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Lei n.º 10/15 de 17 de junho

Detalhes
  • Diploma: Lei n.º 10/15 de 17 de junho
  • Entidade Legisladora: Assembleia Nacional
  • Publicação: Diário da República Iª Série n.º 89 de 17 de Junho de 2015 (Pág. 2529)

Assunto

Lei sobre o Direito de Asilo e o Estatuto do Refugiado. - Revoga a Lei n.º 8/90, de 26 de Maio, Lei sobre o Estatuto do Refugiado e demais legislação que contrarie o disposto na presente Lei.

Conteúdo do Diploma

A Constituição da República de Angola garante o direito de asilo a todo o cidadão estrangeiro ou apátrida em caso de perseguição por motivos políticos, nomeadamente de grave ameaça ou de perseguição em consequência da sua actividade em favor da democracia, da independência nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana, de acordo com as leis em vigor e os instrumentos internacionais. Devido a factores resultantes de violência indiscriminada em situações de conflito armado internacional ou interno, ou de violação generalizada e indiscriminada de direitos humanos, o estrangeiro ou apátrida pode ser obrigado a deixar o seu País de origem, da sua nacionalidade ou

Artigo 58.º (Registo e Confidencialidade) .................................................................................19

Artigo 59.º (Gratuitidade e Urgência dos Processos)................................................................19

Artigo 60.º (Publicação no Diário da República) .......................................................................19

Artigo 61.º (Revogação) ............................................................................................................19

Artigo 62.º (Dúvidas e Omissões)..............................................................................................19

Artigo 63.º (Entrada em Vigor)..................................................................................................19

Conteúdo do Diploma

A Constituição da República de Angola garante o direito de asilo a todo o cidadão estrangeiro ou apátrida em caso de perseguição por motivos políticos, nomeadamente de grave ameaça ou de perseguição em consequência da sua actividade em favor da democracia, da independência nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana, de acordo com as leis em vigor e os instrumentos internacionais. Devido a factores resultantes de violência indiscriminada em situações de conflito armado internacional ou interno, ou de violação generalizada e indiscriminada de direitos humanos, o estrangeiro ou apátrida pode ser obrigado a deixar o seu País de origem, da sua nacionalidade ou da sua residência, por correr o risco de sofrer ofensa grave, vindo procurar refúgio em território angolano.

  • Tornando-se necessário regular o direito de asilo previsto no n.º 1 do artigo 71.º, da Constituição da República de Angola, bem como transpor para a ordem jurídica interna, para cumprimento das obrigações internacionais, as disposições dos instrumentos jurídicos internacionais, aos quais Angola aderiu, nomeadamente a «Convenção de Genebra», de 28 de Julho de 1951, o «Protocolo de Nova York», de 31 de Janeiro de 1967 e a «Convenção da Organização de Unidade Africana» sobre os aspectos específicos em África de 1969, relativas à protecção dos refugiados; Convicta da urgente necessidade de uma definição clara das condições e dos procedimentos de concessão e perda do Estatuto de Refugiado na República de Angola, em observância das obrigações internacionais assumidas com a adesão às convenções internacionais relativas aos refugiados e também de inibição da utilização abusiva do processo de asilo àqueles que, de modo fraudulento, pretendam entrar no País, não satisfazendo nenhuma das condições definidas pelas convenções para beneficiar do estatuto do refugiado; Sendo necessário estabelecer um mecanismo eficiente de articulação entre os órgãos nacionais que intervêm no processo de concessão ou de recusa de asilo e de perda do estatuto do refugiado por cessação, cancelamento ou revogação, à medida das alterações políticas, económicas e sociais ocorridas no País com o advento da paz, factores que fizeram aumentar o fluxo migratório e tornaram a Lei n.º 8/90, de 26 de Maio, sobre o Estatuto do Refugiado, desajustada à actual realidade económica e social; A Assembleia Nacional aprova, por mandato do povo, ao abrigo das disposições conjugadas da alínea b) do artigo 161.º e do n.º 4 do artigo 167.º, ambos da Constituição da República de Angola, a seguinte:

LEI SOBRE O DIREITO DE ASILO E O ESTATUTO DO REFUGIADO

CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES GERAIS

Artigo 1.º (Objecto)

A presente Lei estabelece o regime jurídico relativo ao direito de asilo e define o estatuto do refugiado, concretizando o previsto no n.º 1 do artigo 71.º, da Constituição da República de Angola e as disposições da «Convenção de Genebra» de 28 de Julho de 1951, o «Protocolo de Nova York» de 31 de Janeiro de 1967 e a «Convenção da Organização de Unidade Africana» sobre os aspectos específicos em África de 1969, relativas à protecção dos refugiados.

Artigo 2.º (Âmbito de Aplicação)

O disposto na presente Lei aplica-se aos cidadãos estrangeiros ou apátridas que requeiram asilo e aos refugiados, sem distinção de raça, de religião, de nacionalidade, de filiação em certo grupo social ou de opinião política, em conformidade com o estabelecido nos instrumentos jurídicos internacionais relativos aos refugiados a que a República de Angola aderiu ou venha a aderir.

Artigo 3.º (Definições, Siglas e Acrónimos)

Para efeitos da presente Lei, entende-se por:

