Lei n.º 13/15 de 19 de junho
- Diploma: Lei n.º 13/15 de 19 de junho
- Entidade Legisladora: Assembleia Nacional
- Publicação: Diário da República Iª Série n.º 91 de 19 de Junho de 2015 (Pág. 2609)
Assunto
Lei da Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal.
Conteúdo do Diploma
Considerando que a livre circulação de pessoas, serviços e capitais implica a crescente cooperação judiciária entre territórios de diferentes Estados, no domínio das telecomunicações e da comunicação em geral, na mobilidade entre os cidadãos de vários Estados, bem como o intercâmbio de dados sobre os casos de crimes praticados por angolanos no estrangeiro: Tendo em conta que as referidas situações fizeram emergir uma nova delinquência internacional cada vez mais organizada e mais sofisticada, fazendo com que os agentes destes crimes aproveitem as limitações dos regimes jurídicos existentes em matéria de competência extraterritorial para iludir ou, pelo menos, dificultar a aplicação da lei penal, praticando, muitas vezes, actos criminosos: Considerando ainda que a protecção dos interesses da defesa nacional, da soberania, das relações externas, da segurança, da ordem pública, da economia e de outros interesses protegidos pelo Estado Angolano, impõem o reforço dos meios indispensáveis ao combate e prevenção da criminalidade transnacional mais grave e organizada, habilitando o País a cooperar com outros Estados, com base na criação de diplomas específicos apesar da diversidade de sistemas jurídicos dos Estados cooperantes; A Assembleia Nacional aprova, por mandato do povo, nos termos das disposições combinadas das alíneas b) do artigo 161.º, da alínea e) do artigo 164.º e da alínea d) do n.º 2 do artigo 166.º, todos da Constituição da República de Angola, a seguinte:
LEI DA COOPERAÇÃO JUDICIÁRIA INTERNACIONAL EM MATÉRIA PENAL
TÍTULO I DISPOSIÇÕES GERAIS
CAPÍTULO I OBJECTO E ÂMBITO DE APLICAÇÃO
Artigo 1.º (Objecto)
- A presente Lei regula as formas de cooperação judiciária internacional em matéria penal, nomeadamente:
- a)- Extradição;
- b)- Transmissão de processos penais;
- c)- Execução de sentenças penais;
- d)- Transferência de pessoas condenadas a penas ou medidas de segurança privativas da liberdade;
- e)- Vigilância de pessoas condenadas ou libertadas condicionalmente;
- f)- Auxílio judiciário mútuo em matéria penal;
- g)- Cooperação no âmbito do cibercrime.
- O disposto no número anterior aplica-se, com as devidas adaptações, à cooperação da República de Angola com as entidades judiciárias internacionais estabelecidas no âmbito de tratados que vinculem o Estado Angolano.
- A presente Lei é subsidiariamente aplicável à cooperação em matéria de infracções de natureza penal, na fase em que tramitem perante autoridades administrativas, bem como de infracções que constituam ilícito transgressional, cujos processos admitam recurso judicial.
Artigo 2.º (Âmbito de Aplicação)
- A aplicação da presente Lei subordina-se à protecção dos interesses da defesa nacional, da soberania, das relações externas, da segurança, da ordem pública, da economia e de outros interesses da República de Angola, constitucionalmente definidos.
- A presente Lei não confere a outros Estados o direito de exigir à República de Angola qualquer das formas de cooperação previstas no n.º 1 do artigo anterior, quando possam afectar a protecção dos interesses previstos no n.º 1 do presente artigo.
