Pular para o conteúdo principal

Lei n.º 10/20 de 16 de abril

Detalhes
  • Diploma: Lei n.º 10/20 de 16 de abril
  • Entidade Legisladora: Assembleia Nacional
  • Publicação: Diário da República Iª Série n.º 50 de 16 de Abril de 2020 (Pág. 2570)

Assunto

Das Acções Encobertas para Fins de Prevenção e Investigação Criminal.

Conteúdo do Diploma

Considerando que Angola é um Estado Democrático de Direito, onde as suas instituições regem-se pelo primado da Constituição e da lei e aos seus cidadãos é consagrado um conjunto de direitos, liberdades e garantias fundamentais; Tendo em conta que a criminalidade em todas as suas formas de manifestação constitui ameaça à subsistência do Estado Democrático de Direito, a julgar pelo seu impacto sobre a segurança deste, cujas consequências a nível nacional, regional e mundial têm impelido os Estados a reforçarem os mecanismos de cooperação para a prevenção e combate, por forma a garantir a segurança dos cidadãos, bem como defender os valores fundamentais, da democracia, dos direitos humanos e preservar o direito internacional; Atendendo que este instrumento se afigura importante para intervenção e esclarecimento de situações de suspeita ou de indícios de tráfico de armas, drogas, pessoas e órgãos humanos;

  • Tornando-se necessário adaptar o Ordenamento Jurídico de Angola aos instrumentos internacionais e dar a devida resposta a fenómenos criminais complexos e organizados que ameaçam a paz, a tranquilidade e a segurança interna e internacional;
  • A Assembleia Nacional aprova, por mandato do povo, nos termos das disposições combinadas das alíneas c) e e) do artigo 164.º e da alínea d) do n.º 2 do artigo 166.º, ambos da Constituição da República de Angola, a seguinte:

LEI DAS ACÇÕES ENCOBERTAS PARA FINS DE PREVENÇÃO E INVESTIGAÇÃO CRIMINAL

CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES GERAIS

Artigo 1.º (Objecto)

A presente Lei estabelece o regime das acções encobertas, para fins de prevenção e investigação criminal.

Artigo 2.º (Âmbito)

A presente Lei aplica-se às acções encobertas, desenvolvidas pelos Órgãos de Polícia Criminal e pelos demais Órgãos da Segurança e Ordem Interna, Órgãos de Defesa Nacional e Órgãos de Inteligência e de Segurança do Estado, em colaboração com os Órgãos de Polícia Criminal, na actividade de investigação criminal, em todo o território nacional e nos demais casos abrangidos pela aplicação da Lei Penal no espaço, previstos no Código Penal.

Artigo 3.º (Definições)

Para os efeitos do disposto na presente Lei, entende-se por:

  • a)- «Agente Encoberto», o efectivo de Órgão de Polícia Criminal que realiza diligências investigativas ou outros tipos de operações policiais mediante ocultação da sua identidade e missão;
  • b)- «Agente Provocador», o agente que cria um cenário operacional para levar alguém a agir de forma ilícita ou a cometer uma infracção criminal;
  • c)- «Colaborador Secreto», qualquer pessoa que não tenha relação com o Agente Encoberto, mas, ocasionalmente, lhe auxilie ou preste qualquer colaboração e cuja identidade deve ser protegida;
  • d)- «Identidade Fictícia», a identidade autêntica e de utilidade especialmente operacional;
  • e)- «Infiltração», a inserção e a adaptação do Agente Encoberto e terceiros em determinado meio, grupo ou organização objecto de investigação;
  • f)- «Investigação Operativa», a investigação realizada pelo Órgão de Polícia Criminal, mediante a ocultação da missão;
  • g)- «Fonte», qualquer pessoa que preste informação relevante para a execução de determinada diligência investigativa ou outro tipo de operação policial e cuja identidade pode ser protegida;
  • h)- «Oficial Operativo», o Agente Encoberto ou qualquer agente do Órgão de Polícia Criminal que controla e opera em determinada circunscrição territorial, como área de operações, que é afectada para fins operacionais, por uma autoridade de polícia criminal;
  • i)- «Pessoa de Confiança», qualquer pessoa que tenha relação com o Agente Encoberto e, periodicamente, o auxilie nas diligências investigativas, cuja identidade deve ser protegida;
  • j)- «Terceiro», efectivo de Órgão de Segurança e Ordem Interna que não seja de Polícia Criminal, Órgãos de Defesa Nacional e de Inteligência e de Segurança do Estado, que participe nas acções encobertas.

