Lei n.º 31/22 de 30 de agosto
- Diploma: Lei n.º 31/22 de 30 de agosto
- Entidade Legisladora: Assembleia Nacional
- Publicação: Diário da República Iª Série n.º 164 de 30 de Agosto de 2022 (Pág. 6219)
Assunto
Que aprova o Código do Procedimento Administrativo. - Revoga o Decreto-Lei n.º 16-A/95, de 15 de Dezembro.
Conteúdo do Diploma
A legislação que rege a actuação da Administração Pública angolana foi, quase toda, aprovada na década de 1990, altura em que vigorava a Lei Constitucional de 1992, que foi aprovada num contexto de transição política em Angola. A Lei Constitucional de 1992 consagrou, pela primeira vez, um verdadeiro sistema administrativo, consagrando a centralidade dos direitos fundamentais e a obediência ao Direito, enquanto padrão que definia a actuação da Administração Pública. A aprovação da Constituição da República de Angola, em 2010, trouxe consigo a consagração de um conjunto de normas aplicáveis à Administração Pública, conjuntamente com a consagração da dignidade da pessoa humana como um dos princípios fundamentais que, naturalmente, vincula a Administração Pública. Como resultado da entrada em vigor de uma nova Lei Fundamental, as normas constitucionais sobre a Administração Pública passaram a consagrar uma dimensão mais personalista, que atribui ao particular um tratamento assente e compatível com o princípio do Estado Democrático e de Direito. A Administração Pública, tal como o Direito, precisa de acompanhar a dinâmica da evolução da sociedade e tomar as providências necessárias para que as pretensões cada vez mais complexas colocadas pelos particulares sejam devidamente satisfeitas. Neste sentido, impõe-se adequar as normas que regem a actuação da Administração Pública às exigências constitucionais e legais, sob pena de inconstitucionalidade e ilegalidade supervenientes, de modo a aproximar os serviços públicos às populações e proceder à desconcentração administrativa para garantir a eficiência e a eficácia administrativas. A Assembleia Nacional aprova, por mandato do povo, nos termos das disposições combinadas da alínea a) do n.º 1 do artigo 165.º e da alínea d) do n.º 2 do artigo 166.º, ambos da Constituição da República de Angola, a seguinte:
LEI QUE APROVA O CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
Artigo 1.º (Aprovação)
É aprovado o Código do Procedimento Administrativo, anexo à presente Lei e da qual é parte integrante.
Artigo 2.º (Regime de Transição)
O Código é aplicável a todos os procedimentos e processos iniciados e não concluídos à data da sua entrada em vigor.
Artigo 3.º (Revogação)
- É revogado o Decreto-Lei n.º 16-A/95, de 15 de Dezembro.
- As remissões feitas para os preceitos revogados consideram-se efectuadas para as correspondentes normas da presente Lei.
Artigo 4.º (Dúvidas e Omissões)
As dúvidas e as omissões resultantes da interpretação e da aplicação da presente Lei são resolvidas pela Assembleia Nacional.
Artigo 5.º (Entrada em Vigor)
A presente Lei entra em vigor 180 dias após a sua publicação. Vista e aprovada pela Assembleia Nacional, em Luanda, aos 24 de Março de 2022. O Presidente da Assembleia Nacional, Fernando da Piedade Dias dos Santos. Promulgada aos 15 de Agosto de 2022.
- Publique-se. O Presidente da República, JOÃO MANUEL GONÇALVES LOURENÇO.
CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
PARTE I - Princípios Gerais
CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Artigo 1.º (Objecto)
O presente Código estabelece os princípios e regras a observar no exercício da actividade administrativa, visando a realização do interesse público, no respeito pelos direitos subjectivos e interesses legalmente protegidos dos particulares e das pessoas colectivas.
Artigo 2.º (Definição)
- Entende-se por Procedimento Administrativo a sucessão ordenada de actos e formalidades tendentes à formação, manifestação e execução da vontade da Administração Pública, bem como o dever de execução administrativa das decisões jurisdicionais, tendo sempre como limite o respeito pelos direitos subjectivos e interesses legalmente protegidos dos particulares e das pessoas colectivas.
- Entende-se por Processo Administrativo o conjunto de documentos em que se traduzem os actos e formalidades que integram o Procedimento Administrativo.
- A todo o Procedimento Administrativo deve necessariamente corresponder um processo, que é representado por um conjunto de documentos e informações que correspondem à sua componente física, sem prejuízo da tramitação electrónica.