Artigo 3.º (Definições)
Para os efeitos da presente Lei, considera-se:
- a)- «Área jurisdicional», a jurisdição da República de Angola ou de outro Estado ou território;
- b)- «Autoridade central» entidade da Administração Central do Estado, a indicar pelo Titular do Poder Executivo para exercer as competências decisórias e executórias atribuídas pela presente Lei;
- c)- «Arguido», toda a pessoa contra quem correr processo ou contra quem for deduzida acusação ou requerida instrução;
- d)- «Condenado», pessoa contra quem foi proferida sentença que imponha uma reacção criminal ou relativamente à qual foi proferida decisão judicial que reconheça a sua culpabilidade, ainda que suspendendo condicionalmente a aplicação da pena ou impondo sanção criminal privativa da liberdade cuja execução é declarada suspensa, no todo ou em parte, na data da sentença ou posteriormente ou substituída por medida não detentiva;
- e)- «Entrega de infractor em fuga», transferência para a parte requerente de pessoa que se encontra na parte requerida, a pedido daquela, por nela se encontrar arguido ou condenado pela prática de um crime;
- f)- «Parte decisora», o Estado ou o território que profere uma sentença penal;
- g)- «Parte requerente», o Estado ou território que solicita a cooperação;
- h)- «Parte requerida», o Estado ou território a quem é solicitada a cooperação;
- i)- «Reacção criminal», qualquer pena ou medida de segurança privativas da liberdade, pena pecuniária ou outra sanção não detentiva, incluindo sanções acessórias;
- j)- «Suspeito», toda a pessoa relativamente à qual existem indícios de que cometeu uma infracção ou nela participou;
- k)- «Transferência de pessoa condenada», envio de pessoa que se encontra a cumprir pena ou medida de segurança privativas da liberdade, da parte decisora para outro Estado ou território, para neste continuar a execução da sentença penal.
CAPÍTULO II PRINCÍPIOS GERAIS
Artigo 4.º (Prevalência de Tratados Internacionais)
- A cooperação judiciária em matéria penal rege-se pelas normas constantes de tratados internacionais que, nos termos da Lei n.º 4/11, de 14 de Janeiro - Lei dos Tratados Internacionais, vinculem o Estado Angolano e, na sua falta ou insuficiência, pelas disposições desta Lei.
- São subsidiariamente aplicáveis as disposições da legislação processual penal.
Artigo 5.º (Princípio da Reciprocidade)
- À cooperação internacional em matéria penal é aplicável o princípio da reciprocidade.
- No âmbito das suas atribuições, a autoridade central solicita uma garantia de reciprocidade se as circunstâncias o exigirem e pode prestá-la a outros Estados, nos limites da presente Lei.
Artigo 6.º (Dupla Punibilidade)
- A infracção que motiva o pedido de cooperação deve ser punível como crime pela legislação da parte requerente e pela legislação da parte requerida, sem prejuízo do disposto no artigo 11.º 2. A não punibilidade do facto na República de Angola, não obsta à satisfação de um pedido de cooperação se este se destinar à prova de uma causa de exclusão da ilicitude ou da culpa da pessoa contra quem o procedimento penal foi instaurado e se a cooperação não implicar a aplicação de medidas coercivas.
Artigo 7.º (Requisitos Gerais Negativos da Cooperação Internacional)
- O pedido de cooperação é recusado quando:
- a)- O processo não satisfizer ou não respeitar as exigências de tratados internacionais aplicáveis na República de Angola;
- b)- Existirem fundadas razões para crer que a cooperação é solicitada com o fim de perseguir ou punir uma pessoa em virtude da sua nacionalidade, ascendência, raça, sexo, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou pertença a um grupo social determinado;
- c)- Existir risco de agravamento da situação processual de uma pessoa por qualquer das razões indicadas na alínea anterior;
- d)- Puder conduzir a julgamento por um tribunal de excepção ou respeitar a execução de sentença proferida por um tribunal dessa natureza;
- e)- Respeitar a facto punível com pena de morte ou sempre que se admita, com fundamento, que possa resultar a prática de tortura, tratamento desumano ou outra de que possa resultar lesão irreversível da integridade da pessoa;
- f)- Respeitar a infracção a que corresponda pena de prisão ou medida de segurança com carácter perpétuo ou de duração indefinida.
- O pedido de cooperação é ainda recusado quando não estiver garantida a reciprocidade.
- Quando for negada a extradição com base nas alíneas d), e) e f) do n.º 1, aplica-se o mecanismo de cooperação previsto no n.º 2 do artigo 33.º.
Artigo 8.º (Recusa Relativa à Natureza da Infracção)
- O pedido é também recusado quando o processo respeitar a facto que constitua:
- a)- Infracção de natureza política ou a ela conexa, segundo as concepções do direito angolano;
- b)- Crime militar que não seja simultaneamente previsto na lei penal comum.