  • a)- ACNUR - Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados;
  • b)- Apátrida - Pessoa que não é considerada como nacional por nenhum Estado ao abrigo da sua lei;
  • c)- Asilo - Protecção concedida pelo Estado angolano a uma pessoa, no seu território ou em outro local dependente de alguns dos seus órgãos, à revelia da jurisdição do país de origem, ao abrigo das convenções e protocolos, baseado no princípio do «non-refoulemenf» e que se caracteriza pelo gozo dos direitos dos refugiados reconhecidos pelo direito internacional de asilo;
  • d)- Autorização de residência - Autorização emitida pelas autoridades angolanas, que permite a um estrangeiro ou apátrida residir no território nacional, nos termos da lei;
  • e)- Autoridade Migratória - Departamento Ministerial da República de Angola responsável pela execução da política migratória;
  • f)- Centro de Acolhimento de Refugiados e Requerentes de Asilo, abreviadamente CARRA - Instituição criada pelo Estado onde são alojados de modo colectivo os requerentes de asilo, desde o momento da sua entrada em território nacional até à decisão definitiva do pedido, bem como para o assentamento dos refugiados que não reúnam condições para a livre circulação no território nacional;
  • g)- Conselho Nacional para os Refugiados, abreviadamente CNR - Órgão multissectorial de natureza consultiva, competente para apreciar os processos e pronunciar-se sobre o pedido de asilo e a perda do estatuto do refugiado, bem como sobre as reclamações relativas à recusa de asilo e à perda do estatuto do refugiado;
  • h)- Criança - Pessoa menor de dezoito (18) anos;
  • i)- Discriminação - Qualquer diferenciação, exclusão, restrição ou preferência baseada na raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tem o objectivo ou efeito de anular ou impedir o reconhecimento, gozo ou exercício, em pé de igualdade, de direitos humanos e liberdades fundamentais no campo político, económico, social, cultural ou qualquer outro campo da vida pública;
  • j)- Elementos de Prova - Prova documental, material ou de outra natureza, que suportam as declarações do requerente de asilo;
  • k)- Estatuto de Refugiado - É o conjunto de direitos, deveres e procedimentos definidos na presente Lei e demais legislação interna ou internacional em vigor na República de Angola, aplicáveis ao cidadão estrangeiro ou apátrida a quem foi concedido o asilo;
  • l)- Grupo Social Especial - Grupo de pessoas que partilham características comuns para além do risco de serem perseguidas ou que são consideradas como um grupo pela sociedade. A característica será muitas vezes uma característica que é inata, imutável ou que de outro modo é fundamental à identidade, consciência ou ao exercício de direitos humanos da pessoa;
  • m)- Membros da Família - Para efeito de reagrupamento familiar são membros da família, as pessoas do agregado familiar, nomeadamente o cônjuge ou companheiro(a) da união de facto, os pais, os filhos menores e os maiores inabilitados ou incapacitados que estão sob dependência do refugiado;
  • n)- Menor não acompanhado - Estrangeiro ou pessoa apátrida com menos de dezoito (18) anos de idade e que chega ou se encontra na República de Angola, sozinho ou separado de seus País ou habituais representantes legais;
  • o)- Nacionalidade - Vínculo jurídico de direito público entre uma pessoa e o Estado que constitui um grupo unido pela língua, identidade cultural, étnica ou linguística, tradição, interesses e aspirações comuns, condição a que estão associados o exercício dos direitos e o cumprimento dos deveres inerentes;
  • p)- Ofensa grave - Considera-se ofensa grave, nomeadamente: a pena de morte ou execução: a tortura pena ou tratamento desumano ou degradante no seu país de origem: ou ameaça grave contra a vida ou a integridade física do requerente, resultante de violência indiscriminada em situações de conflito armado internacional ou interno ou de violação generalizada e indiscriminada de direitos humanos;
  • q)- Opinião política - Qualquer opinião respeitante a assuntos relacionados com o Estado, o Governo e seus órgãos, titulares de órgãos públicos ou ainda da sociedade civil que seja interpretada como oposicionista, de contrariedade ou afronta ao Partido Político governante;
  • r)- País de origem - País ou Países de nacionalidade ou, para os apátridas, o país em que tinham a sua residência habitual;
  • s)- País seguro - País relativamente ao qual se pode estabelecer com segurança que, de forma objectiva e verificável, não dá origem a quaisquer refugiados, atendendo aos seguintes elementos: respeito pelos direitos da pessoa humana, existência e funcionamento normal das instituições democráticas, estabilidade política;
  • t)- País terceiro de acolhimento - País no qual, comprovadamente, o requerente de asilo não seja objecto de ameaças à sua vida e liberdade, nem sujeito a torturas ou a tratamento desumano ou degradante, obteve protecção ou usufruiu da oportunidade na fronteira ou no interior desse País, para pedir protecção ou foi comprovadamente admitido e que beneficie de uma protecção real contra a expulsão;
  • u)- Pedido de Asilo - Acto verbal ou escrito, pelo qual um cidadão estrangeiro ou apátrida solicita ao Estado angolano, através da autoridade migratória, a sua protecção ao abrigo da Convenção de Genebra de 1951 relativa ao Estatuto de Refugiados, do seu Protocolo de 1967 e da Convenção da OUA de 1969, que Regula os aspectos específicos dos problemas dos refugiados em África;
  • v)- Pedido fraudulento ou que constitua utilização abusiva do processo de asilo - Pedido que se alicerça em provas que provém de documentos falsos ou falsificados, quando questionado sobre os mesmos tiver declarado sua autenticidade: com má-fé tiver prestado propositadamente falsas declarações relacionadas com o objecto do pedido ou destruído documentos de prova da sua identidade: ou omita intencionalmente o facto de já ter apresentado um pedido de asilo num ou vários países com eventual recurso a uma falsa identidade;
  • w)- Pedido infundado - Pedido que não apresenta nenhuma questão substantiva, ausência de fundamento do alegado receio de perseguição no país de origem do requerente, porque o pedido claramente se baseia em fraude deliberada, ou porque constitui uma utilização abusiva do direito de asilo;
  • x)- Perseguição - Ameaça à vida ou à liberdade, ou outras violações graves dos direitos humanos, em virtude da raça, religião, nacionalidade, opinião política ou pertença a um certo grupo social;
  • y)- Posto de Fronteira - Local do território nacional habilitado para a entrada e saída de pessoas, onde houver fiscalização dos órgãos competentes;
  • z)- Princípio de «non refoulement» ou não devolução - Princípio segundo o qual, nenhuma pessoa será sujeita a medidas tais como a rejeição na fronteira, retorno ou expulsão que a compeliriam a regressar ou a permanecer num território onde a sua vida, integridade física ou liberdade estariam ameaçadas;
  • aa) Princípio do benefício da dúvida - Benefício a ser concedido pelo oficial de migração ao requerente de asilo, se este não consegue por falta de elementos de prova, fundamentar algumas das suas declarações quando estas são coerentes, plausíveis e não contraditórias face a generalidade dos factos apresentados;
  • bb) Princípio da proporcionalidade - Princípio segundo o qual os agentes da autoridade policial ou migratória devem pautar a sua conduta ou actuação pela adequação dos seus procedimentos aos objectivos da acção;
  • cc) Raça - Aparência física de uma pessoa, incluindo nomeadamente considerações associadas com a cor da pele, ascendência ou pertença a um grupo étnico ou social;
  • dd) Receio fundado de perseguição - Estado de espírito do requerente de asilo que deve basear- se numa situação objectiva prevalecente no País de origem e do elemento subjectivo imanente da perseguição;
  • ee) Recurso - Meio pelo qual o cidadão estrangeiro ou apátrida recorre da decisão proferida pelas autoridades angolanas sobre o pedido de asilo com a qual não se conforma, nos termos da lei da impugnação dos actos administrativos;
  • ff) Refugiado - Pessoa a quem foi concedido o estatuto de refugiado nos termos da presente Lei e das Convenções Internacionais relativas à protecção de refugiados;
  • gg) Religião - Credos religiosos ou doutrinas baseados na crença da existência de um poder superior, convicções teístas ou cerimónias de culto praticado em privado ou público, a título individual ou colectivo;
  • hh) Requerente de Asilo - Cidadão estrangeiro ou apátrida que solicita asilo, de forma verbal ou por escrito, na República de Angola cujo pedido ainda não foi objecto de decisão definitiva.