Artigo 3.º (Âmbito de Aplicação)
- As disposições deste Código aplicam-se a todos os Órgãos da Administração Pública que, no desempenho da actividade administrativa de gestão pública, estabeleçam relações entre eles ou com os particulares, bem como aos actos em matéria administrativa praticados pelos órgãos do Estado que, embora não integrados na Administração Pública, desempenhem funções materialmente administrativas.
- São Órgãos da Administração Pública, para efeitos deste Código:
- a)- Os órgãos do Estado que exerçam funções administrativas;
- b)- Os órgãos dos institutos públicos;
- c)- Os órgãos das entidades administrativas independentes;
- d)- Os órgãos das Autarquias Locais;
- e)- Os órgãos das associações públicas;
- f)- Os órgãos das Autoridades Administrativas Tradicionais que, em virtude de costume constitucionalmente reconhecido ou por lei, exerçam poderes públicos ou cumpram deveres públicos;
- g)- Os órgãos de quaisquer entidades privadas que, por acto do Estado, desempenhem actividades administrativas de gestão pública, nomeadamente as entidades concessionárias ou as que exerçam com base na delegação de poderes.
- O regime instituído pelo presente Código é também aplicável aos actos praticados por entidades de direito privado criadas por actos do Estado ou outra pessoa colectiva de direito público, ou com participação de capitais públicos ou, ainda, cuja administração ou fiscalização permanente pertença, por lei, regulamento ou pelos estatutos, a quaisquer órgãos ou entidades públicas.
- Os princípios gerais da actividade administrativa constantes do presente Código e as normas que concretizem preceitos constitucionais são aplicáveis a toda e qualquer actuação da Administração Pública, ainda que meramente técnica ou de gestão privada.
- No domínio da actividade de gestão pública, as restantes disposições do presente Código aplicam-se supletivamente aos procedimentos especiais, desde que não envolvam diminuição de garantias para os particulares.
- A aplicação do presente Regime às empresas públicas é feita de forma subsidiária, sendo a preferência atribuída à legislação específica e aos diplomas legais que regem a sua organização e funcionamento.
SECÇÃO I CONCEITOS OPERACIONAIS
Artigo 4.º (Pessoas Colectivas Públicas)
- As pessoas colectivas públicas são entidades constituídas por actos de poder público para prosseguirem o interesse público e dotadas, por isso, de poderes e deveres públicos.
- O acto que constitui a pessoa colectiva pública deve identificar a sua natureza e o consequente regime jurídico aplicável.
Artigo 5.º (Órgãos das Pessoas Colectivas Públicas)
- Os órgãos têm a missão de exteriorizar a vontade das pessoas colectivas públicas onde estão inseridos, devendo praticar os actos necessários e adequados à concretização das suas atribuições.
- Os actos praticados pelos órgãos são imputáveis às pessoas colectivas onde eles estão inseridos.
- Os actos praticados pelos Órgãos Administrativos contrários às atribuições das respectivas pessoas colectivas públicas não são imputáveis a estas.
Artigo 6.º (Atribuições e Competências)
- As pessoas colectivas públicas são criadas para prosseguir determinados fins que, ao mesmo tempo, definem a sua capacidade de exercício de direitos.
- Os órgãos das pessoas colectivas públicas não podem praticar actos que estejam fora das suas atribuições ou do seu substrato.
- As competências dos órgãos são sempre definidas por normas jurídicas e exercidas com a finalidade de realizar o interesse público.
Artigo 7.º (Hierarquia Administrativa)
- Entre os Órgãos Administrativos inseridos no mesmo serviço é estabelecido um vínculo jurídico que confere ao superior o poder de direcção e ao subordinado o dever de obediência.
- A hierarquia resulta sempre de uma norma jurídica que, de forma expressa, identifica o superior e o subordinado.
- Excepcionalmente, a hierarquia pode ser presumida, quando existirem dois órgãos inseridos no mesmo serviço, um superior e outro subordinado, mesmo que não haja norma expressa que estabeleça a relação entre ambos.
Artigo 8.º (Dever de Obediência)
- Só há dever de obediência nas situações em que a ordem preencher cumulativamente os seguintes requisitos:
- a)- Existência de relação hierárquica;
- b)- Matéria de serviço;
- c)- Forma juridicamente estabelecida, que em regra é a escrita;
- Não existe dever de obediência nas situações em que esta implicar a prática de um crime.