- Não se consideram de natureza política:
- a)- O genocídio, os crimes contra a Humanidade, os crimes de guerra e infracções graves segundo as Convenções de Genebra de 1949;
- b)- Os actos referidos na Convenção contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, adoptada pela Assembleia das Nações Unidas em 17 de Dezembro de 1984;
- c)- As infracções compreendidas no campo da aplicação da Convenção para a Repressão da Captura Ilícita de Aeronaves, assinada em Haia ao 16 de Dezembro de 1970;
- d)- As infracções compreendidas no campo da aplicação da Convenção para a Repressão de Actos Ilícitos Dirigidos contra a Segurança da Aviação Civil, assinada em Montreal em 23 de Setembro de 1971;
- e)- As infracções graves constituídas por um ataque contra a vida, a integridade física ou a liberdade das pessoas que gozem de protecção internacional, inclusive os agentes diplomáticos;
- f)- As infracções que comportam o rapto, a detenção de reféns, o sequestro ou o tráfico de seres humanos;
- g)- As infracções que comportam a utilização de bombas, granadas, foguetões, armas de fogo ou cartas ou embrulhos armadilhados, na medida em que essa utilização apresente perigo para quaisquer pessoas;
- h)- A tentativa de cometimento de uma das infracções acima citadas ou a participação como co-autor ou cúmplice;
- i)- Quaisquer outros crimes a que seja retirada natureza política por tratado, convenção ou acordo internacional de que a República de Angola seja parte.
Artigo 9.º (Extinção do Procedimento Penal)
- A cooperação não é admissível se, em Angola ou noutro Estado em que tenha sido instaurado procedimento pelo mesmo facto:
- a)- O processo tiver terminado com sentença absolutória transitada em julgado ou com decisão de arquivamento;
- b)- A sentença condenatória se encontrar cumprida ou não puder ser cumprida segundo o direito do Estado em que foi proferida;
- c)- O procedimento se encontrar extinto por qualquer outro motivo, salvo se estiver previsto em convenção internacional, como não obstando à cooperação por parte do Estado requerido.
- O disposto nas alíneas a) e b) do número anterior não se aplica se, a autoridade estrangeira que formular o pedido o justificar para fins de revisão de sentença e os fundamentos desta forem idênticos aos admitidos no direito angolano.
- O disposto na alínea a) do n.º 1 não obsta à cooperação com fundamento na reabertura de processo arquivado previsto na lei.
Artigo 10.º (Concurso de Casos de Admissibilidade e de Inadmissibilidade da Cooperação)
- Se o facto imputado à pessoa contra quem é instaurado procedimento estiver previsto em várias disposições do direito penal angolano, o pedido de cooperação só é atendido na parte respeitante à infracção ou infracções relativamente às quais seja admissível o pedido e desde que o Estado requerente dê garantias de observar as condições fixadas para a cooperação.
- A cooperação é, porém, excluída se o facto estiver previsto em várias disposições do direito penal angolano ou estrangeiro e o pedido não possa ser satisfeito por força de uma disposição legal que o abranja na sua totalidade e que constitua motivo de recusa da cooperação.
Artigo 11.º (Relevância da Infracção)
- A cooperação pode ser recusada se a reduzida importância da infracção não a justificar.
- Para efeitos do número anterior, consideram-se de reduzida importância:
- a)- As infracções de natureza criminal puníveis com pena de prisão com limite máximo até 3 anos;
- b)- As infracções de natureza contravencional ou transgressional puníveis com pena de multa com o limite máximo até AKz: 2.000.000,00 (dois milhões de Kwanzas).
Artigo 12.º (Protecção do Segredo)
Na execução de um pedido de cooperação requerido à República de Angola observam-se as disposições do Código de Processo Penal e legislação complementar relativas à recusa de testemunhar, às apreensões, escutas telefónicas e ao segredo profissional ou de Estado e nos demais casos em que o segredo seja protegido nos termos da lei.
