o arguido à demanda, nos termos da Lei Reguladora do Processo Civil;
- f)- O Tribunal remeter as partes para o Tribunal Civil, nos termos do n.º 2 do artigo 77.º;
- g)- O lesado não tiver sido informado da faculdade de proceder ao pedido de indemnização no Processo Penal ou não tiver sido notificado para a fazer, nos termos dos artigos 80.º, n.º 1, e 82.º, n.º 2, respectivamente;
- h)- À data da acusação, não houver, serem desconhecidos ou não estiverem determinados em toda a sua extensão danos resultantes da prática do crime.
- Quando o procedimento criminal pelo crime cometido depender de queixa ou de acusação particular, a instauração da acção no Tribunal Cível competente, pelos titulares do direito de queixa ou de acusação particular, tem o valor de renúncia a esse direito, no caso de a acção ser proposta antes da instauração do Processo Penal ou de desistência, no caso de a acção ter sido proposta depois.
Artigo 77.º (Outros Casos de Pedido em Separado)
- O pedido de indemnização é sempre formulado em acção proposta no Tribunal Cível competente, quando:
- a)- O julgamento for efectuado em processo sumário;
- b)- O Processo Penal correr perante Tribunal Militar.
- O Tribunal pode, oficialmente ou a requerimento das partes, remeter estas para os Tribunais Cíveis, sempre que as questões levantadas pelo pedido de indemnização formulado não lhe permitirem tomar uma decisão correcta ou forem susceptíveis de produzir incidentes que possam retardar, de forma intolerável, o andamento do Processo Penal.
Artigo 78.º (Legitimidade)
- O pedido de indemnização é deduzido pelo lesado, sem necessidade de se constituir assistente, e mesmo que não tenha a faculdade de se constituir assistente.
- O pedido é formulado contra o arguido ou contra as pessoas com responsabilidade meramente civil ou contra uns e outros simultaneamente.
- Considera-se lesado qualquer pessoa que tenha sofrido danos ocasionados pela prática do crime.
- O lesado não interfere, salvo se for assistente, em matéria especificamente penal, restringindo-se a sua actuação à defesa e à prova do pedido de indemnização que formulou, competindo-lhe, nessa medida e com as devidas adaptações, os direitos que a lei confere aos assistentes.
Artigo 79.º (Intervenção de Pessoas com Responsabilidade Meramente Civil)
- As pessoas com responsabilidade meramente civil podem intervir voluntariamente no Processo Penal ou ser chamadas à demanda pelo arguido.
- As pessoas que intervierem voluntariamente no processo não podem praticar actos que o arguido tenha perdido o direito de praticar.
- Os intervenientes, tal como os demandados ou os chamados à demanda, têm posição processual semelhante à do arguido no que diz respeito às questões relativas ao pedido de indemnização deduzido pelo lesado, mas é independente a defesa de cada um deles.
Artigo 80.º (Informações a Prestar ao Lesado)
- As autoridades judiciárias e os Órgãos de Polícia Criminal devem, a partir do primeiro acto em que eles tenham intervenção, informar os lesados da faculdade que a lei lhes concede de deduzirem, no Processo Penal, pedido de indemnização pelos danos materiais e morais que o crime lhes causou, indicando-lhes as formalidades estabelecidas, nomeadamente, nos artigos 81.º e 82.º.
- Qualquer lesado, informado ou não, nos termos do número anterior, pode declarar, até ao encerramento da fase de instrução preparatória, o seu propósito de formular, no Processo Penal, pedido de indemnização.
- A declaração não obedece a formalismos especiais e, sendo feita verbalmente, é reduzida a auto.
Artigo 81.º (Representação)
- A representação do lesado por advogado no pedido de indemnização formulado no Processo Penal é obrigatória, nos mesmos termos em que o seria se o pedido fosse formulado em separado na jurisdição civil.
- Os demandados e os intervenientes são sempre representados por advogado.
- O Ministério Público pode formular o pedido de indemnização em nome do Estado e das outras pessoas que, por lei, lhe caiba representar.
Artigo 82.º (Pedido)
- O pedido é formulado na acusação ou em requerimento articulado dentro do prazo para aquela ser deduzida, sempre que for apresentado pelo Ministério Público ou pelo assistente.
- O lesado que tiver manifestado o propósito de deduzir pedido de indemnização, nos termos do artigo 80.º, n.º 2, é notificado da acusação ou, na sua falta, do Despacho de Pronúncia, se houver lugar a ele, para, no prazo de 15 dias, formular pedido em requerimento deduzido por artigos.
- O lesado que não tiver manifestado o propósito de formular pedido de indemnização ou não tiver sido notificado para o fazer, nos termos do número anterior, pode deduzi-lo pela mesma forma até 15 dias depois de o arguido ser notificado da acusação ou, não a tendo havido, do Despacho de Pronúncia.
- O pedido é acompanhado de tantos exemplares quanto os demandados e mais um, para arquivo no Cartório do Tribunal.