- Se o superior insistir e obrigar o subordinado a praticar o acto em desrespeito ao que vem consagrado no número anterior, este exerce o seu direito de resistência, tentando demover o superior de praticar tal acto.
- Caso o mecanismo descrito no número anterior não surta os seus efeitos, o superior deve por escrito, reforçar a sua orientação e o subordinado deve cumpri-la.
- O acto executado, nos termos do número anterior, exime o seu executor de qualquer tipo de responsabilidade, nos termos da lei.
Artigo 9.º (Impugnação Administrativa e Judicial)
- Os particulares com legitimidade podem requerer a declaração de invalidade de uma decisão administrativa ou de qualquer acto praticado pela Administração Pública.
- A impugnação administrativa é concretizada por via da reclamação ou do recurso perante os Órgãos Administrativos.
- A impugnação judicial é interposta nos tribunais, nos termos do Código do Procedimento Administrativo e legislação aplicável.
Artigo 10.º (Tutela Administrativa)
- As pessoas colectivas públicas integradas na Administração Autónoma estão sujeitas à tutela da legalidade da sua actuação, efectuado pelo Titular do Poder Executivo.
- Os poderes da entidade que exerce a tutela administrativa constam do diploma legal que constitui a pessoa colectiva pública e tem como limite a sua autonomia administrativa, financeira e regulamentar.
Artigo 11.º (Superintendência)
- As pessoas colectivas públicas inseridas na Administração Indirecta do Estado estão sujeitas ao poder de superintendência, exercido pelo Titular do Poder Executivo.
- A superintendência consiste na definição dos objectivos e condução da actuação das pessoas colectivas públicas inseridas na Administração Indirecta do Estado.
- A superintendência respeita a autonomia administrativa, financeira e regulamentar da entidade superintendida e não deve interferir na gestão de assuntos correntes.
- Para efeitos do presente Código, consideram-se assuntos correntes os que integrarem as actividades diárias da entidade superintendida.
CAPÍTULO II PRINCÍPIOS GERAIS
Artigo 12.º (Princípio da Constitucionalidade)
- A validade das normas, actos, contratos e operações praticados ou emanados por órgãos de entidades públicas ou privadas sujeitas a este Código depende, antes de mais, da sua conformidade com a Constituição.
- Os actos da Administração Pública que violem a Constituição da República de Angola são nulos.
Artigo 13.º (Princípio da Juridicidade)
- A validade dos actos da Administração Pública está dependente da sua conformidade com o direito.
- Os Órgãos da Administração Pública não podem praticar actos sem habilitação normativa.
Artigo 14.º (Princípio da Legalidade)
Os Órgãos da Administração Pública devem agir em obediência à lei, dentro dos limites dos poderes que lhes forem conferidos e em conformidade com os respectivos fins.
Artigo 15.º (Princípio do Estado de Necessidade Administrativa)
- Nas situações de perigo iminente e actual para o interesse público causado por circunstância excepcional não provocada pelo agente, à Administração Pública é conferido o poder para praticar os actos necessários e urgentes para repor a situação e evitar danos maiores.
- Os actos administrativos e operações materiais praticados ou executados em estado de necessidade, com preterição das regras estabelecidas neste Código, são válidos desde que os seus resultados não tivessem podido ser alcançados de outro modo, tendo os lesados direito a ser indemnizados nos termos gerais da responsabilidade civil do Estado e demais entes públicos.
Artigo 16.º (Princípio da Prossecução do Interesse Público e do Respeito Pelos Direitos e Interesses Legalmente Protegidos dos Particulares)
- Os Órgãos Administrativos, em todos os seus domínios de actuação, devem prosseguir o interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares.
- O sacrifício dos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares, em nome do interesse público, deve ser devidamente fundamentado pela Administração Pública e deve ser sempre a última alternativa dentro do leque de opções que esta tem para prosseguir o interesse público.
- Na prossecução do interesse público, a Administração Pública deve atender aos interesses privados relevantes que estejam directamente ligados ao fim público concreto.
Artigo 17.º (Princípio da Igualdade)
Nas suas relações com os particulares, a Administração Pública deve reger-se pelo Princípio da Igualdade, não podendo privilegiar, beneficiar, prejudicar, privar de qualquer direito ou isentar de qualquer dever nenhuma pessoa em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, Instrução, situação económica ou condição social.