Artigo 13.º (Direito Aplicável)
- Produzem efeitos na República de Angola:
- a)- Os motivos de interrupção ou de suspensão da prescrição segundo o direito do Estado requerente;
- b)- A queixa apresentada em tempo útil a uma autoridade estrangeira, quando for igualmente exigida pela lei angolana.
- Se apenas o direito angolano exigir queixa, nenhuma sanção criminal pode ser imposta ou executada em Angola na falta de queixa ou no caso de desistência do respectivo titular.
Artigo 14.º (Imputação da Detenção)
- A prisão preventiva sofrida no estrangeiro ou a detenção decretada no estrangeiro em consequência de uma das formas de cooperação previstas na presente Lei são levadas em conta no âmbito do processo angolano ou imputadas na pena, nos termos do Código Penal, como se a privação da liberdade tivesse ocorrido na República de Angola.
- Com vista a possibilitar a tomada em consideração da prisão preventiva ou da pena já cumpridas em Angola, são prestadas as informações necessárias.
Artigo 15.º (Indemnização)
A lei angolana aplica-se à indemnização devida por detenção ou prisão ilegal ou injustificada, ou por outros danos sofridos pelo suspeito e pelo arguido, nomeadamente:
- a)- No decurso de procedimento instaurado em Angola para efectivação de um pedido de cooperação formulado à República de Angola;
- b)- No decurso de procedimento instaurado no estrangeiro para efectivação de um pedido de cooperação formulado por uma autoridade angolana.
Artigo 16.º (Concurso de Pedidos)
- Se a cooperação for solicitada por vários Estados, relativamente ao mesmo ou a diferentes factos, esta é concedida em favor do Estado que, tendo em conta as circunstâncias do caso, assegure melhor os interesses da realização da justiça e da reinserção social do suspeito, do arguido ou do condenado.
- O disposto no número anterior:
- a)- Cede perante a regra de prevalência da jurisdição internacional, nos casos a que se refere o n.º 2 do artigo 1.º;
- b)- Não se aplica à forma de cooperação referida na alínea f) do n.º 1 do artigo 1.º.
Artigo 17.º (Regra da Especialidade)
- A pessoa que, em consequência de um acto de cooperação, comparecer em Angola para intervir em processo penal como suspeito, arguido ou condenado não pode ser perseguida, julgada, detida ou sujeita a qualquer outra restrição da liberdade por facto anterior à sua presença em território nacional, diferente do que origina o pedido de cooperação formulado por autoridade angolana.
- A pessoa que, nos termos do número anterior, comparecer perante uma autoridade estrangeira não pode ser perseguida, detida, julgada ou sujeita a qualquer outra restrição da liberdade por facto ou condenação anteriores à sua saída do território angolano diferentes dos determinados no pedido de cooperação. 3. Antes de autorizada a transferência a que se refere o número anterior, o Estado que formula o pedido deve prestar as garantias necessárias ao cumprimento da regra da especialidade.
- A imunidade a que se refere este artigo cessa quando:
- a)- A pessoa em causa, tendo a possibilidade de abandonar o território angolano ou estrangeiro, não o faz dentro de 45 dias ou regressa voluntariamente a um desses territórios;
- b)- O Estado que autoriza a transferência, ouvido previamente o suspeito, o arguido ou o condenado, consentir na derrogação da regra da especialidade.
- O disposto nos n.os 1 e 2 não exclui a possibilidade de solicitar a extensão da cooperação a factos diferentes dos que fundamentaram o pedido, mediante novo pedido apresentado e instruído nos termos da presente Lei.
- No caso referido no número anterior, é obrigatória a apresentação de auto, onde constem as declarações da pessoa que beneficia da regra da especialidade.
- No caso de o pedido ser apresentado a um Estado estrangeiro, o auto a que se refere o número anterior é lavrado perante o tribunal de segunda instância da área onde residir ou se encontrar a pessoa que beneficia da regra da especialidade.
Artigo 18.º (Casos Particulares de não Aplicação da Regra da Especialidade)
- A imunidade referida nos n.os 1 e 2 do artigo anterior cessa também nos casos em que, por tratado, convenção ou acordo internacional de que a República de Angola seja parte, não haja lugar ao benefício da regra da especialidade.