CAPÍTULO II DIREITO DE ASILO

SECÇÃO I GENERALIDADES

Artigo 4.º (Garantia do Direito de Asilo)

Ao cidadão estrangeiro ou apátrida é garantido o direito de asilo de acordo com a presente Lei e os instrumentos jurídicos internacionais relativos aos refugiados nos termos que Angola aderiu ou venha a aderir.

Artigo 5.º (Beneficiários do Direito de Asilo)

  1. Pode beneficiar do direito de asilo o cidadão estrangeiro ou apátrida que:
    • a)- É perseguido ou ameaçado de perseguição, em consequência da actividade exercida no Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual em favor da democracia, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana;
  • b)- Devido a temor bem fundamentado de ser perseguido por razões de raça, sexo, religião, nacionalidade, afiliação a um grupo social especial ou opinião política, essa pessoa se encontra fora do País de sua nacionalidade e não pode, ou devido a tal receio, não é capaz de se aproveitar da protecção daquele País: ou que, não possuindo nacionalidade e estando fora do seu país habitual de residência como resultado de tais eventos pode ou, devido a tal temor, não estar disposto a voltar ao mesmo;
    • c)- Por razões de agressão, ocupação, dominação estrangeira ou acontecimentos que perturbam em grande medida a ordem pública numa parte ou na totalidade do seu país de origem, da sua nacionalidade, ou da sua residência habitual, é obrigado a deixá-lo para procurar refúgio noutro local fora do seu país de origem, da sua nacionalidade ou da sua residência habitual;
  • d)- Por facto resultante de violência indiscriminada em situações de conflito armado internacional ou interno ou de violação generalizada e indiscriminada de direitos humanos é obrigado a deixar o seu país de origem, da sua nacionalidade ou da sua residência, por correr o risco de sofrer ofensa grave.
  1. O direito de asilo só pode ser concedido ao cidadão estrangeiro que tenha mais do que uma nacionalidade quando os motivos referidos no número anterior se verifiquem, relativamente, a todos os Estados de que seja nacional.

Artigo 6.º (Factores Impeditivos do Direito de Asilo)

Não pode beneficiar do direito de asilo o cidadão estrangeiro ou apátrida que comprovadamente esteja nas situações seguintes:

  • a)- Tenha praticado actos graves contra a independência e a soberania da República de Angola;
  • b)- Tenha cometido crimes contra a paz e a democracia, crimes de guerra, crimes contra a humanidade como os definidos nos instrumentos internacionais relativos a esses crimes;
  • c)- Tenha cometido crimes de delito comum fora da República de Angola;
  • d)- Tenha praticado actos contrários aos objectivos e princípios das Nações Unidas ou da União Africana.

SECÇÃO II PROCEDIMENTO PARA CONCESSÃO DE ASILO

Artigo 7.º (Apresentação e Recepção do Pedido de Asilo)

  1. O cidadão estrangeiro ou apátrida que pretenda obter asilo, pode submeter o seu pedido no posto de fronteira à autoridade migratória no interior do País a qualquer autoridade policial ou oficial de migração ou ainda fora do território nacional, junto de uma representação diplomática angolana acreditada, podendo fazê-lo por escrito ou verbalmente, sendo neste caso lavrado o respectivo auto.
  2. No interior de Angola o cidadão estrangeiro ou apátrida residente ou em regime de permanência temporária, que o queira, deve apresentar o pedido de asilo à autoridade migratória, ou a qualquer autoridade policial, nos casos seguintes:
    • a)- Se existirem razões válidas para a sua apresentação ou quando os factos que lhe servem de fundamento se verificarem, no prazo máximo de oito (8) dias;
    • b)- Quando ocorrerem os factos previstos no artigo 5.º, logo que o interessado deles tome conhecimento, no prazo máximo de oito (8) dias.
  3. Qualquer autoridade policial que receba o pedido de asilo deve, no prazo de quarenta e oito (48) horas, remetê-lo à representação local da autoridade migratória, que notifica de imediato o requerente de asilo para prestar declarações no prazo de oito (8) dias.

Artigo 8.º (Conteúdo do Pedido)

O requerente de asilo deve apresentar toda a informação necessária para justificar o pedido de asilo, nomeadamente:

  • a)- Identificação do requerente e dos membros do seu agregado familiar;
  • b)- Indicação da sua nacionalidade, país ou países e local ou locais de residência anteriores;
  • c)- Indicação de pedidos de asilo anteriores, se os houver;
  • d)- Relato das circunstâncias ou factos que fundamentam o pedido de asilo e a indicação dos elementos de prova reputados necessários.