Artigo 18.º (Princípio da Proporcionalidade)
- As decisões da Administração Pública que colidam com direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos dos particulares só podem afectar essas posições com base na lei, em termos adequados e através de meios proporcionais aos objectivos a realizar.
- A actuação da Administração deve respeitar os seguintes critérios:
- a)- Ser adequada ao fim que se pretende atingir, dentre as várias alternativas que forem colocadas;
- b)- A medida deve ser a que menos sacrifícios causar aos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares;
- c)- A medida deve ser portadora de benefícios que superam os prejuízos ou perdas de outras alternativas;
- d)- As medidas mais gravosas, para os direitos e interesses dos particulares, só podem ser aplicadas depois de esgotadas as alternativas.
Artigo 19.º (Princípio da Imparcialidade)
- No exercício da sua actividade, a Administração Pública deve tratar de forma imparcial todos os que com ela entrem em contacto.
- A Administração Pública deve tratar os particulares e seus respectivos assuntos com isenção, objectividade e transparência, sendo proibidas quaisquer formas de discriminação na relação entre ambos.
- A Administração Pública não pode deixar de realizar o interesse público em nome de interesses privados injustificados e infundados.
- Havendo conflito entre o interesse público e o interesse do funcionário público, este deve privilegiar o interesse público, criando todas as condições para a sua prevalência.
- A Administração Pública deve avaliar todos os aspectos relevantes antes de tomar uma decisão.
- A violação deste princípio dá lugar à anulação dos actos que o ofendam e à efectivação da responsabilidade civil, disciplinar ou criminal, nos termos gerais aplicáveis.
Artigo 20.º (Princípio da Boa-Fé)
- No exercício da actividade administrativa, em todas as suas formas e fases, a Administração Pública e os particulares devem agir e relacionar-se segundo as regras da boa-fé.
- No cumprimento do disposto no número anterior, os Órgãos Administrativos devem ponderar os valores fundamentais do direito que forem relevantes em face das situações consideradas e, em especial:
- a)- O objectivo de interesse público a alcançar com a actuação empreendida;
- b)- A confiança suscitada na contraparte pela actuação administrativa desde o início do procedimento;
- c)- A necessidade de coerência da Administração Pública e a observância do princípio do respeito pela palavra dada.
Artigo 21.º (Princípio da Colaboração da Administração Pública com os Particulares)
- Os Órgãos Administrativos devem actuar em estreita colaboração com os particulares, procurando assegurar a adequada participação destes no desempenho da função administrativa e cumprindo-lhes, designadamente:
- a)- Prestar aos particulares todas as informações e esclarecimentos de que careçam;
- b)- Apoiar e estimular as iniciativas dos particulares, receber as suas sugestões e informações e encaminhá-las para o seu legítimo superior hierárquico;
- c)- Realizar as demais actuações que não estejam nas alíneas anteriores, mas que resultem da aplicação do princípio da colaboração da Administração Pública com os particulares.
- A Administração Pública é responsável pelas informações prestadas por escrito aos particulares, ainda que a lei ou regulamento não imponha especificamente a obrigação de as prestar.
Artigo 22.º (Princípio da Participação)
- Os Órgãos Administrativos devem assegurar a participação dos particulares, bem como das associações que tenham por objecto a defesa dos seus interesses, na formação das decisões que lhes disserem respeito.
- A participação referida no número anterior pode acontecer em qualquer fase do processo decisório e não se restringe aos particulares com legitimidade para intervir.
- Ao abrigo do princípio da participação administrativa, os Órgãos da Administração Pública podem solicitar o auxílio de outros órgãos, pessoas colectivas públicas, pessoas colectivas privadas e pessoas físicas, estando estas obrigadas a colaborar.
- Por sua iniciativa, os particulares podem apresentar as suas opiniões aos Órgãos da Administração Pública, sendo estes obrigados a informar os particulares do resultado das suas petições.
- Salvo em casos previstos na lei, a Administração Pública não pode tomar decisões sem ouvir os seus destinatários.
Artigo 23.º (Princípio da Audiência Prévia)
O Estado deve assegurar que sejam previamente ouvidos os interessados, antes de ser tomada qualquer decisão final.
