Acórdão de 17 de junho
- Diploma: Acórdão de 17 de junho
- Entidade Legisladora: Tribunal Supremo
- Publicação: Diário da República Iª Série n.º 112 de 17 de Junho de 2010 (Pág. 1048)
Denominação do DiplomaEm nome do povo, acordam em conferência, no Tribunal Pleno e de Recurso. Ao abrigo do que dispõem os artigos 48.º e 49.º da Lei n.º 20/88, combinados com os artigos 763.º e seguintes do CPCivil, vem o venerando Presidente do Tribunal Supremo propor: Recurso para Uniformização de Jurisprudência, para a final emitir resolução, cuidando de que para a configuração e consumação do crime do artigo 353.º do CPenal é de todo determinante a propinação, intenção de causar à morte e a capacidade mortífera da substância, sendo o mais irrelevante, para tanto invocando a existência de oposição entre o acórdão tirado em 6 de Agosto de 1993, no Recurso n.º 520 e o acórdão de 5 de Julho de 1991 – in Recurso n.º 312, em que o réu foi absolvido, contrariamente ao verificado naquele inicialmente citado no qual houve condenação, tendo ambos os arestos versado sobre a mesma questão fundamental de direito, proferidos pelo mesmo Tribunal, no domínio da mesma legislação e há muito transitados em julgado. Estão nos autos os acórdãos em causa e antes nomeados na proposta. Distribuídos ao Conselheiro Relator coube mandar expurgar documentação ao processo tida por estranha, seguindo-se novo despacho aqui ordenando que os autos fossem com vista aos juízes-adjuntos para posterior apreciação da questão prévia. Deste modo, um dos conselheiros-adjuntos, que logo de seguida seria secundado, deixou nos autos o seguinte entendimento: Sou de parecer que a questão prévia da existência ou não de oposição de acórdãos para o efeito da admissão de recurso, a que se refere o n.º 1 do artigo 766.º da CP Civil, deve ser visto a nível da Câmara dos Crimes Comuns, que substitui as secções em que se divide o Supremo Tribunal de Justiça Português, dado o que consta dos artigos 10.º alínea b) e 20.º, ambos da Lei n.º 18/88, pelo que me abstenho de opor o meu visto. Colhidos ainda outros vistos nos autos recaiu despacho para remessa à Câmara Criminal do Tribunal Supremo, onde distribuídos, precedente exposição, foi proferido o acórdão de 27 de Junho de 1996, confirmando haver oposição que serve de base à proposta do recurso, nos termos do n.º 1 do artigo 766.º do CPCivil — folhas 31 a 33 e finalmente devolvidos. No Tribunal Pleno e de Recurso, mandados à vista, o Ministério Público foi do parecer seguinte: Somos concorde com a interpretação do artigo 353.º do Código Penal que vai no sentido de que «para configuração e consumação do crime de envenenamento, previsto e punido pelo artigo 353.º do CPenal, basta a propinação, intenção de causar a morte e capacidade mortífera da substância, sendo de todo em todo irrelevante não só o modo, perfeito ou imperfeito, como as substâncias são ministradas, como também a sua absorção ou não pela pessoa visada», pelos fundamentos da declaração de voto de vencido que subscrevemos e a damos por aqui inteiramente reproduzida. Porque o que está em causa é o desvalor da acção do indivíduo que ministra o veneno, acção presidida pela intenção teleológica de matar. Vale a imputação da conduta não do resultado. Basta para tanto que o agente saiba que está a praticar uma acção de envenenamento e querê-la, basta o elemento subjectivo do tipo e sua inserção no tipo legal. Existirá, portanto, o crime desde que se começam a praticar actos de execução, como a mistura do veneno nos alimentos destinados à vítima. Logo, para a integração do crime basta que se Publicado na I ª Série do Diário da República n.º 112 de 17 de Junho de 2010 Página 1 de 3 agente. No envenenamento a própria conduta do autor conduzente àquele resultado danoso parece logo à partida revestida de grande desvalor para a ordem jurídico-penal não se encontra razão para só no caso de vir a revelar-se um perigo efectivo como que uma prova à resistência, para um concreto objecto de protecção dever intervir a punição prevista nesta norma.