Artigo 9.º (Efeitos da Apresentação do Pedido de Asilo Sobre Infracções Relativas à Entrada no País)

  1. A apresentação do pedido de asilo obsta o conhecimento de qualquer procedimento administrativo ou processo criminal por entrada irregular em território nacional instaurado contra o requerente e membros da família que o acompanham.
  2. O procedimento administrativo ou processo criminal por entrada irregular é arquivado caso o asilo seja concedido e se demonstre que a infracção correspondente foi determinada pelos mesmos factos que justificaram a sua concessão.
  3. Para efeitos do estabelecido nos números anteriores, o pedido de asilo e a decisão sobre o mesmo são comunicados pela autoridade migratória à entidade onde tramita o procedimento administrativo ou processo criminal, no prazo de quarenta e oito (48) após a recepção do pedido.

Artigo 10.º (Entrevista ao Requerente de Asilo)

  1. Deve a autoridade migratória notificar o requerente de asilo para prestar declarações indicando-lhe o dia, hora, local da entrevista e informar sobre os seus direitos, nomeadamente o direito a intérprete e assistência judiciária e também sobre seus deveres.
  2. O funcionário da autoridade migratória deve preencher o formulário do pedido de asilo, efectuar entrevista ao requerente e lavrar em autos confirmados por este, os motivos que determinaram a saída do país de perseguição, procurando que exponha o seu caso com a maior objectividade e ofereça as provas de que dispõe, que são juntas ao processo.
  3. A entrevista, para declarar em auto e fundamentar o pedido de asilo, da qual se deve elaborar a acta ou relatório, é instruída pela autoridade migratória ou a pedido do requerente de asilo, quantas vezes forem necessárias, dentro do prazo estabelecido no n.º 2 do artigo 15.º da presente Lei.
  4. É concedido o benefício da dúvida ao requerente de asilo que, por falta de elementos de prova, suficientes, não consegue fundamentar algumas das suas declarações, quando estas são coerentes, plausíveis e não contraditórias face a generalidade dos factos apresentados.
  5. O modelo do formulário referido no n.º 2 é aprovado por regulamento próprio.

Artigo 11.º (Comprovativo da Apresentação do Pedido de Asilo)

Após a entrevista, a autoridade migratória recolhe os dados biométricos, tira fotografias e emite a favor do requerente de asilo uma declaração comprovativa da apresentação do pedido de asilo, de acordo com o modelo aprovado por regulamento próprio.

Artigo 12.º (Permanência Temporária)

  1. A declaração comprovativa de apresentação do pedido de asilo, referida no artigo anterior, atesta que o requerente de asilo está autorizado a permanecer temporariamente em território nacional, por um período de sessenta (60) dias contados a data da apresentação, renovável por períodos de trinta (30) dias até a decisão final do pedido.
  2. O direito de permanência temporária não habilita o requerente de asilo a autorização de residência, nem o exercício de actividade remunerada ou a livre circulação fora do CARRA, sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes.
  3. Não estão abrangidos pelas disposições dos números anteriores, os requerentes de asilo que já residem ou beneficiam de autorização de permanência temporária no território nacional ao abrigo da Lei sobre o Regime Jurídico dos Estrangeiros em vigor na República de Angola.

Artigo 13.º (Centro de Acolhimento de Refugiados e Requerentes de Asilo «CARRA»)

  1. O CARRA, alberga os requerentes de asilo nos termos do disposto no artigo seguinte e os refugiados que não possuem meios de subsistência, ficando a sua criação, gestão e administração sob responsabilidade dos departamentos ministeriais responsáveis pela execução da política migratória e da Assistência e Reinserção Social, mediante delegação de poderes do Titular do Poder Executivo.
  2. O CARRA é instalado nas Províncias que possuam postos de fronteira terrestre, marítima ou fluvial e cujo volume de entrada de requerentes de asilo e refugiados o justifique.
  3. O Regulamento Interno do CARRA é aprovado por diploma legal.

Artigo 14.º (Ingresso do Requerente de Asilo no CARRA)

  1. A autoridade migratória deve, após a entrevista e emissão da declaração comprovativa do pedido de asilo, encaminhar o requerente para o CARRA mais próximo, não sendo a este permitido ausentar-se sem prévia autorização do Administrador do Centro, em conformidade com o respectivo regulamento, sob pena de responsabilização nos termos da presente Lei e demais legislação em vigor.
  2. O requerente de asilo que possuir meios de subsistência pode não ingressar no CARRA, mediante autorização prévia do titular do departamento ministerial responsável pela execução da política migratória.
  3. O requerente de asilo referido no número anterior fica vinculado aos direitos e obrigações inerentes à sua condição e deve apresentar-se periodicamente à autoridade migratória na data e hora que lhe for fixado, de acordo com as exigências de necessidade e proporcionalidade, bem como mantê-la informada sobre o seu domicílio actual, sob pena de responsabilização nos termos da presente Lei e demais legislação vigente.

Artigo 15.º (Instrução do Processo de Asilo)

  1. A autoridade migratória deve efectuar as diligências conducentes à averiguação dos factos cujo conhecimento seja relevante para uma justa e rápida decisão.
  2. O prazo de instrução do processo é de trinta (30) dias a contar da data da entrevista, prorrogável, por motivos devidamente justificados.