Artigo 24.º (Princípio da Decisão)
- Os Órgãos Administrativos têm, nos termos regulados neste Código, o dever de se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhes sejam apresentados pelos particulares e, nomeadamente:
- a)- Sobre os assuntos que disserem directamente respeito aos requerentes;
- b)- Sobre quaisquer petições, reclamações ou queixas formuladas em defesa da Constituição, das leis ou do interesse público.
- Em regra, a decisão deve ser escrita e integrar os seus fundamentos.
- A decisão tácita é admitida nos casos legalmente previstos.
- A Administração Pública pode deixar de se pronunciar sobre um pedido, se o órgão competente tiver praticado, há menos de dois anos, um acto administrativo com o mesmo pedido e fundamento, devendo, para o efeito praticar um acto em que fundamente a ausência de decisão.
- A faculdade referida no número anterior cessa, se houver algum facto novo, sendo, neste caso, a Administração Pública obrigada a decidir.
- A omissão do dever de decidir é judicialmente impugnável.
Artigo 25.º (Princípio da Boa Administração)
- A Administração Pública deve ser estruturada de modo a aproximar os serviços das populações e de forma não burocratizada, a fim de assegurar a celeridade, a economia, a eficiência e a eficácia das suas decisões.
- A Administração Pública deve prosseguir, da melhor maneira, o interesse público, adoptando, para o efeito, as melhores soluções do ponto de vista técnico e financeiro.
- A Administração Pública deve adoptar as soluções mais eficientes e eficazes no quadro da sua tarefa de realizar o interesse público.
- As decisões que violam o Princípio da Boa Administração são judicialmente sindicáveis.
Artigo 26.º (Princípio do Devido Procedimento)
- Qualquer actividade administrativa susceptível de lesar posições subjectivas de particulares deve ser precedida de procedimento adequado e justo.
- O procedimento adequado e justo envolve:
- a)- A participação dos interessados no procedimento, incluindo a obrigação de audiência prévia;
- b)- A efectivação do direito ao contraditório;
- c)- A fundamentação expressa da decisão administrativa.
Artigo 27.º (Princípio da Gratuitidade)
- O Procedimento Administrativo é gratuito, salvo na medida em que normas especiais imponham o pagamento de taxas, emolumentos ou de despesas efectuadas pela Administração Pública.
- Em caso de comprovada insuficiência económica, demonstrada nos termos da lei sobre o apoio judiciário, a Administração Pública deve isentar, total ou parcialmente, o interessado do pagamento das taxas, emolumentos ou das despesas referidas no número anterior.
Artigo 28.º (Princípio do Acesso à Justiça)
Aos particulares é garantido o acesso à justiça administrativa, a fim de obter a fiscalização contenciosa dos actos da Administração Pública, bem como para a tutela dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, nos termos previstos na legislação reguladora do contencioso administrativo.
Artigo 29.º (Princípio da Administração Digital)
- Sempre que possível, a Administração Pública deve optar pela utilização de meios digitais de trabalho e comunicação.
- Na Instrução dos Procedimentos Administrativos, podem ser utilizados meios digitais com vista a:
- a)- Tornar mais simples e rápido o acesso dos interessados à informação e ao procedimento;
- b)- Simplificar e reduzir a duração dos procedimentos, promovendo a celeridade da disponibilização de informações, com as devidas garantias;
- c)- Promover a transparência administrativa;
- d)- Garantir a interoperabilidade entre os serviços da Administração Pública.
- Sempre que permitido por lei ou por regulamento, é possível a prática integral de acto administrativo, através de meios digitais.
- Os meios digitais devem garantir a integridade, conservação confidencialidade e segurança da informação.
- A Administração Pública deve organizar-se para assegurar o exercício de direitos à formulação de pretensões, obter informações, realizar consultas, apresentar alegações e outros actos procedimentais, através de meios digitais.
- A utilização de meios digitais, por parte da Administração Pública, não pode ser feita de modo a lesar direitos e garantias dos particulares, especialmente nos casos em que possa impedir o acesso à Administração Pública.
Artigo 30.º (Princípio da Transparência Administrativa)
Os Órgãos da Administração Pública devem prosseguir a realização do interesse público com visibilidade, lisura, respeito do acesso à informação e sua divulgação nos meios previstos na legislação.
Artigo 31.º (Princípio de Auxílio Administrativo ou Inter-Administrativo)
- Todas as entidades administrativas têm o dever de prestar auxílio às outras entidades administrativas quando tal lhes for solicitado.