CAPÍTULO II ACÇÕES ENCOBERTAS

Artigo 4.º (Conceito)

Constituem Acções Encobertas as diligências investigativas e outros tipos de operações policiais desenvolvidas, dirigidas ou coordenadas pelos Órgãos de Polícia Criminal, exclusivamente, ou em colaboração com os demais Órgãos de Segurança e Ordem Interna, de Defesa Nacional e de Inteligência e de Segurança do Estado, com o fim de prevenir ou reprimir crimes, mediante ocultação da identidade do agente, bem como da sua missão.

Artigo 5.º (Natureza)

  1. As Acções Encobertas são de natureza secreta e provisória, devendo ser dirigidas ou coordenadas pelos Órgãos de Polícia Criminal e executadas pelos seus agentes, exclusivamente, ou em colaboração com os demais Órgãos de Segurança e Ordem Interna, de Defesa Nacional e de Inteligência e de Segurança do Estado.
  2. Os actos praticados pelo Agente Encoberto, de conhecimento público, devem ser executados de forma a manter oculta a sua identidade, a missão e a sua finalidade.
  3. O documento produzido e a informação reduzida a escrito no desenrolar da acção encoberta devem ser classificados como secretos, codificados e tramitados em canais fechados e seguros.
  4. Sem prejuízo do previsto nos números anteriores, os resultados das Acções Encobertas podem ser conhecidos e usados em processo-crime, nos termos da lei.

Artigo 6.º (Fins)

  1. As Acções Encobertas devem prevenir e reprimir crimes e visar fins concretos, tais como:
    • a)- Recolher informação criminal;
    • b)- Descobrir os modos de execução de crimes;
    • c)- Dissuadir e impedir a consumação de acções criminosas;
    • d)- Descobrir material probatório;
    • e)- Identificar e indicar os métodos e as técnicas mais adequados para dissuadir ou impedir a comissão de crimes;
    • f)- Identificar agentes criminosos, formas de organização criminosa e locais de grande incidência criminosa ou de cometimento habitual de crimes.
  2. As Acções Encobertas devem ser proporcionais às finalidades previstas no número anterior e à gravidade do facto criminoso sob investigação.

Artigo 7.º (Circunstância para a Admissibilidade)

  1. As Acções Encobertas são admissíveis no âmbito da prevenção ou investigação dos seguintes crimes:
    • a)- Crime de terrorismo e de financiamento do terrorismo;
    • b)- Crime de homicídio, desde que o agente não seja conhecido;
    • c)- Crime contra a liberdade sexual e contra a autodeterminação sexual, desde que o agente não seja conhecido, ou quando sejam expressamente referidos, como ofendidos, os menores de 18 anos de idade e outros incapazes;
    • d)- Crime de furto ou de roubo de veículos, quando o agente não seja conhecido;
    • e)- Crime de sequestro, de rapto, de tomada de reféns ou de escravidão;
    • f)- Crime contra a segurança pública e a segurança do Estado;
    • g)- Crime contra a paz e a comunidade internacional;
    • h)- Crime contra a segurança dos transportes;
    • i)- Crime de auxílio a prófugos e fugitivos internacionais;
    • j)- Crimes executados com artefactos, materiais ou engenhos explosivos, armas de fogo e objectos armadilhados, armas nucleares, químicas, biológicas ou radioactivas;
    • k)- Crime de furto ou de roubo em instituições bancárias, de crédito, financeiras ou de correios;
    • l)- Crime de associação criminosa;
    • m)- Crime de tráfico de seres humanos, órgãos humanos, estupefacientes e substâncias psicotrópicas;
    • n)- Crime de auxílio à imigração ilegal;
    • o)- Crime de branqueamento de capitais, de corrupção, de peculato, de tráfico de influência e de recebimento indevido de vantagens;
    • p)- Crime de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção e desvio de subsídios ou subvenções;
    • q)- Crimes de natureza económico-financeira de dimensão nacional ou transnacional e cometidos de forma organizada ou com recurso às tecnologias de informação e de comunicação;
    • r)- Crime de contrafacção de moeda e de títulos de créditos ou a respectiva passagem;
    • s)- Crimes cometidos no mercado de valores mobiliários e imobiliários.
  2. A admissibilidade das Acções Encobertas atende às formas de execução criminosa, que podem respeitar à preparação, à execução em curso ou tentativa e à consumação.