Artigo 16.º (Processo com Tramitação Célere)

O processo deve ser instruído no prazo máximo de quinze (15) dias nas seguintes situações:

  • a)- Ser evidente que não satisfaz nenhuma das condições para beneficiar do estatuto de refugiado previsto no artigo 5.º da presente Lei, por serem destituídas de fundamento as alegações do requerente que teme perseguição no seu País, por ser fraudulento ou constituir uma utilização abusiva do processo de asilo;
  • b)- Sempre que da sua concessão resulte em perigo ou fundada ameaça para a segurança interna ou externa ou para a ordem pública;
  • c)- Ser formulado por requerente que seja nacional ou residente habitual em País qualificado como País seguro ou País terceiro de acolhimento;
  • d)- Se enquadrar nas situações previstas no artigo 6.º da presente Lei;
  • e)- Se o pedido for apresentado, injustificadamente, fora do prazo previsto no n.º 2 do artigo 7.º da presente Lei;
  • f)- Se o requerente tiver já sido alvo de decisão de expulsão do território nacional.

Artigo 17.º (Remessa do processo ao Conselho Nacional para os Refugiados «CNR»)

  • Finda a instrução do processo, o órgão competente da autoridade migratória, elabora o relatório final com proposta fundamentada para a concessão ou recusa de asilo e remete-o ao CNR

Artigo 18.º (Apreciação do Processo pelo CNR)

O CNR, no prazo máximo de quinze (15) dias a contar da data da recepção do processo enviado pelo órgão competente da autoridade migratória, aprecia o pedido e apresenta proposta fundamentada para concessão ou recusa de asilo ao titular do departamento ministerial

Artigo 18.º (Apreciação do Processo pelo CNR)

O CNR, no prazo máximo de quinze (15) dias a contar da data da recepção do processo enviado pelo órgão competente da autoridade migratória, aprecia o pedido e apresenta proposta fundamentada para concessão ou recusa de asilo ao titular do departamento ministerial responsável pela execução da política migratória para decisão, mediante delegação de poderes do Titular do Poder Executivo.

Artigo 19.º (Decisão do Pedido de Asilo)

O titular do departamento ministerial responsável pela execução da política migratória mediante delegação de poderes do Titular do Poder Executivo defere ou indefere o pedido de asilo no prazo de quinze (15) dias a contar da data de recepção do processo.

Artigo 20.º (Efeitos da Decisão)

  1. Se o asilo for concedido, o cidadão estrangeiro ou apátrida beneficia do estatuto de refugiado nos termos do disposto na presente Lei, sendo-lhe atribuído o documento de identificação e a autorização de permanência temporária pela autoridade migratória, em conformidade com o disposto nos artigos 35.º e 36.º n.º 1 da presente Lei.
  2. Quando o pedido for recusado, o requerente de asilo é notificado no prazo de setenta e duas (72) horas, pela autoridade migratória da decisão do indeferimento do pedido, informando-se- lhe que deve abandonar o País no prazo de trinta (30) dias, sob pena de expulsão imediata, uma vez esgotado esse prazo, com a menção dos direitos que lhe assiste nos termos da Lei.
  3. Caso o requerente de asilo não interponha recurso e não cumpra o disposto no número anterior, a autoridade migratória reserva-se no direito de prosseguir o processo com vista à sua expulsão imediata, nos termos previstos na Lei sobre o Regime Jurídico dos Estrangeiros em vigor na República de Angola.

Artigo 21.º (Recurso)

  1. Do indeferimento do pedido de asilo por decisão do titular do departamento ministerial responsável pela execução da política migratória, mediante delegação de poderes do Titular do Poder Executivo, cabe recurso contencioso, precedido de reclamação, com efeito suspensivo, nos termos da Lei.
  2. Para a decisão sobre a reclamação relativa ao indeferimento do pedido, o titular do departamento responsável pela execução da política migratória convoca o CNR para consulta.
  3. Em caso de não provimento do recurso contencioso, o titular do departamento ministerial responsável pela execução da política migratória, através do órgão competente, notifica o requerente de asilo para, no prazo de quinze (15) dias, abandonar o território nacional.
  4. O requerente de asilo fica sujeito à lei aplicável aos estrangeiros a partir do termo do prazo previsto no número anterior, devendo a autoridade migratória prosseguir o processo com vista à sua expulsão imediata.

SECÇÃO III DIREITOS DO REQUERENTE DE ASILO

Artigo 22.º (Direito à Informação)

O requerente de asilo, no acto da apresentação do pedido é informado pela autoridade migratória sobre os seus direitos e os seus deveres, numa língua que o mesmo entenda.

Artigo 23.º (Permanência Temporária em Território Nacional)

O requerente de asilo tem direito a permanecer temporariamente em território nacional desde a apresentação do pedido, momento em que a autoridade migratória emite a seu favor a declaração comprovativa do pedido de asilo, até à decisão definitiva sobre o seu pedido.

Artigo 24.º (Direito a Intérprete e Assistência Judiciária)

  1. O requerente de asilo beneficia, sempre que necessário, dos serviços de intérprete para o assistir na formalização do pedido e durante os procedimentos processuais e de assistência social subsequentes, até a decisão final do pedido.
  2. O requerente de asilo beneficia de assistência judiciária nos termos da legislação em vigor.
  3. O ACNUR pode proporcionar assistência jurídica e/ou social aos requerentes de asilo em todas as fases de instrução do processo pela autoridade migratória.

Artigo 25.º (Direito à Preservação da Unidade Familiar)

O requerente de asilo tem direito a preservar a unidade familiar com os membros de sua família constantes do agregado familiar nomeadamente, o cônjuge ou companheiro(a) de união de facto, os pais, os filhos menores e os maiores inabilitados ou incapacitados que o acompanham e que estão sob sua dependência, dentro ou fora do CARRA.

Artigo 26.º (Direito à Saúde)

Ao requerente de asilo e à respectiva família constante do agregado familiar é concedido o direito a assistência médica e medicamentosa nas mesmas condições que os cidadãos nacionais.

Artigo 27.º (Direito a Alojamento e a Alimentação)

O requerente de asilo tem direito a alojamento e alimentação no CARRA.

Artigo 28.º (Atenção Adequada às Pessoas Vulneráveis)

As pessoas particularmente vulneráveis, nomeadamente, as crianças, os idosos, as mulheres grávidas, as pessoas com deficiência, as pessoas mal nutridas, as pessoas sofrendo de graves problemas psicológicos e sobreviventes de violência e tortura, incluindo sobreviventes de violência sexual e violência doméstica, beneficiam de uma atenção adequada, tanto fora como dentro do CARRA, tendo prioridade de acesso a serviços básicos tais como alimentação, alojamento e saúde.