- A entidade pode solicitar auxílio, nomeadamente quando:
- a)- Motivos de direito a impossibilitem de realizar a diligência;
- b)- Motivos de facto, tais como a falta de pessoal ou meios técnicos, a impossibilitem de realizar a diligência;
- c)- A tomada de decisão exija o conhecimento de factos que ela desconhece e que não pode averiguar por si mesma;
- d)- A realização das suas funções exija a consulta de documentos ou de outros meios de prova que a entidade solicitada tenha em seu poder;
- e)- O custo de realização da diligência for substancialmente superior ao da entidade a que é solicitado o auxílio.
Artigo 32.º (Princípio da Unificação de Documentos)
Sempre que possível e desde que sejam transversais ou incidam sobre a mesma matéria, a Administração Pública deve promover a unificação de documentos emitidos entre os diferentes órgãos que a compõem.
Artigo 33.º (Princípio do Contacto Único)
- Os Órgãos Administrativos devem, sempre que possível, satisfazer as pretensões dos particulares de modo integrado, privilegiando o contacto único entre os particulares e os serviços respectivos.
- Sempre que possível, a Administração Pública deve-se pronunciar num único procedimento sobre vários assuntos apresentados pelos particulares.
Artigo 34.º (Princípio da Inexigibilidade de Documentos Emitidos pelo Estado nas Relações Inter-Administrativas)
- A Administração Pública deve abster-se de exigir dos particulares documentos emitidos por ela própria para efeitos de apresentação a um órgão nela integrada.
- O funcionário da Administração Pública que violar o disposto no número anterior, exigindo documentos emitidos por outras entidades administrativas, é disciplinarmente responsabilizado.
Artigo 35.º (Princípio da Adequação Procedimental)
- Na condução do Procedimento Administrativo, os Órgãos da Administração Pública têm a faculdade de adoptar as condutas que melhor realizem o interesse público, tendo em conta o contexto, desde que não haja norma a impor as condutas adequadas.
- Caso se verifique a situação apresentada no número anterior, a Administração Pública está limitada na sua actuação pela Constituição da República de Angola, pelos princípios gerais da actividade administrativa e pelas garantias dos particulares.
Artigo 36.º (Princípio da Publicidade)
- Os resultados da actividade administrativa, o início e fim de Procedimentos Administrativos, as decisões dos Órgãos Administrativos e outros actos relevantes estão sujeitos à publicação e comunicação.
- A violação do disposto no número anterior conduz à ineficácia do acto.
- Excepcionalmente e nos casos legalmente determinados, os actos descritos no n.º 1 do presente artigo não estarão sujeitos à publicação.
- A publicação da actividade administrativa deve ser feita nos meios legalmente indicados para o efeito ou naqueles que a Administração Pública criar para este fim.
Artigo 37.º (Princípio da Justiça)
- A Administração Pública está vinculada ao princípio da justiça que deve ser aferido nos casos concretos.
- Para efeito do disposto no número anterior, a Administração Pública deve atender o interesse público, os direitos fundamentais dos particulares, a proporcionalidade, a equidade, a razoabilidade, a igualdade, a participação dos interessados, o direito ao contraditório, a fundamentação da decisão, o prazo para a emissão de uma decisão e demais valores ou princípios legais.
- O Princípio da Justiça tem natureza instrumental e apresenta-se como critério de aplicação de outros princípios.
Artigo 38.º (Princípio da Continuidade e da Actualidade)
- A Administração Pública não pode, em circunstância alguma, deixar de prestar os serviços às populações, sendo que, mesmo em períodos de crise e emergência, deve continuar a sua actividade, ainda que na modalidade de serviços mínimos.
- A Administração Pública deve sempre se manter plenamente informada e actualizada acerca das novidades relativas aos assuntos que deve resolver de modo a prestar sempre o melhor serviço.
- A Administração Pública deve, na sua actuação, inovar de modo a ter soluções mais eficientes e eficazes.
Artigo 39.º (Princípio da Discricionariedade Administrativa)
- Os Órgãos da Administração Pública têm, desde que permitidos por normas jurídicas, a faculdade de praticar os actos que se ajustem ao seu contexto e melhor respondem às exigências impostas pelo interesse público.
- O poder referido no número anterior implica a possibilidade de praticar actos, o momento para os praticar, a realização de diligências e a fixação do sentido de normas jurídicas.