Artigo 8.º (Início de Acções Encobertas)

  1. A realização de Acções Encobertas é solicitada, por ofício, pela Autoridade de Polícia Criminal ao Titular do Órgão de Polícia Criminal competente em razão da matéria, de acordo com o correspondente escalão e ordenada por vias próprias.
  2. Iniciada a Acção Encoberta, dá-se conhecimento ao Ministério Público junto do respectivo órgão que a ordena, no prazo de 3 dias, para acompanhamento e fiscalização, sem se identificar o Agente Encoberto e a missão.
  3. A realização de Acções Encobertas pode ser solicitada, oficiosamente, pelo Magistrado do Ministério Público ao Titular do Órgão de Polícia Criminal, caso se trate de processo em instrução preparatória, aplicando-se o disposto no n.º 1, no que respeita à sua ordenação.
  4. Para a realização de Acções Encobertas, ordenadas no n.º 1, deve ser emitida uma ordem de missão, que é classificada nos termos no n.º 3 do artigo 5.º.
  5. A participação de terceiros em Acções Encobertas é solicitada pela Autoridade de Polícia Criminal, por ofício, ao Titular do Órgão de Polícia Criminal, de acordo com o correspondente escalão, observando-se o previsto no n.º 1, para o caso da circunscrição provincial e mediante conhecimento do representante do Ministério Público junto do respectivo órgão que a admite, observando-se o prazo previsto no n.º 2.
  6. As Acções Encobertas podem ocorrer durante a actividade de investigação operativa e na fase de instrução processual.

Artigo 9.º (Execução)

  1. A execução das Acções Encobertas é coordenada pelo Órgão de Polícia Criminal e pode implicar:
    • a)- A aproximação e interacção ocasional com pessoas singulares, colectivas ou grupos organizados sem personalidade jurídica;
    • b)- A infiltração ou actuação em locais públicos ou privados, no seio de pessoas colectivas ou grupos organizados sem personalidade jurídica;
    • c)- A actuação como oficial operativo;
    • d)- A realização de entregas controladas e encomendas vigiadas;
    • e)- O envolvimento ou o recrutamento de fontes, de pessoa de confiança e de colaborador secreto;
    • f)- A obtenção e tratamento de informação criminalmente relevante;
    • g)- A actuação em circunstâncias e ambientes comuns ou incomuns;
    • h)- A actuação no território nacional ou no exterior do País.
  2. A actuação no exterior do País, prevista na alínea h) do número anterior, deve ocorrer na base da cooperação internacional e nos termos de legislação própria.

Artigo 10.º (Limitações)

  1. É proibida a actividade de Agente Provocador.
  2. O Agente Encoberto não deve permanecer na mesma missão por mais de 3 anos ou participar em distintas operações em simultâneo.
  3. O período de tempo previsto no número anterior pode ser, excepcionalmente, prorrogado por mais 2 anos, desde que a sua avaliação periódica seja positiva e a sua permanência não prejudique o andamento da missão.
  4. Após a participação numa missão cujo tempo de duração seja até 6 meses, o Agente Encoberto deve ser afastado por um período de tempo correspondente à metade.
  5. Se a missão do agente for superior a 6 meses, o período de afastamento não deve exceder a 3 meses.
  6. O Agente Encoberto deve comunicar, periodicamente, por qualquer tipo de meio que não comprometa o seu encobrimento, a missão e a finalidade desta, todos os aspectos relevantes para o bom desempenho da missão ou que possam inviabilizar a sua continuidade.
  7. O Agente Encoberto deve ser afastado definitivamente da missão caso tenha a sua identidade ou missão revelada, ou caso informe que não a pode continuar.
  8. O Agente Encoberto não deve, injustificadamente, praticar actos que possam configurar ilícitos, que atentem contra a moral pública, que danifiquem bens públicos ou sejam prejudiciais ao meio ambiente.