- Quando a cessação da imunidade decorra de renúncia da pessoa que beneficia da regra da especialidade, deve essa renúncia resultar de declaração pessoal, prestada perante juiz, que demonstre que a pessoa a exprimiu voluntariamente e em plena consciência das consequências do seu acto, com assistência de advogado constituído ou, na sua falta, com assistência de defensor nomeado.
- Quando a pessoa em causa deva prestar declarações em Angola, no seguimento de pedido apresentado à República de Angola ou formulado por uma autoridade angolana, as declarações são prestadas perante o tribunal de segunda instância da área onde residir ou se encontrar a referida pessoa.
- Sem prejuízo do disposto no número anterior, a renúncia de pessoa que compareça em Angola em consequência de um acto de cooperação solicitado pela autoridade angolana é prestada no processo em que deva produzir efeito, quando as autoridades angolanas, após a entrega da pessoa, tiverem conhecimento superveniente de factos por ela praticados anteriormente a essa entrega.
Artigo 19.º (Denegação Facultativa da Cooperação Internacional)
- Pode ser negada a cooperação quando o facto que a motiva for objecto de processo pendente ou quando esse facto deva ou possa ser também objecto de procedimento da competência de uma autoridade judiciária angolana.
- Pode ainda ser negada a cooperação quando, tendo em conta as circunstâncias do facto, o deferimento do pedido possa implicar consequências graves para a pessoa visada, em razão da idade, estado de saúde ou de outros motivos de carácter pessoal.
Artigo 20.º (Non Bis In Idem)
Quando for aceite um pedido de cooperação que implique a delegação do procedimento em favor de uma autoridade judiciária estrangeira, não pode instaurar-se nem continuar em Angola procedimento pelo mesmo facto que determinou o pedido nem executar-se sentença cuja execução é delegada numa autoridade estrangeira.
CAPÍTULO III DISPOSIÇÕES GERAIS DO PROCESSO DE COOPERAÇÃO
Artigo 21.º (Língua Aplicável)
- O pedido de cooperação é acompanhado de tradução na língua oficial do Estado a quem é dirigido, salvo convenção ou acordo em contrário ou se aquele Estado a dispensar.
- As decisões de admissibilidade ou recusa do pedido de cooperação são notificadas à autoridade do Estado que o formulou, nos termos do n.º 1.
- O disposto neste artigo aplica-se aos documentos que devam acompanhar o pedido.
Artigo 22.º (Tramitação do Pedido)
- Para efeitos de recepção e de transmissão dos pedidos de cooperação abrangidos pela presente Lei, bem como para todas as comunicações que aos mesmos digam respeito, é competente a Autoridade Central, a ser designada pelo Titular do Poder Executivo.
- A Autoridade Central submete o pedido de cooperação formulado a Angola ao Titular do Poder Executivo com vista a decisão sobre a sua admissibilidade.
- O pedido de cooperação formulado por uma autoridade angolana é remetido ao Titular do Poder Executivo pela Autoridade Central.
- O disposto no n.º 1 não prejudica os contactos directos relativos a pedidos de cooperação a que se reporta a alínea f) do n.º 1 do artigo 1.º.
Artigo 23.º (Formas de Transmissão do Pedido)
- Quando disponíveis, e mediante acordo entre os Estados requerente e requerido, podem utilizar-se na transmissão dos pedidos os meios telemáticos adequados, nomeadamente a telecópia, desde que estejam garantidas a autenticidade e confidencialidade do pedido e a fiabilidade dos dados transmitidos.
- O disposto no número anterior não prejudica o recurso às vias previstas no n.º 2 do artigo 30.º.