Artigo 83.º (Contestação)
- A pessoa contra a qual for formulado o pedido de indemnização civil, nos termos do artigo anterior, é notificado para contestar, querendo, no prazo de 20 dias.
- A contestação é deduzida por artigos.
- A falta de contestação não implica a confissão dos factos alegados no requerimento inicial.
Artigo 84.º (Prova)
- A prova é junta, indicada ou requerida com os articulados.
- O número de testemunhas não pode ser superior a 8 por cada um dos requerentes.
Artigo 85.º (Julgamento)
O lesado, os demandados e os intervenientes não são obrigados a comparecer na audiência de julgamento, salvo se tiverem de ser ouvidos em declarações a cuja prestação não puderem furtar-se.
Artigo 86.º (Desistência e Renúncia ao Pedido)
O lesado pode, em qualquer fase do processo, desistir do direito de indemnização civil ou requerer que o seu objecto seja reconvertido, nos termos permitidos por lei, ou renunciar a ele.
Artigo 87.º (Liquidação da Indemnização em Execução de Sentença)
- Quando não dispuser de elementos bastantes para fixar a indemnização, o Tribunal pode condenar no que vier a ser liquidado em execução de sentença em acção cível.
- O Tribunal pode, oficiosamente ou a requerimento das partes, estabelecer uma indemnização provisória por conta da indemnização definitiva que vier a ser liquidada na execução da sentença.
Artigo 88.º (Remessa das Partes para o Tribunal Cível)
Quando, no pedido de indemnização civil formulado no Processo Penal, forem levantadas questões que tornem difícil ou impeçam uma decisão rigorosa ou forem de molde a retardar, de forma intolerável, o Processo Penal, o Tribunal pode, oficiosamente ou a requerimento das partes, remeter estas para os Tribunais Civis.
Artigo 89.º (Indemnização Oficiosa em Caso de Condenação)
- Sempre que não tiver sido deduzido pedido civil de indemnização, quer no Processo Penal, quer em separado, nos termos dos artigos 75.º a 77.º, o Tribunal pode, em caso de condenação, arbitrar a favor dos lesados uma quantia, a título de indemnização, pelos prejuízos resultantes do crime cometido pelo condenado.
- O Tribunal, ao determinar a quantia a arbitrar a título de indemnização, deve garantir o funcionamento do princípio do contraditório e ter em consideração, além dos elementos fornecidos pelo processo, as exigências de protecção da vítima.
- É correspondentemente aplicável o disposto no n.º 1 do artigo 87.º.
- A quantia arbitrada deve ser levada em conta na acção que conhecer do pedido de indemnização que, nos termos da lei, vier a ser intentada no foro cível.
Artigo 90.º (Prosseguimento da Acção Penal em Caso de Amnistia)
Em caso de amnistia, a acção penal pode, a requerimento do lesado ou do Ministério Público, prosseguir os seus trâmites, unicamente, para efeitos de determinação da responsabilidade civil do arguido.
Artigo 91.º (Caso Julgado)
A decisão penal, condenatória ou absolutória, que conhecer do pedido de indemnização deduzido no Processo Penal constitui caso julgado nos mesmos termos e com os mesmos efeitos do caso julgado das decisões proferidas em processo civil.
Artigo 92.º (Execução da Decisão Condenatória)
- A execução da decisão que, no Processo Penal, condenar em indemnização por danos resultantes do crime cometido é requerida perante o Tribunal Cível competente.
- Serve de título executivo a certidão da decisão penal condenatória transitada em julgado.
Artigo 93.º (Execução Requerida Oficiosamente pelo Ministério Público)
- Sempre que, no caso previsto no artigo 89.º, o titular da indemnização arbitrada não estiver representado no processo por advogado, deve o magistrado do Ministério Público junto do Tribunal que a arbitrou verificar se o respectivo pagamento se encontra ou não efectuado.
- Para efeitos do disposto do número anterior, ao sexagésimo dia contado a partir da data do trânsito em julgado da decisão condenatória, o escrivão dá vista no processo ao magistrado referido no número anterior.
- Se, pelo exame do processo, se verificar que a indemnização não se encontra paga, o magistrado do Ministério Público manda notificar ou avisar o devedor para que ele, no prazo de 30 dias, faça prova do pagamento ou do depósito à ordem do Tribunal do montante da indemnização.
- Decorrido o prazo estabelecido no número anterior sem se mostrarem efectuados os pagamentos ou o depósito do montante da indemnização, o Ministério Público promove no Tribunal competente a correspondente execução.
- O montante da indemnização ou parte dela que se conseguir obter com a execução é entregue ao respectivo titular, sem encargos ou impostos, salvo o imposto de selo.