Artigo 11.º (Cooperação)

  1. Na circunstância em que participem diferentes Agentes Encobertos ou Terceiros em uma mesma missão, estes devem cooperar mutuamente, caso tal seja imprescindível para se atingir as finalidades previstas nos artigos 4.º e 6.º, sem comprometerem a identidade secreta e a missão.
  2. A cooperação deve incidir na partilha de informações e de meios essenciais à execução da operação e no planeamento táctico ou estratégico conjunto, bem como na realização coordenada de acções conjuntas.
  3. À cooperação internacional em matéria de Acções Encobertas aplica-se o regime previsto na Lei da Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal.

CAPÍTULO III AGENTE ENCOBERTO E TERCEIROS

Artigo 12.º (Selecção e Formação)

  1. O candidato a Agente Encoberto deve pertencer ao quadro de pessoal do Órgão de Polícia Criminal, e cuja selecção para participar em Acções Encobertas deve ser feita na base de resultados positivos dos testes psicotécnicos, psíquicos e físicos especializados.
  2. O Terceiro que participa nas Acções Encobertas pode ser efectivo dos Órgãos de Segurança e Ordem Interna, que não seja de Polícia Criminal, de Órgãos de Defesa Nacional e de Órgãos de Inteligência e de Segurança do Estado, aplicando-se o que se encontra previsto no número anterior, no que respeita à selecção para participar em Acções Encobertas.
  3. A selecção dos candidatos deve ter em conta a natureza da actividade da acção encoberta, o tipo e as especificidades da missão a executar.
  4. O candidato, além de possuir formação policial e de investigação criminal, deve beneficiar de formação e treinamento necessário e adequado à execução da acção encoberta.

Artigo 13.º (Perfil)

O Agente Encoberto deve ter o seguinte perfil:

  • a)- Boa compleição física e saúde;
  • b)- Bom estado de sanidade mental;
  • c)- Formação e treinamento necessário e adequado à função;
  • d)- Mínimo de 2 anos de serviço efectivo em actividades operativas de defesa e segurança;
  • e)- Reconhecida idoneidade profissional, discrição e sigilo.

Artigo 14.º (Deveres)

São deveres do Agente Encoberto:

  • a)- Salvaguardar o interesse do Estado;
  • b)- Dedicar absoluta lealdade ao Estado;
  • c)- Cumprir as ordens e orientações do Órgão de Polícia Criminal competente:
  • d)- Cumprir as missões que lhe são confiadas;
  • e)- Guardar sigilo absoluto das missões que lhe são confiadas;
  • f)- Actuar com sapiência, diligência, destreza, sagacidade e de forma proporcional às circunstâncias envolventes à situação operacional em que se encontre;
  • g)- Manter total discrição nos seus actos;
  • h)- Observar os limites previstos no artigo 10.º;
  • i)- Informar, permanentemente, o Órgão de Polícia Criminal competente sobre o andamento da missão, bem como sobre o cumprimento das orientações, relatando as dificuldades, deficiências, condições operacionais e a sua capacidade para continuar ou não na missão.

CAPÍTULO IV RELATÓRIO

Artigo 15.º (Elaboração do Relatório)

  1. Após o termo da Acção Encoberta, a Autoridade de Polícia Criminal que a solicitou ou coordenou deve elaborar o relatório da intervenção do Agente Encoberto e remetê-lo ao Órgão de Polícia Criminal que a ordenou.
  2. Caso seja indispensável para a responsabilização criminal de agentes criminosos, o Órgão de Polícia Criminal que ordenou a Acção Encoberta deve reduzir o relatório a auto processual e remetê-lo ao Ministério Público para a abertura de instrução preparatória ou para a junção aos autos de instrução preparatória se já estiver a correr termos, observando-se o previsto na Lei do Processual Penal e na Lei sobre o Segredo de Estado.