Artigo 24.º (Requisitos do Pedido)
- O pedido de cooperação deve ser simples e claro, de forma que a autoridade destinatária do pedido possa facilmente enquadrar-se na questão de fundo, compreenda claramente a natureza da diligência que lhe é solicitada e possa efectuá-la da forma mais adequada, devendo este indicar:
- a)- A autoridade de que emana e a autoridade a quem se dirige, podendo fazer esta designação em termos gerais;
- b)- O objecto e motivos do pedido;
- c)- A qualificação jurídica dos factos que motivam o procedimento;
- d)- A identificação do suspeito, arguido ou condenado, da pessoa cuja extradição ou transferência se requer e a da testemunha ou perito a quem devam pedir-se declarações;
- e)- A narração sucinta dos factos, tais como a natureza e objecto da investigação, incluindo o lugar e o tempo da sua prática, proporcional à importância do acto de cooperação que se pretende ou, quando em sede de julgamento, o envio de cópia da acusação ou do despacho que designa dia para a realização do julgamento;
- f)- O texto das disposições legais aplicáveis no Estado que o formula;
- g)- Se possível, a identificação clara, do nome e morada da pessoa a ouvir, caso se trate de diligência de interrogatório, instrução ou peritagem;
- h)- Quaisquer documentos relativos ao facto.
- Os documentos não carecem de legalização.
- A autoridade competente pode exigir que um pedido formalmente irregular ou incompleto seja modificado ou completado, sem prejuízo da adopção de medidas provisórias quando estas não possam esperar pela regularização.
- O requisito a que se refere a alínea f) do n.º 1 pode ser dispensado quando se tratar da forma de cooperação referida na alínea f) do n.º 1 do artigo 1.º 5. Deve solicitar-se, quando necessário e com vista a salvaguardar o valor probatório e a legalidade do acto a praticar por autoridade estrangeira, que o mesmo seja praticado observando os termos prescritos pela lei angolana, remetendo-se cópia da legislação processual penal pertinente.
Artigo 25.º (Decisão sobre Admissibilidade)
- A decisão do Titular do Poder Executivo que declara admissível o pedido não vincula a autoridade judiciária.
- A decisão que declara inadmissível o pedido de cooperação internacional é fundamentada e não admite recurso.
- A decisão a que se refere o número anterior e que recusa o pedido de cooperação é comunicada pela Autoridade Central à autoridade nacional ou estrangeira que o formulou.
Artigo 26.º (Competência Interna em Matéria de Cooperação Internacional)
- A competência das autoridades angolanas para a formulação de um pedido de cooperação ou para a execução de um pedido formulado a República de Angola determina-se pelas disposições dos títulos seguintes.
- São subsidiariamente aplicáveis o Código de Processo Penal, a Lei n.º 21/11, de 16 de Fevereiro - Das Transgressões Administrativas, e demais legislação complementar a estes Diplomas.
Artigo 27.º (Despesas)
- A execução de um pedido de cooperação é, em regra, gratuita.
- Constituem, porém, encargo do Estado ou da entidade judiciária internacional que o formula:
- a)- As indemnizações e remunerações de testemunhas e peritos, bem como as despesas de viagem e estada;
- b)- As despesas decorrentes do envio ou entrega de coisas;
- c)- As despesas decorrentes da transferência de pessoas para o território do Estado requerente ou para a sede da entidade judiciária internacional;
- d)- As despesas com o trânsito de uma pessoa do território de um Estado estrangeiro ou da sede da entidade judiciária internacional para terceiro Estado ou para a sede dessa entidade;
- e)- As despesas efectuadas com o recurso à teleconferência, em cumprimento de um pedido de cooperação;
- f)- Outras despesas consideradas relevantes pelo Estado requerido, em função dos meios humanos e tecnológicos envolvidos no cumprimento do pedido.
- Para os efeitos da alínea a) do número anterior, pode ser abonado um adiantamento à testemunha ou ao perito, a mencionar na notificação e a reembolsar finda a diligência.
- Mediante acordo entre a República de Angola e o Estado estrangeiro ou a entidade judiciária internacional interessados no pedido, pode derrogar-se o disposto no n.º 2.
Artigo 28.º (Transferência de Pessoas)
- A transferência de pessoas detidas ou condenadas a penas ou medidas de segurança privativas da liberdade que deva realizar-se em cumprimento das decisões previstas nesta lei efectua-se pelos serviços responsáveis pelo sistema prisional de acordo com a autoridade do Estado estrangeiro em que se encontra a pessoa visada ou para onde a mesma deve ser transferida, relativamente ao meio de transporte, data, local e hora de entrega.
- A transferência efectua-se no mais curto prazo possível após a data da decisão que a determina.
