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Decreto Presidencial n.º 112/19 de 16 de abril

Detalhes
  • Diploma: Decreto Presidencial n.º 112/19 de 16 de abril
  • Entidade Legisladora: Presidente da República
  • Publicação: Diário da República Iª Série n.º 51 de 16 de Abril de 2019 (Pág. 2535)

Assunto

Aprova o Projecto-Piloto para Implementação de Caixas Comunitárias.

Conteúdo do Diploma

Considerando que o Plano de Desenvolvimento Nacional 2018-2022, no âmbito do Programa de Fomento da Produção Agrícola, prevê-se como um dos objectivos o apoio a produção agrícola dos agricultores familiares, através do aumento da disponibilidade e melhoria do acesso aos factores de produção e da capacidade dos serviços de extensão e desenvolvimento rural: Havendo necessidade de se implementar o Projecto-Piloto de Caixas Comunitárias nas áreas rurais com vista a promover o crescimento económico inclusivo e sustentável: O Presidente da República decreta, nos termos da alínea d) do artigo 120.º e do n.º 1 do artigo 125.º, ambos da Constituição da República de Angola, o seguinte:

Artigo 1.º (Aprovação)

É aprovado o Projecto-Piloto para Implementação de Caixas Comunitárias, anexo ao presente Decreto Presidencial, do qual é parte integrante.

Artigo 2.º (Dúvidas e Omissões)

As dúvidas e omissões resultantes da interpretação e aplicação do presente Diploma são resolvidas pelo Presidente da República.

Artigo 3.º (Entrada em Vigor)

O presente Decreto Presidencial entra em vigor à data da sua publicação. Apreciado pela Comissão Económica do Conselho de Ministros, em Luanda, aos 22 de Fevereiro de 2019.