Artigo 16.º (Valor Probatório do Relatório)

  1. Por Despacho do Ministério Público, o relatório reduzido a auto, a que se refere o artigo anterior, dá lugar a abertura de processo penal, ou pode ser junto aos autos do processo penal que já corre os seus trâmites e aos quais os factos investigados digam respeito, caso se mostrem indispensáveis para a prova.
  2. A apreciação da indispensabilidade da junção do relatório ao processo penal é feita pelo Ministério Público no momento da sua recepção ou ser diferida até ao termo da instrução preparatória e caso seja aceite, é junto aos autos, caso contrário, é devolvido ao Órgão de Polícia Criminal competente.
  3. Durante a fase de instrução preparatória, caso seja necessário e mediante solicitação, o Órgão de Polícia Criminal pode fazer comparecer o Agente Encoberto perante o Magistrado do Ministério Público.
  4. Para o cumprimento do disposto no número anterior, o Magistrado do Ministério Público que solicita a comparência deve tomar as medidas necessárias para que, na sua audição, o Agente Encoberto seja visto, de forma reservada, apenas por ele, como, entre outras formas, recorrer a videoconferência, teleconferência ou a audição à porta fechada.
  5. Caso se mostre necessário para o apuramento da verdade material, o Ministério Público pode solicitar ao Órgão de Polícia Criminal esclarecimentos sobre certos factos ou sobre o resultado da missão desenvolvida e descrita no relatório, bem como solicitar ao Juiz da causa, que o Agente Encoberto preste depoimento em sessão de julgamento, sobre os mesmos factos ou resultado, observando-se o disposto no n.º 2 do artigo 17.º.

CAPÍTULO V PROTECÇÃO DO AGENTE ENCOBERTO E OCULTAÇÃO DA IDENTIDADE

Artigo 17.º (Participação do Agente Encoberto na Fase de Julgamento)

  1. No caso de o Juiz da causa determinar, por indispensabilidade da prova, a participação do Agente Encoberto na fase do julgamento, devem ser observadas as normas do processo penal relativas aos declarantes.
  2. Para o cumprimento do disposto no número anterior, o Tribunal deve tomar as medidas necessárias para que, na audiência de julgamento, o Agente Encoberto seja visto de forma reservada, apenas pelo Juiz e pelo Ministério Público, como, entre outras, recorrer à videoconferência, à teleconferência ou à recolha antecipada do depoimento.
  3. Não deve ser permitida qualquer forma de gravação, ilustração ou exposição por teledifusão, projecção ou exibição de ilustração da imagem do Agente Encoberto.
  4. Salvo disposição legal em contrário, caso o Agente Encoberto tenha usado alguma fonte, não é obrigado a revelá-la.

Artigo 18.º (Identidade Fictícia)

  1. Para efeito do disposto no artigo 4.º, o Agente Encoberto deve actuar sob identidade fictícia.
  2. A Identidade Fictícia tem carácter provisório e deve ser emitida e outorgada pelo Serviço Nacional de Identificação, mediante decisão conjunta dos Titulares dos Órgãos encarregues pela Segurança e Ordem Interna e pela Justiça e Direitos Humanos.
  3. A decisão que atribui a identidade fictícia é classificada como secreta.
  4. Os operadores do Serviço Nacional de Identificação, responsáveis pela emissão de identidades fictícias, não devem emitir a identidade, caso não seja observado o que se encontra previsto no n.º 2 do presente artigo, sob pena de responsabilidade criminal.
  5. O Serviço Nacional de Identificação deve arquivar os suportes físicos ou digitais dos expedientes de atribuição e emissão de identidade fictícia em invólucros lacrados e em área especialmente reservada, restrita e protegida.
  6. Compete ao Órgão de Polícia Criminal gerir e promover a actualização das identidades fictícias outorgadas nos termos dos números anteriores.
  7. A Identidade Fictícia só deve ser usada pelo próprio Agente Encoberto e para os actos ou eventos relacionados com a acção encoberta, não devendo ser usada para fim contrário àquele pelo qual é atribuída, de entre outras, para o uso de outrem ou para exercer o direito de voto, sob pena de responsabilização criminal.