- Ataca-se a perigosidade da acção, a característica da acção de envenenar. Não abrange o resultado, seja este considerado como o próprio envenenamento da vítima em si ou como a criação de um concreto perigo para a vítima. O envenenamento é um crime de perigo, crime de perigosidade do meio. — Folhas 37 a 38. Correram os vistos legais, termos por que cabe agora apreciar e para posterior decisão. Mas apreciando. Refere o artigo 763.º que se, no domínio da mesma legislação forem proferidos dois acórdãos que, relativamente à mesma questão fundamental de direito, assentem sobre soluções opostas pode recorrer-se do acórdão proferido em último lugar. Nestes autos, dúvidas não se levantam sobre qual o objecto do recurso.
- Trata-se de afastar o aparente conflito existente entre os Acórdãos n.os 520 e o 312, de 6 de Agosto de 1993 e 5 de Julho de 1991, respectivamente, porquanto assentes sobre diferentes soluções. Ambos os acórdãos foram proferidos no domínio da mesma legislação, mantida intacta nesse espaço de tempo. Não deixa de nos afigurar menos pertinente referir que o presente recurso apresenta-se agora possível, graças a inovações introduzidas no CPCivil, permitindo ver coberta proposta da iniciativa do Presidente do Tribunal Supremo, nos termos dos artigos 48.º e 49.º da Lei n.º 20/88, o que reflecte harmonia ditada pelo legislador do SUJustiça quando olhadas tais modificações legislativas num plano mais global cujos exemplos podem ser acolhidos a partir das normas ditadas para o recurso extraordinário de cassação — artigos 53.º e seguintes da mesma lei e outras extraídas do Diploma Regulamentar do Sistema — artigos 92.º e 94.º do Decreto n.º 27/90, de 3 de Novembro. A Câmara dos Crimes Comuns no seu acórdão na folha 32 destes autos concluiu, nos termos do artigo 766.º do CPCivil, haver oposição de julgados, portanto preenchidas as razões para que se resolva tal conflito, ora em sede deste Tribunal Pleno. Efectivamente, os acórdãos foram proferidos no domínio da mesma legislação, diferentes são os processos e assentam sobre soluções opostas, já que marcam posições diferentes em relação à mesma questão fundamental — Vanda de Brito e outros — in CPCivil (anotado), VII edição, página 477. Ora, o então decidido, pela câmara, não vincula, como não pode vincular, o Tribunal Pleno, com apoio no n.º 3 do artigo 766.º, paralela à norma do n.º 4 do artigo 687.º, ambos do CPCivil. Na verdade, exige ainda a lei que como fundamento do recurso só pode invocar-se acórdão anterior com trânsito em julgado — n.º 4 do artigo 763.º, e assim o acórdão de 23 de Julho de 1963 do ST Justiça (português), Processo n.º 59 694 — in BMJ n.os 129/414. E ainda que acórdão (anterior) tenha passado em julgado, conforme dispõe o artigo 677.º daquele diploma. Na espécie em análise está patente que sobre aquele primeiro aresto sobreveio voto de vencido por parte do Conselheiro Primeiro-Sargento, termos por que não tendo sido colhido novo visto, Publicado na I ª Série do Diário da República n.º 112 de 17 de Junho de 2010 Página 2 de 3 acórdão, por isso, somente assim designada a fortiori, como previsto pelo legislador do SUJ que prescreve a reunião de três votos conformes para a verificação dessa exigência — n.º 2 do artigo 70.º da Lei n.º 18/88, de 31 de Dezembro e para este lugar somos ainda a avocar o acórdão de 6 de Fevereiro 1963 do ST Justiça — Processo n.º 31 119, em cujo sumário pode ler- se o seguinte: o acórdão anterior, invocado em recurso interposto para o Tribunal Pleno, deve ter transitado em julgado — in BMJ n.os 124/512. Desta sorte, somos do entendimento não se tomar conhecimento do recurso interposto. Sem custas. Luanda, 22 de Dezembro de 2009. O juiz, ilegível. Publicado na I ª Série do Diário da República n.º 112 de 17 de Junho de 2010 Página 3 de 3
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