  • Publique-se. Luanda, a 1 de Abril de 2019. O Presidente da República, JOÃO MANUEL GONÇALVES LOURENÇO.
  1. Introdução É sobejamente conhecida a importância da agricultura familiar na economia e na sociedade angolana. O Titular do Poder Executivo orientou recentemente para a necessidade de uma maior atenção à agricultura familiar e fez referência ao facto de o Orçamento Geral do Estado (OGE) contemplar um significativo aumento da fatia das despesas destinadas à agricultura, aumento esse que deve ser especialmente canalizado para a agricultura familiar. A quase totalidade das análises sobre a situação da agricultura familiar coincide que um dos factores limitantes do aumento da sua produção destinada ao mercado é o acesso aos insumos por parte dos produtores. O Executivo tem tomado decisões no sentido de se melhorar a logística de apoio à produção, tanto a montante como a jusante. Contudo, e a título de exemplo, a experiência recente mostra que, apesar da disponibilidade e da significativa redução dos preços dos fertilizantes, a esmagadora maioria dos agricultores familiares não dispõe de recursos financeiros para a sua aquisição. O sistema de intervenção do Ministério da Agricultura e Florestas (MINAGRIF) nas áreas rurais visando a assistência à produção familiar está estruturado com base nas Estações de Desenvolvimento Agrário (EDAs), usando a metodologia da extensão rural, que teve sucesso comprovado no passado em Angola1 e noutros países, agora com a nova abordagem das Escolas de Campo para o Agricultor (Farmer Field Schools), ou ECAs, como são conhecidas2.
  • Razões de vária ordem dificultaram, ate há pouco tempo, o desenvolvimento das ECAs no nosso País. A implementação de projectos financiados por diversas agências internacionais, como o Banco Mundial e o Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrário (FIDA), entre outros, permitem que as EDAs disponham agora da estrutura (recursos humanos, organização, normas e procedimentos) e dos recursos financeiros que possibilitam um uso adequado da metodologia das ECAs. No âmbito de tais projectos, as ECAs são criadas num processo que pressupõe uma organização comunitária (cooperativa ou associação) que tenha, por sua vez, capacidade para implementar subprojectos (de fornecimento de insumos ou serviços ou de pequenos investimentos) financiados pelas referidas agências internacionais. Faz parte das regras de tais agências que os subprojectos sejam co-financiados pela comunidade, sendo a participação desta, expressa normalmente através do trabalho. Isto significa que os insumos fornecidos a cada agricultor individualmente (sementes, fertilizantes e instrumentos diversos) sejam considerados fundos perdidos. O MINAGRIF entende que tal procedimento não é correcto porque se trata de uma prática paternalista que não responsabiliza os agricultores e não contribui para a sua progressiva autonomia em relação ao Estado. Projectos anteriores mostraram que depois de concluídos os agricultores continuam quase tão carentes como no início em matéria de capital fixo e financeiro. Pretendendo modificar este tipo de actuação e de situação, o MINAGRIF concebeu um Projecto-Piloto que se apresenta neste documento depois de apreciado em diversas instâncias envolvendo as partes interessadas no tema da assistência aos agricultores familiares, incluindo a vertente financeira. Para tal teve em conta as experiências de criação de fundos comunitários que remontam à década de 70, com a missão de Extensão Rural de Angola (ERA)3, e já no pós-independência com ONGs, organizações religiosas e outros parceiros.
  1. Enquadramento A presente proposta enquadra-se nos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável aprovados pelas Nações Unidas, nomeadamente no que respeita ao Objectivo 1 (Erradicar a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares), Objectivo 2 (Erradicar a fome, alcançar a segurança alimentar, melhorar a nutrição e promover a agricultura sustentável) e Objectivo 8 (Promover o crescimento económico inclusivo e sustentável, o emprego pleno e produtivo e o trabalho digno para todos), o que mostra a preocupação do Executivo Angolano em estar alinhado com os compromissos internacionais. Tendo a Assembleia Geral das Nações Unidas adoptado 1No início dos anos 70 o aumento da produtividade do milho graças à metodologia da extensão rural foi de cerca de dez vezes na zona do Planalto Central. 2As Escolas no Campo do Agricultor são escolas não formais sem edifício, onde a sala de aulas é o próprio campo ou lavra do agricultor. 