- Os actos praticados com fundamento na discricionariedade administrativa estão limitados pela Constituição, pelas regras de competência e pelos fins para os quais foram atribuídos.
Artigo 40.º (Princípio da Simplificação e Celeridade Procedimental)
- Os Órgãos da Administração Pública devem optar pela adopção de procedimentos simplificados e tomar as suas decisões dentro dos prazos legalmente estabelecidos.
- A violação dos prazos para a tomada da decisão é sancionada por lei ou por regulamento e deve ser imputada, a nível da Administração Pública, ao órgão responsável pela respectiva tomada de decisão.
- A violação dos prazos para decidir pode ainda originar responsabilidade disciplinar do funcionário, responsabilidade civil da Administração Pública e o impedimento de praticar outros actos sobre a matéria.
Artigo 41.º (Princípio do Respeito e Validade do Direito Costumeiro)
- Na sua actuação, a Administração está vinculada ao costume nos termos consagrados na Constituição.
- Nos termos previstos no número anterior, alguns Procedimentos Administrativos podem tramitar nas demais línguas de Angola.
Artigo 42.º (Princípio da Integração da Norma Administrativa)
As disposições do presente Código não podem ser desaplicadas com fundamento em falta de regulamentação, salvo disposição expressa em contrário, devendo ser integradas nos termos gerais do ordenamento jurídico. PARTE II - Sujeitos Públicos e Privados
CAPÍTULO I ÓRGÃOS ADMINISTRATIVOS
SECÇÃO I GENERALIDADES
Artigo 43.º (Órgãos da Administração Pública)
São Órgãos da Administração Pública ou Órgãos Administrativos, para efeitos do presente Código, os previstos no n.º 2 do artigo 3.º.
Artigo 44.º (Relação entre Órgãos)
- Os Órgãos Administrativos podem estabelecer, entre si, relações com a finalidade de melhorar o seu trabalho, garantindo a eficiência e eficácia na sua actuação.
- As relações referidas no número anterior podem concretizar-se através de acordos e parcerias, valendo, para o efeito, a liberdade das partes relativamente à forma e ao conteúdo.
- Nas parcerias ou acordos referidos no número anterior, as vantagens das partes devem ser recíprocas e não têm como contrapartida valores pecuniários, salvo o previsto na lei.
- Havendo a necessidade de intervenção de vários órgãos na prática de actos, estes podem estabelecer acordos ou parcerias com objectivo de padronizar e tornar mais eficiente e eficaz a sua actuação conjunta.
- Nos termos do número anterior, pode haver simplificações de actos, todas elas, com o objectivo de firmar a vontade dos vários órgãos intervenientes num único documento.
Artigo 45.º (Início do Procedimento)
- A parte interessada manifesta à outra a sua vontade para celebração do acordo ou parceria, por via de ofício ou e-mail/correio electrónico, tendo a contraparte 30 (trinta) dias para responder, sob pena de o silêncio ser interpretado como negação do interesse no acordo ou parceria.
- Recebido o documento, a contraparte deverá responder pela mesma via, devendo marcar um encontro preliminar onde serão discutidos os pormenores do acordo ou parceria.
- Nos 20 dias subsequentes à reunião referida no número anterior, a parte a quem couber a responsabilidade deverá elaborar um projecto de acordo e remeter para outra.
- Para efeitos do número anterior, as partes têm 30 (trinta) dias para análise e discussão, findo os quais, o acordo ou a parceria é obrigatoriamente celebrado, salvo se existirem situações que objectivamente impeçam a sua celebração.
Artigo 46.º (Celebração de Acordo ou Parceria)
- Concluída a fase referida no artigo anterior, as partes devem celebrar o acordo ou parceria, que entra em vigor na data da sua celebração.
- A partir da data de celebração do acordo ou parceria, as partes devem, trimestralmente, avaliar a execução do mesmo, salvo se o período de vigência for inferior a 6 meses, situação que obriga a avaliações mensais.
- As avaliações referidas no número anterior incidem sobre as melhorias proporcionadas pelo acordo ou pela parceria e devem ser acompanhadas de dados estatísticos.
- A falta de avaliação gera nulidade e impede a renovação do acordo ou da parceria.
Artigo 47.º (Repartição de Responsabilidades)
- Nos acordos ou parcerias referidos nesta secção, as partes devem definir, com clareza e objectividade, as suas responsabilidades, devendo haver entre elas, correspondências em termos de impacto e peso.