- O disposto nos números anteriores aplica-se, com as necessárias adaptações, à transferência respeitante a pedido formulado por uma entidade judiciária internacional.
Artigo 29.º (Entrega de Objectos e Valores)
- Se o pedido de cooperação respeitar a entrega de objectos ou valores, exclusivamente ou como complemento de outro pedido, podem estes ser remetidos quando não sejam indispensáveis à prova de factos constitutivos de infracção, cujo conhecimento for da competência das autoridades angolanas.
- É ressalvada a possibilidade de remessa diferida ou sob condição de restituição.
- São ressalvados os direitos de terceiros de boa-fé, bem como os dos legítimos proprietários ou possuidores e os do Estado quando os objectos e valores possam ser declarados perdidos a seu favor.
- Em caso de oposição, os objectos e valores só são remetidos após decisão favorável da autoridade competente transitada em julgado.
- Tratando-se de pedido de extradição, a entrega de objectos ou valores referidos no n.º 1 pode efectuar-se mesmo que a extradição não se efective, nomeadamente por fuga ou morte do extraditando.
Artigo 30.º (Medidas Provisórias Urgentes)
- Em caso de urgência, as autoridades judiciárias estrangeiras podem comunicar directamente com as autoridades judiciárias angolanas, ou por intermédio da Organização Internacional de Polícia Criminal (INTERPOL) ou de órgãos centrais competentes para a cooperação policial internacional designados para o efeito, para solicitarem a adopção de uma medida cautelar ou para a prática de um acto que não admita demora, expondo os motivos da urgência e observando os requisitos referidos no artigo 24.º.
- O pedido é transmitido por via postal, electrónica ou telegráfica ou por qualquer outro meio que permita o seu registo por escrito e que seja admitido pela lei angolana.
- As autoridades judiciárias angolanas, se considerarem o pedido admissível, dão-lhe satisfação, sem prejuízo de submeterem à decisão do Titular do Poder Executivo, através da Autoridade Central, as matérias que esta lei faça depender da sua prévia apreciação ou, não sendo isso possível, ratificação.
- Quando, nos termos deste artigo, a cooperação envolver autoridades angolanas e estrangeiras de diferente natureza, o pedido é efectuado através da Autoridade Central.
Artigo 31.º (Destino do Pedido)
- A decisão definitiva da autoridade judiciária que não atender o pedido de cooperação é comunicada à autoridade estrangeira que o formulou, pelas vias referidas no artigo 22.º.
- Satisfeito um pedido de cooperação, a autoridade judiciária envia, quando for caso disso, os respectivos autos à autoridade estrangeira, nos termos previstos no artigo 159.º.
TÍTULO II EXTRADIÇÃO
CAPÍTULO I EXTRADIÇÃO PASSIVA
SECÇÃO I CONDIÇÕES DA EXTRADIÇÃO
Artigo 32.º (Fim e Fundamento da Extradição)
- A extradição pode ter lugar para efeitos de procedimento penal ou para cumprimento de pena ou medida de segurança privativas da liberdade por crime cujo julgamento seja da competência dos tribunais do Estado requerente.
- Para qualquer dos efeitos referidos no número anterior, só é admissível a entrega da pessoa reclamada no caso de crime, ainda que tentado, punível pela lei angolana e pela lei do Estado requerente com pena ou medida privativas da liberdade de duração máxima não inferior a três anos.
- Se a extradição tiver por fundamento vários factos distintos, cada um deles punível pela lei do Estado requerente e pela lei angolana com uma pena privativa de liberdade e se algum ou alguns deles não preencherem a condição referida no número anterior, pode também conceder-se a extradição por estes últimos. 4. Quando for pedida para cumprimento de pena ou medida de segurança privativas da liberdade, a extradição pode ser concedida se o tempo por cumprir não for inferior a (seis) 6 meses.
- O disposto nos números anteriores é aplicável, com as devidas adaptações, à cooperação que implique a extradição ou a entrega de pessoas às entidades judiciárias internacionais a que se refere o n.º 2 do artigo 1.º da presente Lei.