3Os chamados Clubes Agrícolas, principalmente no Bié e no Huambo. oficialmente a 20 de Dezembro de 2017 o Decénio para a Agricultura Familiar 2019-2028, esta preocupação com os compromissos internacionais ganha mais relevo. A proposta enquadrado igualmente no Eixo 2 do Plano de Desenvolvimento Nacional que diz respeito ao Desenvolvimento Económico Sustentável, Diversificado e Inclusivo, na Política de Fomento da Produção, Substituição de Importação e Fomento das Exportações, no Programa de Apoio à Produção, Substituição das Importações e Diversificação das Exportações (com enfoque no objectivo 1, «Promover a produção ... dos bens da cesta básica de forma a conquistar progressivamente quotas crescentes no mercado interno e a contribuir para a diversificação da estrutura da economia e das exportações»), no Programa de Fomento da Produção Agrícola (com enfoque no objectivo 3, «Apoiar a produção agrícola dos agricultores familiares, através do aumento da disponibilidade e melhoria do acesso aos factores de produção e do aumento da capacidade dos serviços de extensão e desenvolvimento rural») e no Programa de Melhoria da Segurança Alimentar e Nutricional (com enfoque no objectivo 2, «Assegurar o acesso da população a uma certa quantidade de produtos alimentares básicos, em condições de estabilidade da oferta»). Concretamente pretende-se com este Projecto-Piloto testar uma metodologia de atribuição e gestão de recursos financeiros e outros que permita aos agricultores disporem de condições financeiras para adquirirem insumos e fazer pequenos investimentos numa óptica de aumento da produção para auto sustento e canalização para o mercado e de diversificação da economia a nível das comunidades. Tal abordagem afigura-se pertinente tendo em conta a Lei das Cooperativas (Lei n.º 23/15, de 31 de Agosto) que estabelece na alínea a) do seu artigo 3.º que as «cooperativas são pessoas colectivas autónomas, de livre constituição ... que visa a promoção dos interesses sociais e económicos dos seus membros...» e na alínea b) do mesmo artigo que refere que o objecto das cooperativas de primeiro grau (as consideradas neste Projecto-Piloto) «... assenta na prestação directa de serviço aos seus membros»4. A essência do Projecto-Piloto será, pois, a criação e funcionamento de caixas comunitárias no âmbito da estrutura de cooperativas agrárias enquanto serviço prestado aos seus membros e eventualmente a outros agricultores familiares a nível das comunidades, de modo a poderem ter acesso a recursos financeiros que possam, de forma continuada, garantir a realização dos respectivos subprojectos com a aquisição de insumos e a realização de pequenos investimentos a nível das comunidades.
  2. Conceito de Caixas Comunitárias Uma Caixa Comunitária é um fundo gerido por uma cooperativa de serviços ou por uma associação de agricultores que visa apoiar financeiramente os membros dessas organizações na realização da sua actividade produtiva ou de um outro negócio de interesse da comunidade com base em princípios com características semelhantes às dos esquemas de microcrédito5.
  • Trata-se de um mecanismo de interajuda traduzido num serviço que uma cooperativa ou associação presta aos membros, a exemplo de outros serviços como o fornecimento de insumos, a mecanização, a transformação de produtos ou a comercialização. Nesta perspectiva, a Caixa Comunitária só tem existência reconhecida se estiver inserida numa cooperativa ou associação, pois são estas que lhe conferem o respaldo legal. 4Dadas as especificidades e limitações do contexto nas nossas áreas rurais, podem ser consideradas associações de agricultores criadas ao abrigo da Lei das Associações Privadas (Lei n.º 6/12, de 18 de Janeiro). 5 Pequenos grupos de pessoas que se encontram regularmente, transacções realizadas na presença de todo o grupo, ou de grande parte dele para valorizar a transparência, ausência de garantias, pagamentos parcelares, pequenos montantes, entre outros. Uma Caixa Comunitária pode eventualmente financiar a actividade produtiva ou o negócio de um membro da comunidade que não seja membro da organização comunitária se tais actividades forem ao encontro dos interesses da comunidade ou da organização.
  1. Objectivos das Caixas ComunitáriasSão objectivos de uma Caixa Comunitária:
    • a)- Captar recursos financeiros e materiais para os disponibilizar em proveito das comunidades onde está inserida com base em princípios com características semelhantes às dos esquemas de microcrédito;
    • b)- Gerir os recursos financeiros de modo competente, mantendo uma relativa autonomia em relação às lideranças da cooperativa e da comunidade onde está inserida;
    • c)- Financiar as necessidades dos membros da Cooperativa ou Associação de Agricultores e eventualmente de outros membros da comunidade onde está inserida em insumos e pequenos investimentos;
    • d)- Financiar pequenos investimentos de carácter colectivo a nível da comunidade (irrigação, processamento, transporte...);
    • e)- Contribuir para a diversificação da economia a nível das comunidades locais;
    • f)- Contribuir para o fortalecimento da cooperativa ou associação dando substância aos serviços prestados;
    • g)- Financiar obras de carácter social que se mostrem importantes para a vida comunitária (sistemas de abastecimento de água, pontecos, reparações de vias,...);