SECÇÃO IV DEVERES DO REQUERENTE DE ASILO

Artigo 29.º (Respeito à Lei e às Autoridades Angolanas)

  1. O requerente de asilo tem o dever de respeitar a Constituição, as leis e regulamentos assim como as medidas que forem tomadas para manutenção da ordem pública e não se imiscuir na vida política angolana nem realizar actividades que possam perigar ou prejudicar a segurança nacional ou as relações de Angola com outros Estados, sob pena de responsabilização nos termos da presente Lei e demais legislação vigente.
  2. O desconhecimento da Lei não isenta o requerente de asilo das responsabilidades decorrentes das obrigações enunciadas no número anterior.

Artigo 30.º (Informação sobre o Domicílio)

O requerente de asilo que mediante autorização da autoridade migratória não residir no CARA tem a obrigação de informar sobre o seu domicílio actual, sob pena de responsabilização nos termos da presente Lei e demais legislação vigente.

Artigo 31.º (Restrições à Circulação)

O requerente de asilo que resida no CARRA não deve ausentar-se sem autorização do administrador do Centro, devendo cumprir escrupulosamente o seu regulamento, sob pena de responsabilização nos termos da presente Lei e demais legislação vigente.

CAPÍTULO III ESTATUTO DO REFUGIADO

SECÇÃO I GENERALIDADES

Artigo 32.º (Refugiados em Larga Escala)

  1. O Estado angolano pode conceder o estatuto de refugiado a pessoas em grupo que saiam do País de origem ou de residência habitual, de fronteira comum com a República de Angola, em consequência de graves conflitos armados, ocupação ou dominação estrangeira do seu território nacional ou calamidades naturais, que originem fluxos de refugiados em larga escala.
  2. Os critérios com base nos quais pode ser concedida a protecção temporária prevista no número anterior são definidos pelo Titular do Poder Executivo em cada situação em concreto.
  3. Os refugiados em larga escala são acolhidos em Centros de Acolhimento de Refugiados e Requerentes de Asilo, distantes da fronteira comum e que lhes garanta segurança.

Artigo 33.º (Aplicação Subsidiária de Normas Internacionais para Protecção dos Refugiados)

A concessão do estatuto de refugiado sujeita o beneficiário ao preceituado na presente Lei, sem prejuízo do que se dispõe na Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951, no Protocolo relativo ao Estatuto do Refugiado de 1967, na Convenção da Organização de Unidade Africana que rege os Aspectos Específicos dos Problemas dos Refugiados em África de 1969, bem como nos tratados, protocolos, acordos bilaterais ou multilaterais que a República de Angola é parte.

Artigo 34.º (Pedidos de Reinstalação)

  1. Os pedidos de reinstalação de refugiados sob responsabilidade do ACNUR são comunicados pelo Representante deste ao titular do departamento ministerial responsável pela execução da política migratória.
  2. O titular do departamento ministerial responsável pela execução da política migratória, mediante delegação de poderes do Titular do Poder Executivo pode solicitar a cooperação do ACNUR para a reinstalação do refugiado, a pedido deste, num terceiro país, que o queira receber.

SECÇÃO II DIREITOS DO REFUGIADO

Artigo 35.º (Direito à Identificação)

O refugiado tem direito, nos termos da Convenção de Genebra de 1951, a um documento de identificação comprovativo da sua qualidade, com requisitos de alta segurança, a atribuir pela autoridade migratória, de acordo com o modelo aprovado por regulamento próprio.

Artigo 36.º (Autorização de Residência Temporária)

  1. Após a atribuição do documento de identificação referido no artigo anterior, a autoridade migratória emite a favor do refugiado, uma autorização de residência temporária, renovável de acordo com a Lei sobre o Regime Jurídico dos Estrangeiros em vigor na República de Angola.
  2. A autorização de residência temporária é anulada pela autoridade migratória se o refugiado permanecer injustificadamente fora do território nacional por período superior a seis meses nos termos da Lei sobre o Regime Jurídico dos Estrangeiros em vigor na República de Angola, sujeitando-se a perda do estatuto de refugiado ao abrigo do disposto no artigo 47.º da presente Lei.

Artigo 37.º (Documento de Viagem)

A autoridade migratória pode emitir a favor do refugiado documento de viagem em conformidade com o disposto na Convenção relativa ao Estatuto do Refugiado de 1951 e de acordo com os parâmetros estabelecidos pela Organização Internacional da Aviação Civil no que respeita a Documentos de Viagem de Leitura Electrónica.

Artigo 38.º (Direito à Educação)

Ao beneficiário do estatuto de refugiado é assegurado o acesso ao sistema de ensino, nas mesmas condições que os cidadãos nacionais.

Artigo 39.º (Direito ao Trabalho)

É permitido o exercício de actividade remunerada e o acesso ao sistema de segurança social ao beneficiário do Estatuto de Refugiado, nas mesmas condições que os cidadãos estrangeiros que residem legalmente em Angola.

Artigo 40.º (Alojamento)

É permitido ao refugiado o acesso ao alojamento, em condições equivalentes às dos estrangeiros que residem legalmente em Angola.

Artigo 41.º (Liberdade de Circulação)

É garantida ao beneficiário do estatuto de refugiado a liberdade de circulação em território nacional, com as limitações previstas na lei e no Regulamento do CARRA e as determinadas por razões de segurança pública, em conformidade com a Lei sobre o Regime Jurídico dos Estrangeiros em vigor na República de Angola.

Artigo 42.º (Acesso à Justiça)

É assegurado ao refugiado o acesso à justiça nas mesmas condições que os cidadãos nacionais.