Artigo 19.º (Extinção da Identidade Fictícia)

  1. A Identidade Fictícia extingue-se nos seguintes casos:
    • a)- Findo o período da sua validade;
    • b)- Se esta for publicamente revelada;
    • c)- Se o usuário voluntariamente cometer crime, a que corresponda pena de prisão superior a 1 ano e que não tenha relação com a acção encoberta;
    • d)- Se, no período de validade, ocorrer a morte do usuário.
  2. Para o cumprimento do disposto no número anterior, o Órgão de Polícia Criminal que ordena a acção encoberta deve solicitar, por escrito, ao Serviço Nacional de Identificação, mediante prévio conhecimento dos Titulares de Órgãos encarregues pela Segurança e Ordem Pública e pela Justiça e Direitos Humanos.
  3. A extinção da Identidade Fictícia pressupõe a eliminação do seu registo documental físico e digital.
  4. Com a extinção da Identidade Fictícia, deve dar-se conhecimento ao Ministério Público junto do Órgão de Polícia Criminal que ordenou a acção encoberta.
  5. No caso previsto na alínea b) do n.º 1, o agente deve ser submetido ao programa de protecção de testemunhas, nos termos de legislação própria.

Artigo 20.º (Perfil Cibernético e Histórico Fictícios)

  1. À Identidade Fictícia atribuída ao Agente Encoberto, caso seja necessário para o reforço do seu encobrimento, pode ser criado um perfil cibernético e históricos fictícios.
  2. Como efeito da extinção da Identidade Fictícia, deve ser eliminado o perfil cibernético e histórico fictícios existentes.

Artigo 21.º (Sigilo)

  1. Salvo disposição legal em contrário ou decisão judicial, as entidades previstas no n.º 2 do artigo 18.º, e as pessoas ligadas ao serviço indicado no n.º 4 do mesmo artigo, devem guardar sigilo absoluto.
  2. A violação do dever previsto no número anterior é susceptível de responsabilização criminal, civil e disciplinar, nos termos da legislação em vigor.

CAPÍTULO VI RESPONSABILIDADE JURÍDICA

Artigo 22.º (Isenção de Responsabilidade Jurídica)

  1. A conduta do Agente Encoberto, no âmbito de uma acção encoberta, não é punível caso corresponda à prática de acto preparatório ou consumado de ilícito, em qualquer forma de comparticipação, diversa de instigação, provocação e da autoria mediata, sempre que se prove que este guardou a devida proporcionalidade, tendo em conta as circunstâncias e a finalidade da acção.
  2. A excepção relativa à autoria mediata, prevista no número anterior, não releva se ficar provado que a acção resultou de coacção física ou ameaça contra a própria vida do agente.
  3. A aferição da actuação proporcional do agente, ou não, faz-se mediante averiguação e peritagem pelo Órgão de Polícia Criminal, por sua iniciativa ou por ordem do Juiz, ou pelo Ministério Público na sua função de fiscalização.
  4. Instaurado o procedimento criminal por acto praticado pelo Agente Encoberto, ao abrigo do disposto na presente Lei, o Ministério Público ou a autoridade judicial competente, logo que tenha conhecimento da sua qualidade, deve requerer a informação ao Órgão de Polícia Criminal que autorizou a acção, nos termos do artigo 8.º.

Artigo 23.º (Responsabilização)

O Agente Encoberto pode ser responsabilizado criminal, civil ou disciplinarmente pela violação dos deveres previstos no artigo 14.º e no n.º 7 do artigo 18.º.

CAPÍTULO VII DISPOSIÇÕES FINAIS

Artigo 24.º (Base de Dados)

Enquanto não for adoptada outra forma prevista por lei, a implementação e a gestão da base de dados das identidades fictícias devem ser feitas de forma conjunta pelos Órgãos encarregues pela Segurança e Ordem Interna e pela Justiça e Direitos Humanos.

Artigo 25.º (Dúvidas e Omissões)

As dúvidas e as omissões resultantes da interpretação e da aplicação da presente Lei são resolvidas pela Assembleia Nacional.

Artigo 26.º (Entrada em Vigor)

A presente Lei entra em vigor à data da sua publicação. Vista e aprovada pela Assembleia Nacional, em Luanda, aos 23 de Janeiro de 2020. O Presidente da Assembleia Nacional, Fernando da Piedade Dias dos Santos. Promulgada aos 27 de Março de 2020.

  • Publique-se. O Presidente da República, JOÃO MANUEL GONÇALVES LOURENÇO.
Download

Para descarregar o PDF do diploma oficial clique aqui.