    • h)- Financiar outras acções de interesse das comunidades onde está inserida.
  2. Constituição de Caixas Comunitárias Na fase de vigência do Projecto-Piloto proposto podem ser constituídas Caixas Comunitárias nas cooperativas ou associações nas seguintes condições:
    • a)- Que beneficiem de subprojectos financiados no âmbito de acordos do Executivo com agências internacionais. Tal limitação justifica-se pela existência de uma estrutura e equipamentos das EDAs financiadas pelas referidas agências, de recursos humanos motivados e de financiamentos garantidos para a implementação dos subprojectos;
    • b)- Existência de Escolas de Campo funcionais que tenham atingido o terceiro grau qualificativo;
    • c)- Existência de uma Organização Comunitária reconhecida pela comunidade e legitimada pelas instituições públicas;
  • d)- Ter produção orientada para o mercado de forma conjunta e organizada e que tenham beneficiado de capacitação ou de assistência para o efeito. Estas condições não devem ser consideradas de forma cumulativa para que sejam constituídas Caixas Comunitárias nas cooperativas e associações. Nesta fase podem ser constituídas ainda Caixas Comunitárias nas cooperativas ou associações assistidas por ONGs desde que estas garantam a assistência financeira e técnica necessária referida no parágrafo anterior. Esta situação poderá vir a ser útil na avaliação do Projecto-Piloto em termos comparativos.
  1. Origem dos Recursos das Caixas ComunitáriasO financiamento às Caixas Comunitárias provirá:
  • a)- Da comparticipação individual de cada membro da organização comunitária (cooperativa ou associação) que o integre num montante de pelo menos 50% do valor dos bens e serviços recebidos do Projecto com financiamento externo, feita após a colheita e a venda dos respectivos produtos;
    • b)- Da venda de insumos agrícolas fornecidos pelo Estado ou outras instituições ou organizações;
    • c)- Do reembolso de empréstimos que as Caixas Comunitárias venham a fazer aos seus membros ou a outros agricultores para a realização do ciclo produtivo e de pequenos negócios;
    • d)- De outras doações ou empréstimos que possam ocorrer, incluindo por parte do Fundo de Apoio do Desenvolvimento Agrário (FADA).
  1. Beneficiários dos Recursos das Caixas ComunitáriasPodem beneficiar dos fundos de uma Caixa Comunitária:
    • a)- Os membros da cooperativa ou da associação que cria o serviço da Caixa;
    • b)- Os membros da comunidade onde se localiza a cooperativa ou a associação;
    • c)- Outras organizações comunitárias que possam realizar acções económicas e sociais que interessem à comunidade.
  2. Obrigações das Caixas ComunitáriasSão obrigações das Caixas Comunitárias abrangidas no âmbito do Projecto-Piloto:
    • a)- Zelar para que cada membro comparticipe individualmente com o correspondente a 50% do valor dos bens e serviços recebidos do Projecto financiado pela agência internacional respectiva;
    • b)- Estabelecer um regulamento, aprovado pela Assembleia Geral da Cooperativa ou Associação, que institui uma Comissão de Gestão e rege o funcionamento da Caixa Comunitária;
    • c)- Demonstrar capacidade técnica e de gestão para decidir sobre a actividade da Caixa, especialmente sobre os planos de negócios que lhe são submetidos;
    • d)- Zelar para que os empréstimos sejam honrados nas condições e nos prazos estabelecidos;
    • e)- Participar nas acções de capacitação organizadas pelo organismo responsável pelo Projecto-Piloto;
    • f)- Elaborar informações trimestrais sobre o seu funcionamento a serem apresentados ao organismo responsável pelo Projecto-Piloto.
  3. Implementação do Projecto-Piloto A implementação do Projecto-Piloto será da responsabilidade do Instituto de Desenvolvimento Agrário (IDA) que deverá criar as condições técnicas e humanas para prestação da assistência técnica e capacitação às cooperativas e associações. A nível de cada município o IDA delegará tal responsabilidade às respectivas Estações de Desenvolvimento Agrário (EDAs). Concretamente o IDA e as EDAs deverão:
    • a)- Avaliar as condições para que cada cooperativa ou associação possa criar a respectiva Caixa Comunitária;
    • b)- Fazer o acompanhamento técnico que permita o progresso do Projecto-Piloto;
    • c)- Organizar e realizar as acções de capacitação que possam ajudar as Caixas Comunitárias a desenvolverem o seu objecto;
    • d)- Organizar o sistema de monitoria do Projecto e providenciar pelo seu funcionamento;
    • e)- Organizar a realização de uma avaliação externa do Projecto-Piloto;
    • f)- Estabelecer parceria com as ONGs e outras entidades que apoiam cooperativas e associações com Caixas Comunitárias;
    • g)- Apoiar cada cooperativa ou associação a dirimir conflitos resultantes do funcionamento da Caixa Comunitária. O Presidente da República, JOÃO MANUEL GONÇALVES LOURENÇO.
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