Artigo 43.º (Extensão dos Direitos)

  1. Sem prejuízos das limitações impostas por lei, os direitos do refugiado incluindo a qualidade de refugiado são extensivos ao cônjuge, pais, filhos menores e maiores inabilitados ou incapacitados, sempre que o refugiado o solicite, salvo se possuírem outra nacionalidade e gozarem da protecção do país da referida nacionalidade.
  2. A quebra da unidade da família por divórcio, separação ou morte não retira aos membros da família referidos no número anterior a qualidade de refugiado.

SECÇÃO III DEVERES DO REFUGIADO

Artigo 44.º (Respeito às Leis e às Autoridades Angolanas)

  1. O refugiado tem o dever de respeitar a Constituição, as leis e regulamentos, assim como as directrizes administrativas e policiais emitidas pelas autoridades competentes tomadas para manutenção da ordem pública e não se imiscuir na vida política angolana nem realizar actividades que podem fazer perigar ou prejudicar a segurança nacional ou as relações de Angola com outros Estados, sob pena de responsabilização nos termos da presente Lei e demais legislação vigente.
  2. O desconhecimento da lei não isenta o refugiado das responsabilidades decorrentes das obrigações enunciadas no número anterior.

Artigo 45.º (Informação sobre o Domicílio e Situação Social)

  1. O refugiado que mediante autorização da autoridade migratória não residir no CARRA, tem a obrigação de informara autoridade migratória sobre:
    • a)- Seu domicílio actual;
    • b)- Exercício de actividade profissional ou comercial;
    • c)- Constituição ou composição do agregado familiar;
    • d)- Meios de subsistência;
    • e)- Outras informações que lhe forem solicitadas.
  2. Deve também apresentar-se periodicamente à autoridade migratória na data e hora que lhe for fixado, de acordo com as exigências de necessidade e proporcionalidade, sob pena de responsabilização nos termos da presente Lei e demais legislação vigente.

Artigo 46.º (Restrições à Circulação)

O refugiado que resida no CARRA não deve ausentar-se sem autorização do administrador do Centro, devendo cumprir escrupulosamente o seu regulamento, sob pena de responsabilização nos termos da presente Lei e demais legislação vigente.

SECÇÃO IV CESSAÇÃO E PERDA DO ESTATUTO DE REFUGIADO

Artigo 47.º (Cessação do Estatuto de Refugiado)

  1. O estatuto de refugiado cessa quando o refugiado:
    • a)- Tenha cometido um crime fora de Angola após ter-lhe sido concedido o estatuto de refugiado;
    • b)- Voluntariamente se reaproveitou da protecção de seu país de nacionalidade;
    • c)- Tendo perdido a sua nacionalidade, a readquiriu voluntariamente;
    • d)- Adquiriu uma nova nacionalidade e goza de protecção do país de sua nova nacionalidade;
    • e)- Voluntariamente se reestabeleceu no país que deixou ou fora do qual permaneceu devido a temor de perseguição;
    • f)- Já não pode recusar a protecção do país de sua nacionalidade nas circunstâncias em que as razões pelas quais foi reconhecido como refugiado, deixarem de existir;
    • g)- Sendo uma pessoa que não possui nacionalidade, se encontra, porque as razões pelas quais foi reconhecido como refugiado deixaram de existir, capaz de voltar ao país de residência habitual anterior;
    • h)- Permanecer injustificadamente fora do território nacional por período superior a seis (6) meses;
    • i)- Violar os deveres do refugiado estabelecido no n.º 1 do artigo 45.º.
  2. O disposto nas alíneas f) e g) do número anterior, não é aplicável a um refugiado que está em posição de invocar razões convincentes derivadas de perseguições anteriores para se recusar a aproveitar a protecção de seu País de nacionalidade ou de residência habitual anterior.

Artigo 48.º (Perda do Estatuto de Refugiado)

  1. Perde o estatuto de refugiado o estrangeiro ou apátrida que o tenha obtido com base num pedido de asilo com informações incorrectas ou falsas ou que o tenha obtido, deturpando ou omitindo factos, incluindo a utilização de documentos falsos, decisivos para beneficiar do estatuto de refugiado.
  2. Perde o estatuto de refugiado o estrangeiro ou apátrida que pratique acto ou cometa crime previsto no artigo 6.º da presente Lei.

SECÇÃO V PROCEDIMENTOS PARA A CESSAÇÃO E PERDA DO ESTATUTO DE REFUGIADO

Artigo 49.º (Processo para a Cessação e a Perda do Estatuto)

  1. A autoridade migratória deve averiguar todos os factos relevantes para o disposto nos artigos 47.º e 48.º da presente Lei e instruir os processos para a cessação e perda do estatuto de refugiado, no prazo de trinta (30) dias, a contar da data do conhecimento dos factos.
  2. O prazo de instrução do processo referido no número anterior é prorrogável por despacho do titular do departamento ministerial responsável pela execução da política migratória, mediante delegação de poderes do Titular do Poder Executivo, quando considerar que tal se justifica.
  3. O processo para a cessação e a perda do estatuto de refugiado deve seguir os trâmites estabelecidos nos artigos 17.º e 18.º da presente Lei, com as devidas adaptações.

Artigo 50.º (Decisões sobre a Cessação e a Perda do Estatuto de Refugiado)

Compete ao titular do departamento ministerial responsável pela execução da política migratória, sob proposta do CNR, devidamente fundamentada, declarar a cessação e a perda do estatuto de refugiado com os fundamentos dos artigos 47.º e 48.º da presente Lei, num prazo máximo de trinta (30) dias, a contar da data da recepção do processo.