- O disposto no presente artigo não obsta à extradição quando sejam inferiores os limites mínimos estabelecidos em tratado, convenção ou acordo de que Angola seja parte.
Artigo 33.º (Casos em que é Excluída a Extradição)
- Para além dos casos referidos nos artigos 7.º a 9.º, a extradição é excluída quando:
- a)- O crime tiver sido cometido em território angolano;
- b)- A pessoa reclamada tiver nacionalidade angolana.
- Quando for negada a extradição com fundamento em algum dos casos referidos no número anterior, é instaurado procedimento penal pelos factos que fundamentam o pedido, sendo solicitados ao Estado requerente os elementos necessários, podendo o juiz impor as medidas cautelares que se afigurem adequadas.
- A qualidade de nacional é apreciada no momento em que seja tomada a decisão sobre a extradição.
- No âmbito de alianças militares ou de outra natureza, acordos especiais podem admitir crimes militares como fundamento de extradição.
Artigo 34.º (Crimes Cometidos em Terceiro Estado)
No caso de crimes cometidos em território de outro Estado que não o requerente, pode ser concedida a extradição quando a lei angolana der competência à sua jurisdição em identidade de circunstâncias ou quando o Estado requerente comprovar que o outro Estado não reclama o agente da infracção.
Artigo 35.º (Reextradição)
- O Estado requerente não pode reextraditar para terceiro Estado a pessoa que lhe foi entregue por efeito de extradição.
- Cessa a proibição constante do número anterior quando:
- a)- Nos termos estabelecidos para o pedido de extradição, for solicitada e prestada a correspondente autorização, ouvido previamente o extraditado:
- b)- O extraditado, tendo a possibilidade de abandonar o território do Estado requerente, não o faz dentro de 45 dias ou, tendo-o abandonado, a ele regressar voluntariamente.
- Para o efeito da alínea a) do número anterior, pode solicitar-se o envio de declaração da pessoa reclamada relativa à sua reextradição.
- A proibição de reextradição cessa também nos casos em que, por tratado, convenção ou acordo internacional de que Angola seja parte, não seja necessário o consentimento do Estado requerido.
- Quando o efeito previsto no número anterior decorra do consentimento da pessoa em causa, aplica-se o disposto no número seguinte.
- As declarações da pessoa reclamada, a que haja lugar por força dos n.os 3 e 4, são prestadas perante o tribunal da segunda instância da área onde residir ou se encontrar a referida pessoa, observando-se, quanto ao n.º 4, as formalidades previstas no artigo 18.º.
Artigo 36.º (Extradição Diferida)
- Não obsta à concessão da extradição a existência, em tribunais angolanos, de processo penal contra a pessoa reclamada ou a circunstância de esta se encontrar a cumprir pena privativa da liberdade por infracções diversas das que fundamentaram o pedido. 2. Nos casos do número anterior, pode diferir-se a entrega do extraditado para quando o processo ou o cumprimento da pena terminarem.
- É também causa de adiamento da entrega a verificação, por perito médico, de enfermidade que ponha em perigo a vida do extraditado.
Artigo 37.º (Entrega Temporária)
- No caso do n.º 1 do artigo anterior, a pessoa reclamada pode ser entregue temporariamente para a prática de actos processuais, designadamente o julgamento, que o Estado requerente demonstre não poder ser adiado sem grave prejuízo, desde que isso não prejudique o andamento do processo pendente em Angola e o Estado requerente se comprometa a que, terminados esses actos, a pessoa reclamada seja restituída sem quaisquer condições.
- Se a pessoa entregue temporariamente estava a cumprir pena, a execução desta fica suspensa desde a data em que essa pessoa foi entregue ao representante do Estado requerente até à data da sua restituição às autoridades angolanas.
- É, todavia, descontada na pena a detenção que não venha a ser computada no processo estrangeiro.
- No caso de ter sido diferida a entrega nos termos do artigo anterior, a autorização para a entrega temporária é tramitada como incidente do pedido de extradição, exclusivamente com vista à apreciação, pelo tribunal de segunda instância, dos critérios enunciados no n.º 1.
- O tribunal de segunda instância ouve o tribunal à ordem do qual a pessoa se encontra e a Autoridade Central.