TÍTULO III ACTOS PROCESSUAIS
CAPÍTULO I PRINCÍPIOS E REGRAS GERAIS
Artigo 94.º (Disciplina dos Actos Processuais)
- Compete às autoridades ou funcionários de justiça, que a eles presidirem ou que os dirigirem, manter a ordem nos actos processuais e tomar as medidas necessárias contra aquele que perturbar os respectivos trabalhos, podendo obrigá-lo a sair do lugar onde o acto está a decorrer.
- Quando o acto for presidido pelo juiz, este pode ordenar a detenção do perturbador que tenha de intervir ou voltar a intervir no mesmo acto ou naquele que se lhe seguir, e tiver de realizar-se no mesmo dia, enquanto a sua presença for julgada necessária.
- Se o perturbador praticar qualquer infracção penal, a entidade que presidir ao acto levanta ou manda levantar auto de notícia e, consoante o caso, detém-no ou manda detê-lo.
- As autoridades judiciárias podem, se isso se tornar necessário para a realização do acto, requisitar o auxílio da força pública que, em tal caso, fica submetida ao seu poder de direcção.
- Se a entidade que presidir ao acto não for uma autoridade judiciária, deve requisitar o auxílio da força pública por via da autoridade judiciária competente.
Artigo 95.º (Publicidade)
- O Processo Penal é público, sob pena de nulidade, a partir do Despacho de Pronúncia ou, não tendo havido instrução contraditória, do Despacho que designar dia para julgamento.
- A publicidade determina, em princípio, o direito de:
- a)- Assistência aos actos processuais realizados no processo;
- b)- A divulgação dos actos processuais pelos meios de comunicação social;
- c)- A consulta do processo e a possibilidade de obtenção de certidões, cópias ou extractos de qualquer peça ou elemento que dele faça parte.
- A publicidade não abrange os dados, peças e elementos relativos à reserva da vida privada que não constituírem meio de prova, cabendo ao juiz especificá-los por despacho e ordenar a sua destruição ou a respectiva entrega à pessoa a que disserem respeito.
Artigo 96.º (Assistência do Público a Actos Processuais)
- Qualquer pessoa pode assistir aos actos processuais declarados públicos por lei, com as restrições dos números seguintes.
- O juiz pode, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, do assistente ou do arguido, limitar ou proibir o acesso do público a um acto processual quando, face às circunstâncias do caso, for de recear que a publicidade:
- a)- Ofenda gravemente a dignidade e os sentimentos das pessoas;
- b)- Perturbe a normal realização do acto.
- O acesso do público à audiência de julgamento é sempre limitado nos casos de crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexuais.
- O juiz pode impedir a assistência a acto processual de acesso público a menores de 16 anos e a pessoas que possam pôr em risco a disciplina do acto.
- As restrições à liberdade estabelecidas no n.º 3 não incluem a leitura da sentença.
- Nos casos referidos nos n.os 2 e 3, apenas assistem ao acto as pessoas nele ordem profissional, científica, académica ou outras que considerar igualmente atendíveis.
Artigo 97.º (Segredo de Justiça)
- O processo está sujeito a segredo de justiça até ser proferido Despacho de Pronúncia ou, não tendo havido instrução contraditória, Despacho que designar dia para julgamento.
- O segredo de justiça determina a proibição de:
- a)- Aqueles que não tiverem o direito ou dever de estar presentes, assistirem aos actos praticados no processo ou de tomarem conhecimento do seu conteúdo;
- b)- As pessoas, ao mesmo vinculadas, divulgarem a realização de actos processuais ou aquilo que neles tiver ocorrido.
Artigo 98.º (Pessoas Obrigadas a Segredo de Justiça)
- Estão sujeitos a segredo de justiça as autoridades judiciárias, os membros dos Órgãos de Polícia Criminal, os sujeitos e os simples participantes processuais e, em geral, todas as pessoas que, a qualquer título e por qualquer forma tomarem conhecimento de elementos do processo protegidos por segredo de justiça.
- A violação do segredo de justiça pelas pessoas a elas sujeitas é punida nos termos da Lei Penal.
Artigo 99.º (Divulgação de Elementos do Processo Cobertos por Segredo de Justiça)
- A autoridade judiciária competente pode, através de despacho fundamentado, ordenar ou permitir que o conteúdo de um acto processual ou de documento sujeitos a segredo de justiça sejam dados a conhecer a determinadas pessoas, quando tal conhecimento não puser em causa a investigação dos factos e se afigurar conveniente ao esclarecimento da verdade ou indispensável ao exercício de direitos de que sejam titulares essas pessoas, limitando-se ao mínimo necessário.
- As pessoas a quem seja dado a conhecer o teor de acto processual ou de documento sujeitos a segredo de justiça, nos termos do número anterior, ficam adstritos a esse segredo.
- O segredo de justiça não impede que, a requerimento de pessoas publicamente postas em causa ou para garantir a tranquilidade pública e a segurança de pessoas e bens, a autoridade judiciária competente preste esclarecimentos públicos, sempre que estes forem necessários ao restabelecimento da verdade e não prejudicarem a investigação.