Artigo 51.º (Efeitos da Declaração de Cessação e Perda do Estatuto de Refugiado)

  1. A cessação e a perda do estatuto de refugiado com fundamento nos artigos 47.º e 48.º da presente Lei sujeita o beneficiário às disposições da Lei sobre o Regime Jurídico dos Estrangeiros em vigor na República de Angola, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.
  2. A perda do estatuto de refugiado com o fundamento no artigo 48.º da presente Lei é causa bastante para a expulsão do beneficiário do território nacional.
  3. A cessação do estatuto de refugiado não constitui causa de expulsão do território nacional, podendo o interessado solicitar à autoridade migratória uma autorização de residência com dispensa da apresentação do respectivo visto, nos termos da Lei sobre o Regime jurídico dos Estrangeiros em vigor na República de Angola.
  4. Quando a perda do estatuto de refugiado constitua causa de expulsão, o beneficiário é disto notificado pela autoridade migratória no prazo de setenta e duas (72) horas, com a menção de que deve abandonar o país no prazo de trinta (30) dias, sob pena de expulsão uma vez esgotado esse prazo, bem como do direito que lhe assiste, nos termos do artigo seguinte.

Artigo 52.º (Recurso)

  1. A decisão de perda do estatuto do refugiado nos termos do n.º 4 do artigo anterior é susceptível de recurso contencioso, precedido de reclamação, com efeito suspensivo, nos termos da Lei.
  2. Para a decisão sobre a reclamação relativa à perda do estatuto do refugiado, o titular do departamento responsável pela execução da política migratória convoca o CNR para consulta.

Artigo 53.º (Ordem de Expulsão Judicial)

Havendo decisão judicial de expulsão é remetida pelo titular do departamento ministerial responsável pela execução da política migratória, cópia da sentença ou acórdão para o órgão competente da autoridade migratória, que deve executar a ordem de expulsão, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte, dando conhecimento do facto ao representante do ACNUR.

Artigo 54.º (Proibição de Expulsar ou Repelir)

  1. O beneficiário do estatuto do refugiado não é expulso do território nacional, salvo por motivos de segurança nacional ou de ordem pública ou pelas razões constantes do artigo 48.º, observando-se o disposto nos números seguintes.
  2. Da expulsão do beneficiário do estatuto de refugiado nos termos do número anterior, não pode resultar a sua colocação em território de país onde a sua liberdade fique em risco por qualquer das causas que, de acordo com o artigo 5.º da presente Lei, possam constituir fundamento para a concessão de asilo ou de qualquer forma violem a proibição de expulsar e de repelir (princípio de non-refoulement) em conformidade com as obrigações internacionais da República de Angola.
  3. Nenhum cidadão estrangeiro ou apátrida é devolvido, afastado, extraditado ou expulso para um País onde seja submetido a tortura ou a tratamento cruel ou degradante.

Artigo 55.º (Repatriamento Voluntário)

  1. Pode ser prestada assistência aos requerentes de asilo ou aos refugiados que manifestam vontade de regresso ou repatriamento.
  2. Em caso de repatriamento voluntário massivo, na sequência de cessação colectiva do estatuto de refugiado, pode o departamento ministerial responsável pelas relações exteriores, por iniciativa da autoridade migratória, celebrar acordos com o País de origem dos ex-refugiados e com o ACNUR, visando a preparação e implementação de um programa de repatriamento voluntário organizado.

CAPÍTULO IV DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS

Artigo 56.º (Disposições Transitórias)

  1. O disposto na presente Lei é aplicável também aos pedidos de asilo pendentes, exceptuando no que respeita ao seu ingresso no CARRA.
  2. A criação, composição, organização e o funcionamento do CNR são definidos por regulamento próprio.

Artigo 57.º (Efeitos do Requerimento de Asilo e do Estatuto de Refugiado sobre a Extradição)

  1. A pendência do processo de requerimento de asilo e a concessão do estatuto de refugiado obsta ao seguimento de qualquer pedido de extradição do refugiado, fundado nos factos com base nos quais o pedido é apreciado ou o estatuto foi concedido.
  2. A decisão final sobre qualquer processo de extradição do requerente de asilo que esteja pendente, fica suspensa enquanto o pedido de asilo se encontre em apreciação, tanto na fase administrativa, como na fase judicial.
  3. Para efeitos do cumprimento do disposto no número anterior, a autoridade migratória, informa sobre a apresentação do pedido de asilo à entidade onde tramita o processo de extradição no prazo de cinco dias úteis a contar da data de entrada do pedido ou do conhecimento do processo de extradição.

Artigo 58.º (Registo e Confidencialidade)

  1. A autoridade migratória, o CNR e as instituições de assistência social aos requerentes de asilo e refugiados devem manter actualizados os registos, contendo todos os factos relativos aos processos de reconhecimento e perda do estatuto de refugiado.
  2. O registo é organizado sob a forma de ficheiro informatizado e manual, competindo ao departamento ministerial responsável pela execução da política migratória mediante delegação de poderes do Titular do Poder Executivo, organizar e administrar a base integrada de processamento de dados dos requerentes de asilo e dos refugiados na República de Angola.
  3. As informações individualmente identificáveis constantes de processos de reconhecimento e de perda do estatuto de refugiado ao abrigo da legislação em vigor são confidenciais.

Artigo 59.º (Gratuitidade e Urgência dos Processos)

Os processos de reconhecimento do direito de asilo, de atribuição do estatuto de refugiado e de expulsão são gratuitos e têm carácter urgente, quer na fase de instrução, quer na fase de decisão ou recurso.

Artigo 60.º (Publicação no Diário da República)

As decisões de concessão do direito de asilo e perda do estatuto de refugiado são publicadas na II Série do Diário da República.

Artigo 61.º (Revogação)

É revogada a Lei n.º 8/90, de 26 de Maio, Lei sobre o Estatuto do Refugiado e demais legislação que contrarie o disposto na presente Lei.

Artigo 62.º (Dúvidas e Omissões)

As dúvidas e as omissões resultantes da interpretação e da aplicação da presente Lei são resolvidas pela Assembleia Nacional.

Artigo 63.º (Entrada em Vigor)

A presente Lei entra em vigor à data da sua publicação. Vista e aprovada pela Assembleia Nacional, em Luanda, aos 21 de Abril de 2015. O Presidente da Assembleia Nacional, Fernando da Piedade Dias dos Santos. Promulgada aos 4 de Junho de 2015.

  • Publique-se. O Presidente da República, JOSÉ EDUARDO DOS SANTOS.
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