- Excepcionalmente, podem as partes pagar valores pecuniários como contrapartida, sendo regra, nesta matéria, a contrapartida mediante serviços ou equivalente.
- Na falta de indicação legal, o poder para celebrar os acordos ou parcerias regulados nesta secção é exercido pelo órgão máximo da instituição, sem prejuízo da possibilidade de delegação de poderes.
Artigo 48.º (Procedimento Administrativo Conjunto)
- Os acordos ou parcerias regulados nesta secção podem envolver a realização de Procedimentos Administrativos Conjuntos.
- A falta de intervenção de uma das partes no Procedimento Administrativo Conjunto gera a sua anulabilidade.
SECÇÃO II ÓRGÃOS COLEGIAIS
Artigo 49.º (Presidente e Secretário)
- Sempre que a lei ou regulamento não disponha de forma diferente, cada órgão administrativo colegial tem um Presidente e um Secretário, a eleger pelos membros que o compõem.
- Cabe ao Presidente do Órgão Colegial, além de outras competências que lhe sejam acometidas, abrir, dirigir e encerrar as reuniões, assegurar o cumprimento das leis, garantir a regularidade do desenrolar das reuniões e do processamento das votações.
- O Presidente pode suspender ou encerrar antecipadamente as reuniões, quando circunstâncias excepcionais o justifiquem, mediante decisão fundamentada, que é incluída na acta da reunião.
- O Presidente, ou quem o substituo, pode impugnar contenciosamente as deliberações tomadas pelo órgão colegial a que preside, que considere ilegais e, bem assim, se tiver fundamento legal para isso, requerer à suspensão judicial da respectiva eficácia.
- A faculdade referida no número anterior pressupõe a votação em sentido contrário ao da deliberação pelo impugnante.
Artigo 50.º (Reuniões Ordinárias)
- Na falta de determinação legal em contrário, cabe ao Presidente, no início do seu mandato, a fixação genérica dos dias e horas das reuniões ordinárias.
- A fixação referida no número anterior só pode ser alterada, posteriormente, por consenso dos membros do órgão colegial.
- Quaisquer alterações específicas ao dia e hora fixados para as reuniões devem ser comunicadas com a devida antecedência a todos os membros do órgão colegial, de forma a garantir a sua recepção segura e em tempo.
- As convocatórias e demais documentos devem ser enviados para todos os membros do órgão com antecedência de 15 dias.
- O envio das convocatórias e documentos referidos no número anterior pode ser feito por via de e-mail ou outro mecanismo mais expedito.
- A falta de convocação ou o desrespeito do prazo referido número anterior conduz à ineficácia da convocatória e à invalidade das deliberações tomadas, salvo se existir anuência da parte irregularmente convocada.
- Os membros do órgão colegial podem impugnar as deliberações tomadas em violação das regras referidas no número anterior.
- Os órgãos têm a liberdade de estabelecer o quórum para as votações dos assuntos em discussão, que em nenhuma circunstância pode ser inferior a 65% dos membros que o integram, salvo nas situações de estado de necessidade ou de emergência em que o quórum pode ser inferior.
Artigo 51.º (Reuniões Extraordinárias)
- As reuniões extraordinárias têm lugar quando o Presidente as convocar, salvo disposição especial em contrário.
- O Presidente é obrigado a proceder à convocação sempre que, pelo menos, um quarto dos vogais o requeiram por escrito, indicando o assunto que pretendam ver agendado.
- A convocatória da reunião deve ser feita para um dos 10 (dez) dias seguintes à apresentação do pedido, mas sempre com uma antecedência mínima de 48 horas sobre à data da reunião extraordinária.
- Da convocatória devem constar, de forma expressa e especificada, o assunto ou os assuntos a tratar na reunião.
Artigo 52.º (Início das Reuniões)
- As reuniões começam na hora que constar na Convocatória, sem prejuízo da tolerância que, em regra, é de 15 minutos, findo os quais, a reunião começa incondicionalmente.
- As reuniões são antecedidas do balanço e avaliação dos assuntos tratados na reunião anterior.
- É exigido a cada responsável a execução do assunto que lhe disser respeito, constante da acta da reunião anterior.
- A inexecução é tida em conta para efeitos de avaliação de desempenho e de responsabilidade disciplinar.
- Caso as circunstâncias o exijam, alguns membros podem participar virtualmente.